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Afeganistão: Talibãs reivindicam "direito de prender seus opositores"

22/01/2022 17h14

O governo talibã tem "o direito de deter e prender opositores", incluindo mulheres que se manifestem regularmente "sem autorização", revelou neste sábado (22) seu principal porta-voz, reagindo ao recente desaparecimento de duas ativistas feministas em que o regime nega ter envolvimento.

Desde que chegaram ao poder, em meados de agosto, após a retirada das tropas americanas, as autoridades do Talibã vêm dispersando manifestações da oposição. Nesse contexto, jornalistas foram espancados e alguns críticos do regime, presos.

Esta semana, duas mulheres foram sequestradas dias depois de participarem de um protesto em Cabul, de acordo com o depoimento de algumas ativistas feministas. A Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão (UNAMA) pediu neste sábado que o Talibã "forneça informações" sobre o destino das duas ativistas, Taana Zaryabi Paryani e Parwana Ibrahimkhel.

Em entrevista à AFP, o porta-voz do governo, Zabihullah Mujahid, negou qualquer prisão. No entanto, ele teria afirmado que o governo tem "o direito de deter e prender os opositores ou aqueles que violem a lei", acrescentando que "ninguém deve criar distúrbios, o que perturba a ordem pública e a paz".

Ativistas feministas têm organizado regularmente pequenos protestos na capital para exigir respeito aos direitos das mulheres. Mas elas estariam se manifestando "sem autorização", argumentou Mujahid. "Se isso acontecesse em outro país, pessoas como elas seriam presas."

"No nosso país elas também serão presas e confrontadas com as suas responsabilidades. Não permitimos atividades ilegais", acrescentou o porta-voz, que também é vice-ministro da Informação e Cultura.

Discussões na Noruega

Desde o fim da ajuda internacional, que representava cerca de 80% do orçamento do Afeganistão, e o congelamento pelos Estados Unidos de US$ 9,5 bilhões de ativos do Banco Central Afegão, o país está assolado por uma profunda crise humanitária.

A fome ameaça 23 milhões de afegãos, ou 55% da população, de acordo com a ONU, que pede aos países doadores US$ 4,4 bilhões para lidar com a situação. É neste contexto que as discussões devem ser abertas neste domingo (23) na Noruega entre os novos representantes do Afeganistão e diplomatas ocidentais, que estabelecem o respeito pelos direitos das mulheres como pré-requisito para qualquer reconhecimento oficial do governo.

Uma delegação do Talibã deve se reunir com autoridades norueguesas e representantes de outros países, incluindo Estados Unidos, França, Reino Unido, Alemanha, Itália e União Europeia.

"O Emirado Islâmico (nome dado pelo Talibã ao seu regime) tomou medidas para atender às demandas do mundo ocidental e esperamos fortalecer nossas relações diplomáticas com todos os países, incluindo países europeus e o Ocidente em geral", revelou Mujahid.

Inexperiência

Desde seu retorno ao poder, o Talibã afirma ter se modernizado em comparação ao seu último governo (1996-2001), durante o qual desrespeitou amplamente os direitos humanos. No entanto, as mulheres continuam em grande parte excluídas dos empregos públicos e as escolas públicas permanecem fechadas para meninas com mais de 12 anos.

As mulheres que desejam viajar também devem estar acompanhadas por um membro masculino de sua família imediata, e cartazes lembrando que elas "devem" usar um véu, acompanhados de fotos de burcas, foram afixados em Cabul.

Nesta sexta-feira (21), a polícia religiosa do Talibã ameaçou atirar em mulheres que trabalham para ONGs internacionais em uma província do noroeste do Afeganistão se elas não usassem a burca, de acordo com dois funcionários dessas organizações.

Mujahid atribuiu essas tentativas de intimidação à inexperiência dos combatentes do Talibã, agora encarregados da lei e da ordem após 20 anos de guerrilha. As forças governamentais são "muito inexperientes (...) e pouco profissionais", argumentou. "Eles não foram treinados."

Direito das mulheres

Para Mujahid, o novo regime é a favor dos direitos das mulheres, que este concilia com sua interpretação estrita da Sharia, a lei islâmica. "Mesmo sem as demandas [da comunidade internacional], acreditamos que é necessário que as mulheres trabalhem e sejam educadas", insistiu.

No entanto, nenhuma data foi definida para um possível retorno às aulas para as meninas nas províncias onde elas são excluídas das escolas públicas. Isso vai acontecer "durante o próximo ano", mas "não podemos definir um prazo", explicou o porta-voz, sempre justificando a situação devido à crise econômica e à inexperiência das novas autoridades.

(Com informações da AFP)