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Artistas brasileiros se mobilizam em Paris contra governo Bolsonaro, em "exposição manifesto"

16/09/2020 14h04

Cerca de 20 artistas brasileiros se mobilizam em Paris em uma "exposição manifesto" inédita contra a situação política, ambiental e de direitos humanos no Brasil. Durante o evento, que tem como título "Amanhã há de ser outro dia", trecho da canção "Apesar de você" de Chico Buarque, serão organizados debates e reflexões sobre o desmatamento na Amazônia, a perseguição de líderes sociais e a pauta conservadora do governo brasileiro, entre outros temas.  

Cerca de 20 artistas brasileiros se mobilizam em Paris em uma "exposição manifesto" inédita contra a situação política, ambiental e de direitos humanos no Brasil. Durante o evento, que tem como título "Amanhã há de ser outro dia", trecho da canção "Apesar de você" de Chico Buarque, serão organizados debates e reflexões sobre o desmatamento na Amazônia, a perseguição de líderes sociais e a pauta conservadora do governo brasileiro, entre outros temas.

O evento será inaugurado na quinta-feira (17), na Les Grandes-Serres de Pantin, nos arredores de Paris. Segundo sua organizadora, Sandra Hegedüs, a música que inspira o título da exposição diz respeito ao período da ditadura militar, "mas sentimos que ela se refere também a este período que vivemos agora com o governo Bolsonaro". Ela lembra que apesar de tudo, como diz a música de Chico Buarque, é necessário ter um olhar positivo: "Tudo isso vai passar e nós vamos ficar".

Muitos dos artistas envolvidos no manifesto fazem performances e participam de atos e eventos em protesto contra o governo do presidente Jair Bolsonaro. Entre eles, Julio Villani, que fez uma intervenção artística na fachada da embaixada brasileira em Paris, em maio. Segundo Sandra, os artistas brasileiros podem atualmente se mobilizar na França, o que não é tão simples no Brasil. "A gente não se dá conta de quanto temos sorte aqui na França de poder dizer o que a gente pensa. Então, a gente está fazendo o que pode para nosso grito sair, " afirma.

O coletivo que se apresenta é formado por cantores, coreógrafos e artistas plásticos. Além das performances artísticas, o evento pretende ser um lugar de debates. "Eu acho que todo mundo está querendo conversar, falar, se exprimir", afirma a organizadora. "Nos domingos, nós organizaremos mesas-redondas, espaços de discussão para todo mundo poder participar, porque é necessário, precisamos todos, agora".

Sandra lembra que o local onde o evento é realizado, chamado de Les Grandes-Serres de Pantin, era uma antiga fábrica desativada que deve se transformar em um grande projeto imobiliário, mas que por enquanto acolhe diversos artistas. "Não é um museu ou um centro de arte. É um lugar atípico, que não tem toda a infraestrutura de segurança que tem um museu", diz. Para seguir as rígidas regras sanitárias, exigidas por causa da pandemia de Covid-19, as pessoas terão que reservar seus ingressos com antecedência no site do evento. E como é de praxe em qualquer manifestação cultural em Paris, todos terão que usar máscaras.

Refúgio

Sandra, que vive há 30 anos na França, participou da vanguarda artística paulistana nos anos 1980. "O que eu estou fazendo hoje é totalmente coerente com o que eu sou e de onde eu venho. Eu venho dos anos 80, fim da ditadura, a batalha pelas Diretas Já, eu participei de tudo isso", diz.

"Mas essa necessidade de poder se exprimir, de não ter censura, isso nunca morre. A gente pensa que acabou, que está tudo bem e, olha, volta", lamenta a "ativista artística", como prefere ser chamada, embora seja também conhecida no meio brasileiro como grande colecionadora de arte contemporânea e mecenas. "A gente não pode ceder. Todo mundo tem que participar, senão acabamos aceitando o inaceitável", acrescenta ela.

Para Sandra, a França é como um refúgio para a arte brasileira desde a época da ditadura militar. Ela lembra que artistas como Wagner Schwartz, cuja performance La Bête, inspirada na obra O Bicho de Lygia Clark no Museu de Arte Moderna de São Paulo, gerou violentas reações de meios conservadores, podem exercer sua arte em liberdade em Paris. Schwartz faz parte do coletivo de artistas da exposição.

Referindo-se a nudez do artista durante a performance, Sandra sublinha: "As pessoas têm medo do corpo, mas não têm medo de armas. Eu não sei como interpretar isso", diz. "O corpo é uma coisa maravilhosa, todos temos nosso corpo, o corpo é lindo. Por que o corpo nu teria que ser censurado? Para mim o que tinha que ser censurado é uma kalashnikov".

Sandra Hegedüs criou em 2009 o SAM Art Projects, uma organização sem fins lucrativos que realiza intercâmbios artísticos internacionais e fornece suporte financeiro para artistas contemporâneos residentes na França e em países emergentes. A organização acolhe artistas em residência e promove um prêmio anual concedido a um artista francês. Os trabalhos resultantes do projeto são exibidos no Palais de Tokyo em Paris.

A exposição "Amanhã há de ser outro dia", na Les Grandes-Serres de Pantin, fica aberta entre 14h e 19h, todos os dias de 17 de setembro a 30 de outubro