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Mesmo com quebra de patentes, capacidade de produção de vacinas seria limitada

Produção da CoronaVac no Instituto Butantan, em São Paulo - Amanda Perobelli/Reuters
Produção da CoronaVac no Instituto Butantan, em São Paulo Imagem: Amanda Perobelli/Reuters

Thiago de Aragão

10/05/2021 06h49Atualizada em 10/05/2021 08h20

O posicionamento do presidente americano Joe Biden de cogitar uma quebra de patentes para vacinas contra o novo coronavírus gerou uma onda de questionamentos, especulações e debates nos Estados Unidos. Naturalmente, dada a complexidade do processo logístico de distribuição de vacinas e a dificuldade de acesso aos insumos para produções locais, a ideia parece lógica.

Em tese, essa decisão beneficiaria países que se encontram em dificuldade de receber vacinas (como o Brasil, México e Argentina), além de possibilitar um incremento na produção local.

Na prática, as coisas não são tão simples. Existem dois pontos centrais que ilustram a dificuldade dessa ideia. Uma dentro do contexto científico e outra dentro do contexto político.

No contexto científico, é importante lembrar que as vacinas não são iguais. As vacinas da Pfizer e da Moderna, por exemplo, são centradas em cima da tecnologia do RNA mensageiro, onde as informações genéticas de como combater o vírus são transmitidas, via a vacina, para nosso sistema imunológico saber se defender. Mesmo com a quebra de patentes, a capacidade de produção em diversos países do mundo seria limitada, pois precisaria de equipe treinada e equipamentos específicos para produzir esse tipo de vacina.

Se a produção dessa vacina se tornasse inviável a curto prazo, por dificuldades operacionais, como seria o posicionamento de alguns países para optar quebrar a patente de vacinas de maior "simplicidade" e não outras, mais complexas?

China pode se servir da quebra de patentes

O segundo ponto, que tende a trazer mais dificuldades domésticas para Biden do que o primeiro ponto, é a questão do posicionamento histórico dos EUA em relação à quebra de patentes, assim como a defesa global de propriedade intelectual.

Um dos pilares da narrativa contra a China por parte dos EUA vem sendo, justamente, a questão da propriedade intelectual e sua defesa. Esse é um dos argumentos mais sólidos dentro do contexto de acusação de espionagem industrial chinesa e da motivação por trás do offshoring (relocação de empresas americanas que produzem na China para produzir em outros países).

Caso Biden estimule até o fim a quebra de patentes, a China certamente usará esse episódio, por mais nobre que seja, para tentar deslegitimar a narrativa americana de que esse país pratica a violação de propriedade intelectual, principalmente no campo tecnológico.

A poderosa indústria farmacêutica americana também reagirá de forma contundente. O principal argumento será de que, com quebra de patentes, o incentivo para investir pesado em pesquisa e desenvolvimento de novos medicamentos será diminuído, prejudicando a inovação em cima da produção de novos fármacos.

Por outro lado, os casos da Índia e do Brasil ilustram que a falta de vacinas e uma demanda global bem maior do que a oferta, acabam gerando tragédias humanas e seus efeitos não ficam restritos aos territórios onde o vírus se espalha. Todos acabam afetados e qualquer solução que sufoque o avanço do vírus em qualquer país, é bem-vinda.