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"Violação da Lei Internacional": líderes reagem à decisão de Israel de construir mais de 1,3 mil casas na Cisjordânia

25/10/2021 08h57

Líderes palestinos e jordanianos, além de membros da esquerda israelense, criticaram, neste domingo (24), o anúncio do governo de construção de milhares de unidades habitacionais em assentamentos na Cisjordânia ocupada. No local, Israel planeja construir exatas 1.355 novas casas para colonos judeus.

 

Daniela Kresch, correspondente da RFI em Israel

O projeto de construção foi revelado após a publicação, neste domingo, de uma concorrência para a comercialização das unidades. O plano prevê que as casas sejam construídas em sete localidades. Mais de 700 estão planejadas para construção na cidade de Ariel, a segunda maior colônia israelense na Cisjordânia, com 20 mil habitantes.

Atualmente, cerca de 500 mil israelenses vivem em localidades na Cisjordânia que grande parte da comunidade internacional classifica de assentamentos ilegais de acordo com a Lei Internacional. A Cisjordânia é almejada pelos palestinos como parte de um futuro Estado independente e foi ocupada por Israel na Guerra dos Seis Dias, em 1967. 

"Agressão ao povo palestino"

O primeiro-ministro palestino, Mohammad Shtayyeh, apelou à comunidade internacional para que pressione Israel a revogar a medida, que chamou de "agressão ao povo palestino". Ele disse que a construção das novas casas coloca o mundo diante de um dilema: confrontar ou não decisões de Israel que podem colocar em perigo a visão de Dois Estados para dois Povos, ou melhor, a criação de um Estado palestino ao lado de Israel.

Líderes palestinos marcaram uma reunião de emergência em Ramallah para discutir como reagir. Uma das possibilidades mais radicais seria revogar o reconhecimento do Estado de Israel pela Organização para Libertação da Palestina (OLP). A entidade reconheceu Israel em 1993 em meio às negociações dos Acordos de Oslo, que criaram a Autoridade Palestina.

O Ministério das Relações Exteriores da Jordânia também alertou para os planos de construção e disse que se trata de uma violação da Lei Internacional e de resoluções da ONU.

Esse é o primeiro anúncio de construção em assentamentos do novo governo de Israel, criado em junho e também não agradou ao atual governo americano, do democrata Joe Biden. Na semana passada, Washington já havia demonstrado preocupação com um projeto de construção total de 3 mil novas casas nas colônias. 

O governo Biden também condenou Israel, nos últimos dias, pelo registro de várias ONGs palestinas, algumas que trabalham com direitos humanos, em uma lista de organizações "terroristas". O governo israelense afirmou que essas organizações contam com militantes de grupos armados.

Nova coalizão em Israel

As construções foram anunciadas no contexto do novo governo israelense, que tomou posse em junho. A nova coalizão surgiu em Israel após 12 anos de governos liderados pelo ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Ela tinha como objetivo colocar um ponto final no monopólio de Netanyahu como premiê, principalmente depois que ele não conseguiu formar um governo após convocar quatro eleições gerais em apenas dois anos.

O problema é que essa nova coalizão é formada por oito partidos muito diferentes, ideologicamente: dois de centro, dois de esquerda, três de direita e um da minoria árabe. O atual premiê, Naftali Bennett, por exemplo, é um nacionalista de direita contrário à criação de um Estado palestino. Mas ele divide a liderança da coalizão com o atual chanceler Yair Lapid, um progressista de centro favorável ao Estado palestino, que deve assumir o governo em 2022. 

Para manter a coalizão, Bennett e Lapid entraram em acordo para não tomar decisões drásticas durante o mandato de quatro anos. Por outro lado, cada partido precisa fazer gestos de boa vontade para seus públicos cativos e, para os direitistas da coalizão, a construção em assentamentos é fundamental. Para a esquerda, no entanto, essa construção é condenável. 

A questão das novas casas da Cisjordânia expõe as primeiras rachaduras no governo. O parlamentar Mossi Raz, por exemplo, do partido de extrema-esquerda Meretz - um dos oito a formar a coalizão - reagiu com indignação. Ele sugeriu que o atual governo ignora o seu partido e é ainda mais direitista do que o anterior, afirmando que a construção de colônias fora das fronteiras de Israel só prejudica o país.

A ONG Paz Agora, ícone da esquerda israelense, também se pronunciou, afirmando que essa coalizão provou que não é um governo de mudanças, e sim "de direita com esteroides". 

Os próximos dias serão cruciais para saber como o novo governo israelense vai lidar com questões tão profundas. Por enquanto, há duas possibilidades: rachar e abrir caminho para uma possível volta ao poder de Benjamin Netanyahu, ou se manter unido apesar de tudo.