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Iniciativa internacional para evitar novas pandemias integra saúde humana à do meio ambiente

24/06/2021 09h22

Depois do desastre sanitário, humanitário, econômico e social causado pela Covid-19, cientistas do mundo inteiro se mobilizam para evitar, num futuro distante ou próximo, que uma nova pandemia volte a traumatizar o planeta. Da França, parte uma iniciativa internacional que visa desenvolver um olhar mais global sobre a saúde, e não individualizado, como foi até agora.

O projeto Prozode representa o despertar da comunidade científica para o conceito de One Health: uma só saúde. Significa que as saúdes humana, animal e do meio ambiente devem ser estudadas em conjunto - caso contrário, as falhas na interação entre estas diferentes áreas podem resultar na aparição de graves anomalias, como a disseminação de novos vírus, a exemplo da Covid-19. Até o momento, a Organização Mundial da Saúde avalia que a hipótese mais provável para explicar o surgimento do novo coronavírus foi a transmissão humana por um animal silvestre, num contexto de avanço cada vez maior do homem rumo às zonas selvagens.

Há anos, os cientistas alertam que a aparição de novas doenças infecciosas é uma consequência da degradação do meio ambiente. Eles insistem que a sobrevivência dos ecossistemas naturais e a dos seres humanos estão intimamente ligadas.

"Vamos nos basear em parcerias já existentes para levar as estratégicas científicas e de decisões políticas em direção a uma visão integrada da saúde", diz Thierry Lefrançois, veterinário do Cirad (Centro de Cooperação Internacional em Pesquisas Agronômicas para o Desenvolvimento) e especialista nesta abordagem integrada da saúde. Ele faz parte do conselho científico que orienta o governo francês sobre a gestão da pandemia e é e um dos coordenadores do projeto Prezode.

"Não deveríamos continuar olhando para os setores de maneira individual: saúde humana, saúde animal, saúde do meio ambiente. Devemos ter uma visão global, reunindo todos os atores atingidos pela emergência de doenças", observa.

Cientistas e comunidades locais do mundo inteiro

A iniciativa foi lançada em janeiro pelo presidente Emmanuel Macron, durante a cúpula ambiental One Planet. Desde então, 1.000 participantes do mundo inteiro já se uniram ao projeto, que prevê ações concretas já em 2022. Um dos maiores desafios, explica Lefrançois, é chegar e trabalhar com eficiência no coração de florestas tropicais, cenário mais comum para a aparição de vírus emergentes, que podem acabar transmitidos ao homem.

"Antes de mais nada, precisamos ter gente trabalhando nas zonas chamadas hot spots de emergência, que com frequência são pontos de alta biodiversidade. Temos de associar esse trabalho com eventuais modificações do habitat, do solo ou da floresta em questão pelo homem", aponta. "E temos de melhorar o monitoramento, que consiste não apenas em analisar amostras constantes de animais selvagens e tentar detectar vírus emergentes, como avaliar mudanças no comportamento dos animais, no habitat ou no contato entre os vírus, seus reservatórios, os animais e o homem", salienta.

Pandemia acendeu alerta

A pandemia de Covid-19 representou um choque na humanidade sobre a urgência na adoção de atitudes concretas para reverter a destruição do planeta. Fica a questão: os milhões de mortos pelo coronavírus e o impacto devastador na economia mundial serão suficientes para gerar uma mudança de rumos?

"Estamos felizes porque, agora, estão nos ouvindo. Faz dezenas de anos que trabalhamos esses conceito de abordagem integrada da saúde e tentamos reforçar as atividades de pesquisa científica e monitoramento em campo. Na maioria dos casos, as colaborações são feitas apenas entre dois setores da saúde, ou somente um", afirma Lefrançois. Então, estamos contentes dessa tomada de consciência política, que acontece infelizmente depois dessa grave crise, mas que pelo menos nos dá a chance de tirar as lições de uma crise sanitária dessa amplitude."

Para quem quiser se aprofundar nesta discussão, nesta quinta-feira acontece, a partir da França, mais uma edição da conferência Planet A, que batalha pela restauração dos ecossistemas naturais em cerca 15 países. O foco é o papel crucial da agricultura nesta missão. A exploração agrícola intensiva empobrece os solos, polui o planeta e contribui para as mudanças climáticas, frisa Jean-Pierre Rennaud, presidente do comitê científico do fórum.

"A Planet A é uma iniciativa internacional criada em 2017, por um coletivo de personalidades de diferentes horizontes, cientistas, empresas, associações, agricultores, para tentarmos acelerar a transição agrícola no mundo. Nós acreditamos que, ao criarmos conexões e melhorarmos a nossa comunicação, vamos criar e difundir inovações úteis para passarmos para essa transição em maior escala", comenta.

O Planet A - uma referência ao fato de que não há um planeta B para a humanidade se refugiar - acontecerá por videoconferências. As inscrições são gratuitas.