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Relatório da RSF destaca caso de jornalista brasileira que denunciou Bolsonaro

08/03/2021 16h52

O fenômeno é visível na internet, nas ruas e dentro das redações: a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) publicou nesta segunda-feira (8) um relatório que ilustra a extensão do sexismo no jornalismo e suas múltiplas consequências para as mulheres jornalistas e a liberdade dos meios de comunicação.

A análise divulgada no Dia Internacional dos Direitos da Mulher é baseada em uma pesquisa realizada pela RSF em 112 países. A organização entrevistou correspondentes e jornalistas especializados em questões de gênero para identificar os atos sexistas vividos por suas colegas: discriminação, insultos, assédio sexual, toques inadequados, agressões verbais e físicas de natureza sexual, ameaças de violência sexual e estupro.

A conclusão é contundente: "ser mulher jornalista muitas vezes significa acumular um duplo risco. Isto é, além dos perigos inerentes à profissão, de ser exposta à violência de gênero ou sexual", resume RSF. Violências que são praticadas em todos os lugares, a começar pela internet e redes sociais, e que são citadas por 73% das entrevistadas. São inúmeros os casos de jornalistas vítimas de assédio cibernético, como a colunista e investigadora indiana Rana Ayyub, que é diariamente ameaçada de estupro e morte.

Nesta segunda-feira (8), por exemplo, jornalistas funcionárias de um canal de TV foram forçadas a parar de trabalhar no Dia Internacional da Mulher, depois que três de suas colegas foram assassinadas na semana passada em Jalalabad, no Afeganistão. A situação é similar na maior parte do planeta.

Assim como nas ruas (36%). No Brasil, por exemplo, repórteres lançaram uma campanha contra torcedores de futebol que procuram beijá-las sem seu consentimento.

Agressão à jornalista brasileira Patrícia Campos Mello

Ainda no Brasil, a jornalista Patricia Campos Mello pagou caro por sua investigação sobre o uso de fundos ilegais pelo presidente Bolsonaro para financiar campanhas de desinformação. Ela foi alvo de uma campanha de cyberbullying extremamente violenta depois de ser acusada por Jair Bolsonaro e seus filhos de "roubar" informações em troca de favores sexuais.

Também em terras brasileiras, cerca de cinquenta jornalistas do setor esportivo, por sua vez, lançaram o movimento #DeixaElaTrabalhar (#LaisseLaTravailler) para denunciar a prática de beijos forçados em torcedores durante a cobertura de eventos esportivos ao vivo. Na França, cerca de 40 jornalistas do diário esportivo L'Equipe se reuniram para apoiar seus colegas após relatos de assédio em "serviços esportivos".

E, no local de trabalho (58%), a RSF relembra as múltiplas revelações que abalaram as redações em diversos países desde o surgimento do movimento #MeToo.

A ONG cita o exemplo da apresentadora dinamarquesa Sofie Linde, que surpreendeu o público em uma cerimônia de gala televisionada ao contar que um chefe na televisão pública se ofereceu para promover sua carreira em troca de sexo oral. Depois disso, 1.600 mulheres que trabalham em veículos de imprensa no país assinaram uma carta de apoio, na qual também afirmavam sofrer de sexismo.

Na Arábia Saudita, a jornalista Nouf Abdulaziz al-Jerawi, presa por se manifestar contra o sistema de tutela masculina em seu país, foi torturada com eletricidade e abusada sexualmente durante a detenção.

Consequências da violência

O relatório também destaca as graves consequências dessa violência, tanto para as mulheres como para o direito à informação.

As agressões podem levar a jornalista a abandonar as redes sociais (de acordo com 43% das entrevistadas), a se autocensurar (48%), mudar de especialidade (21%) ou até desistir da profissão (21%).

Por fim, a RSF emite uma série de recomendações para combater esse fenômeno, como ações de sensibilização, treinamento, assessoria prática, ou mesmo a criação de cargos editoriais encarregados de "questões de gênero", destinadas não apenas aos jornalistas em redações, mas também aos Estados.