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Aviação: Alitalia faz seu último voo após 74 anos de história e é substituída por startup

15/10/2021 12h51

A Alitalia encerrou 74 anos de história na aviação e é substituída por uma jovem startup, a ITA. A nova empresa entra em um mercado aéreo que luta pela recuperação após as turbulências da pandemia de Covid-19. O primeiro voo da Italia Trasporto Aereo (ITA) decolou nesta sexta-feira às 6h20 locais (1h20 de Brasília) de Milão com destino a Bari, sul do país, sete horas após o último pouso da Alitalia, na quinta-feira à noite em Roma, procedente de Cagliari. 

Fundada em 5 de maio de 1947, a Alitalia foi o símbolo do milagre econômico da Itália após a Segunda Guerra Mundial e se tornou a sétima companhia aérea do mundo nos anos 1970, antes de entrar em um longo declínio, que se agravou nos últimos anos. 

A história da companhia está entrelaçada com a do país: a Alitalia foi a empresa oficial dos Jogos Olímpicos de Roma-1960, transportou um sumo pontífice (o papa Paulo VI) desde 1964 e superou a marca de um milhão de passageiros. Mas a companhia não soube evoluir junto com o mercado. 

"O grande erro foi não investir no lucrativo mercado de longa distância", declarou Andrea Giuricin, economista especializado no transporte da Universidade Bicocca de Milão. Especialmente porque as companhias de baixo custo, como Ryanair e Easyjet, quebraram o setor com a redução dos preços para as viagens de curta distância e o trem de alta velocidade reduziu o tempo de viagem entre Roma e Milão de seis para três horas. 

À beira da falência, a Alitalia foi colocada sob supervisão da administração pública em 2017, mas a situação se agravou ainda mais com o impacto da pandemia de Covid-19, que paralisou diversas companhias aéreas. Em 2020, a empresa registrou perdas de € 2 milhões (cerca de R$ 12 milhões) por dia, transportando apenas 6,3 milhões de passageiros no ano, contra 52,1 milhões da Ryanair e 34 milhões da Air France-KLM. 

Ajuda do Estado e bloqueio de Berlusconi 

Ao longo dos anos, o Estado italiano desembolsou mais de € 13 bilhões (cerca de R$ 82 bilhões) para tentar salvar a empresa, entre recapitalizações e créditos. Mesmo assim, a Alitalia acumulou perdas de € 11,4 bilhões (mais de R$ 70 bilhões) entre 2000 e 2020. 

Desde que a Alitalia foi colocada sob supervisão pública há quatro anos, o governo procurou em vão por compradores. No passado, porém, a companhia atraiu grandes pretendentes, como a Air France-KLM, que apresentou uma oferta em março de 2008. Mas a proposta foi rejeitada por Silvio Berlusconi, que assumiu o poder logo depois com base em uma campanha sobre a defesa da "italianidade".

Resgatada por um grupo de empresários italianos, a Alitalia precisou de uma nova ajuda em 2014 por parte da empresa Etihad (Emirados Árabes), que adquiriu 49% de seu capital, o que não freou a trajetória rumo ao colapso.

Marca nacional 

O encerramento das atividades da companhia é visto por muitos como a perda de parte do patrimônio italiano. "Assistimos com profunda tristeza o fim da Alitalia, que era nossa marca nacional, símbolo da história do país", declarou, emocionada, Laura Facchini, de 47 anos, auxiliar de voo da Alitalia durante duas décadas. 

Como tantos outros, ela solicitou, em vão, passar a integrar o quadro de funcionários da ITA como parte da primeira série de 2.800 pessoas contratadas este ano. Até 2022 devem ser contratados 5.750 funcionários, de um total de 10.500 da Alitalia. 

"Muitos de nós estamos desesperados porque não temos mais emprego. Estávamos muito ligados à empresa, muito motivados, sempre tivemos um sorriso no rosto", disse a delegada nacional do sindicato UGL Transporte Aéreo. 

Os sindicatos da Alitalia organizaram uma série de manifestações contra os "contratos com desconto" oferecidos pela ITA, com cortes de salários de até 20%, chegando a 40% para os pilotos, além da "venda por partes" da empresa. 

O setor de aviação passou para a ITA, uma empresa totalmente estatal, mas os serviços de terra e de manutenção serão vendidos de maneira separada, por meio de licitações, como exigiu a União Europeia nas duras negociações com Roma. 

A Comissão Europeia aprovou em setembro uma injeção de € 1,35 bilhão (mais de R$ 8 bilhões) de fundos públicos. Mas exigiu uma "descontinuidade econômica" entre Alitalia e ITA, isentando esta última de devolver os "auxílios estatais ilegais" recebidos pela sua antecessora. 

ITA já começa com obstáculos

Com uma frota reduzida à metade, de 52 aviões, incluindo sete grandes, a ITA enfrentará dificuldades. "Resistir à concorrência dos gigantes Air France-KLM e Lufthansa nas viagens internacionais e das companhias de baixo custo no mercado nacional é impossível", disse Andrea Giuricin.

Apenas uma lembrança resta para os saudosos: o famoso logo verde sobre fundo branco da Alitalia não vai desaparecer, pois a ITA venceu na quinta-feira a licitação para sua compra, ao pagar € 90 milhões (R$ 568 milhões). 

(Com informações da AFP)