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O conflito entre Israel e os palestinos chega à Europa

17/05/2021 05h03

Aconteceu o que já era esperado: o atual conflito entre Israel e palestinos, o mais grave desde 2014, chegou à Europa. No fim de semana, várias organizações palestinas convocaram diversas manifestações na França e na Alemanha, pelo menos, em favor de sua causa. Em Paris, a manifestação foi proibida pelas autoridades, alegando que elas poderiam desviar-se para atos de vandalismo e confronto. Assim mesmo seus organizadores mantiveram a convocação. Em Berlim, a polícia seguiu de perto as manifestações que começaram na sexta-feira à noite e se estenderam pelo sábado.

Flávio Aguiar, de Berlim

Do lado das autoridades alemãs, o temor era que elas pudessem dar lugar a atos de declarado antissemitismo, o que é crime na Alemanha. Durante a semana passada, alguns manifestantes foram detidos por queimarem bandeiras de Israel, o que é proibido. Outros, por apedrejarem sinagogas.

A posição oficial da Alemanha sobre o conflito é bastante complicada. Sua pedra fundamental é o reconhecimento do direito de Israel à existência e a se defender, condenando, por exemplo, a prática do Hamas de disparar foguetes desde a Faixa de Gaza contra alvos israelenses. Ao mesmo tempo, o governo alemão defende as resoluções da ONU sobre a criação de dois estados, um israelense e outro palestino, e sobre a condenação da anexação de novos territórios por Israel a partir da guerra de 1967. Na prática, estas resoluções vêm sendo afrontadas sobretudo pelo governo israelense de Benjamin Netanyahu, no poder entre 1996 e 1999 e desde 2009, contando com o apoio do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump.

A primeira aproximação diplomática entre a então Alemanha Ocidental e Israel aconteceu em 1952. A troca de embaixadores entre os dois países ocorreu em 1965.

Também não se deve esquecer as viagens que a atriz Marlene Dietrich, nascida na Alemanha e militante antinazista fez a Israel, nos primeiros anos da década de 1960. Foi a primeira vez em que canções em língua alemã foram cantadas num palco israelense.

No governo da chanceler Angela Merkel, no cargo desde 2005, as relações entre os dois países se intensificaram. Merkel visitou Israel sete vezes, sendo a última em 2018. Mas deve-se assinalar que esta relação esfriou um pouco diante da insistência de Netanyahu em fazer novos assentamentos de colonos israelenses em territórios que a ONU reconhece como palestinos.

Disparidades acentuam sensibilidade ao conflito

De um modo geral, pode-se dizer que a maior parte da opinião pública e da mídia alemãs acompanha a posição de seu governo. Entretanto, neste último conflito apareceram algumas frinchas e rachaduras nesta unidade, provocadas por três aspectos:  

Primeiro, o ataque de forças israelenses contra palestinos reunidos na mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém Oriental, para festejar o período de Ramadã, deixando centenas de feridos.

Segundo, a disparidade dos números. Todas as mortes e danos são lamentáveis, mas a diferença é muito grande. No fim de semana, os mortos palestinos passavam de 150, dos quais 139 na Faixa de Gaza, bombardeada pela aviação e pela artilharia israelenses, incluindo dezenas de mulheres e crianças. Uma família inteira, de 15 pessoas, foi aniquilada num destes bombardeios. Em Gaza contabilizavam-se 950 feridos e 10 mil pessoas forçadas a deixar suas casas, com 200 delas e 24 escolas destruídas.

Em outros territórios palestinos, contavam-se pelo menos mais 13 mortos. Do lado israelense, cuja justificativa para os ataques era a destruição da infraestrutura do grupo Hamas e a eliminação de alguns de seus líderes, contavam-se pelo menos 10 ou 11 mortos, segundo diferentes fontes, pelo menos de duas crianças, e 560 feridos.

Terceiro, a violência entre grupos extremistas israelenses e palestinos tomou conta de várias cidades. Mas as cenas de um suposto palestino (nem isto foi verificado com certeza) sendo arrancado de seu carro e espancado por um grupo numeroso de israelenses de extrema-direita, transmitidas ao vivo pela TV local, chocaram muita gente.

Netanyahu inflexível

O grupo Hamas continua sua prática de disparo de foguetes contra Israel. Ao mesmo tempo, o primeiro- ministro Benjamin Netanyahu vem recusando qualquer tentativa de mediação, anunciando que o conflito vai continuar até que seus objetivos militares sejam alcançados.

Alguns analistas veem na atitude do primeiro-ministro uma tentativa algo desesperada de sua parte para manter-se no poder. Depois da última eleição, seu partido, o Likud, elegeu o maior número de deputados, mas assim mesmo Netanyahu não conseguiu formar um novo governo.

O presidente do país, Reuven Rivlin, chamou então seu principal opositor, Yair Lapid, do partido Yesh Atid, para que tentasse a formação do novo gabinete, dando-lhe prazo até o começo de junho. Acuado, Netanyahu, que enfrenta várias acusações por improbidade administrativa e corrupção, quer manter sua aura de defensor supremo do Estado de Israel, sugando para si os dividendos do conflito. Lapid, que alega sabotagem por parte de seu rival, afirma que chegou o tempo de Netanyahu abandonar o leme. Resta saber quem ou o que vai convencê-lo disto.