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Angustiante mundo novo: crise geopolítica gera incertezas sobre futuro da economia global

16/05/2022 09h27

Com o fim das medidas sanitárias restritivas contra a pandemia sendo adotado em escala mundial e com a continuação da guerra na Ucrânia, acumulam-se as perguntas e as dúvidas sobre o que advirá desta confluência.Uma coisa é certa: um angustiante mundo novo está nascendo. 

Com o fim das medidas sanitárias restritivas contra a pandemia sendo adotado em escala mundial e com a continuação da guerra na Ucrânia, acumulam-se as perguntas e as dúvidas sobre o que advirá desta confluência.
Uma coisa é certa: um angustiante mundo novo está nascendo. 

Flávio Aguiar, analista político

Uma coisa é certa: um angustiante mundo novo está nascendo. Será ele admirável, tenebroso, sinistro? Será ele a luz no fim do túnel ou o túnel no fim de toda luz? Aumentará ou diminuirá o perigo de um confronto armado em escala mundial, podendo chegar ao uso de armas nucleares? Quem puder, agora, responder com certeza estas perguntas, das duas uma: ou está chegando do futuro ou tem uma poderosa bola de cristal.

Claramente, há dois blocos desenhando a geografia de um novo confronto político. Um mais antigo, é o do chamado "Ocidente", liderado pelos Estados Unidos e pela Organização do Tratado do Atlântico Norte, a OTAN, que está se ampliando e se fortalecendo. O outro, ainda em formação, caso se confirme, terá China como liderança econômica e a Rússia como principal potência militar.

O primeiro compreenderá ainda o Reino Unido e a maior parte da União Europeia. O segundo vai aglomerar os países que fizerem parte da nova "Rota da Seda" chinesa. O primeiro estenderá seu espaço geográfico do Canadá ao Japão, Austrália e Nova Zelândia, passando por Israel, Taiwan e a Ucrânia, ou o que restar dela. O segundo, salvo acontecimentos extraordinários, poderá incluir Cuba e Venezuela.

Algumas perguntas: como e onde ficarão os chamados "países árabes"? Qual a posição da Índia? Da Turquia, que é membro da Otan  e recentemente manifestou reticências quanto à entrada da Finlândia e da Suécia na organização? Como e onde ficarão os variados países africanos e o conjunto da América Latina, incluindo o Brasil? Haverá espaço para a formação de um bloco de "países não-alinhados", como havia durante a antiga Guerra Fria? Uma coisa é certa: no curto prazo este incógnito mundo novo nascerá com problemas sociais muito agravados. Dentre eles, o da fome.

A Rússia é a maior exportadora mundial de trigo, com 23,92% do comércio do cereal. A Ucrânia é a quinta maior exportadora, com 8,91%. A exportação ucraniana está parada devido à guerra, e não se sabe quando retornará. Como as sanções econômicas impostas pelo Ocidente à Rússia afetarão as exportações de trigo?

A Índia anunciou a suspensão de suas exportações de trigo. Ela não está entre os 20 principais exportadores do cereal, mas suas exportações são vitais para a Coreia do Sul, Sri Lanka, Omã e Catar. Além disto, havia exportações projetadas para mais nove países: Marrocos, Tunísia, Indonésia, Filipinas, Tailândia, Vietnã, Turquia, Argélia e Líbano. A decisão do governo indiano, tomada da noite para o dia e simultânea às consequências da guerra, indica uma tendência ameaçadora para o consumo mundial

Este exemplo mostra como a situação está se tornando dramaticamente perigosa para as populações vulneráveis economicamente, sobretudo as da Ásia e da África. A América Latina tem outros produtores ou fornecedores de trigo, mas pode enfrentar também dificuldades quanto à importação de fertilizantes vitais para a agricultura. 

Além disto, há outros elementos perturbadores no horizonte. A alta da inflação vem corroendo a economia e a confiança na Europa. Pelo mundo afora aliados tradicionais estão com relações estremecidas.

E há a situação da guerra em si. Ninguém sabe para onde ela vai, apesar das declarações peremptórias a respeito. Para Kiev e o Ocidente, a Ucrânia está ganhando e vai ganhar. Para a Rússia, ela já ganhou e vai sair ganhando. Ambos os lados acusam-se mutuamente de atrocidades comuns a qualquer guerra. A batalha da informação, que traz tanta insegurança quanto as bélicas, lembra uma frase do Chanceler de Ferro alemão, Otto von Bismarck: "nunca se mente tanto quanto antes de uma eleição, durante uma guerra e depois de uma caçada". No caso brasileiro, o dito poderia incluir também "depois de uma pescaria".