Topo

Claire Denis denuncia com filme na competição em Cannes sistema político na Nicarágua

26/05/2022 10h18

A veterana cineasta francesa Claire Denis volta a Cannes com "Stars at Noon" (Estrelas ao meio-dia). O longa na competição pela Palma de Ouro é ambientado na Nicarágua nos dias de hoje e denuncia o sistema político atual no país da América Central. "O sandinismo não vai morrer assim", declarou a cineasta à RFI.

O filme é um "thriller diplomático" envolvente. Uma jovem jornalista americana, impedida de sair da Nicarágua, é obrigada a se prostituir para recuperar seu passaporte, confiscado pelas autoridades, e um pouco de dinheiro. Em um bar, ela encontra um viajante inglês, Daniel (Joe Alwyn), que tenta fechar negócios sobre reservas de petróleo ao largo da Nicarágua.

Ele parecia ser o homem providencial para ajudá-la a escapar. A história de amor entre os dois é intensa e Trish, interpretada por Margaret Qualley, se dá conta tarde demais que ao contrário da salvação, Daniel a leva para um caminho estranho e perigoso. A intriga se intensifica, com perseguições, mortes e tentativa de fuga para a vizinha Costa Rica.

A protagonista principal é uma anti-heroína, em uma terra comandada por homens corruptos e violentos, que abusam de seu poder. Como em seus outros longas, Claire Denis filma os atores bem de perto, conferindo uma grande sensualidade à obra.

"Stars at Noon" é uma adaptação do romance homônimo de Denis Johnson. A história original se passa nos anos 1980, durante a Revolução Sandinista. Mas Claire Denis resolveu ambientá-la nos dias de hoje, em plena campanha eleitoral. Os guerrilheiros de ontem se transformaram nos governantes atuais.

"Acho um drama que o [Daniel] Ortega tenha se representado com a Rosário [Murillo]. Mas a Nicarágua é um país forte e cativante, que tem orgulho de ter ganhado a Revolução. O sandinismo não vai morrer assim", comenta a cineasta, em entrevista à Melissa Barra, da RFI. Ela diz que também queria denunciar com o filme "o domínio dos Estados Unidos na América Central".

O filme foi muito elogiado pela imprensa francesa, mas alguns latino-americanos ficaram incomodados com o fato de todos personagens negativos, os bandidos, serem latino-americanos.

Filmagens durante a pandemia

A filmagem de "Stars at Noon" começou durante a pandemia e não pôde ser feita na Nicarágua. Nenhuma seguradora quis fazer um seguro para a produção do longa no território nicaraguense por questões sanitárias e Claire Denis decidiu rodar o longa no Panamá. "Por isso, transpus tudo para os dias de hoje. As eleições na Nicarágua aconteceram em novembro e filmamos durante a eleição. Tinha refugiados nicaraguenses que chegavam ao Panamá", conta

Claire Denis tem 16 longas-metragens. "Stars at Noon" é seu primeiro trabalho na competição pela Palma de Ouro. A presença de Vincent Lindon na presidência do júri poderia beneficiar a cineasta? O ator francês fez três filmes com ela, entre eles o penúltimo "Avec Amour et Acharnement" (Com amor e Determinação), vencedor do Urso de Prata de melhor direção no Festival de Berlim deste ano.

A mesma questão foi colocada em 2009 quando Isabelle Huppert, presidente do júri em Cannes, entregou a Palma de Ouro para a "A Fita Branca" de Michael Haneke, seu cineasta de predileção.