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Relatório de Ong mostra que União Europeia não cumpre objetivos de redução de agrotóxicos

27/05/2022 15h41

Um relatório da Ong Pesticide Action Network Europe (PAN)  mostra que a Europa está muito longe de atingir o objetivo de livrar os pratos de seus consumidores de substâncias tóxicas. Ao contrário, o uso de agrotóxicos, de acordo com a associação, aumentou nos últimos 10 anos. Um terço das frutas produzidas e consumidas na União Europeia atualmente são contaminadas com agentes que poderiam causar problemas hormonais e câncer.

Desde 2011, os estados-membros da União Europeia se comprometeram legalmente a renunciar progressivamente a 55 pesticidas identificados como particularmente nocivos pela Orgnaização pela Alimentação e Agricultura (FAO). Mas o relatório da PAN mostra que não só os países não respeitam o compromisso, como a presença desses elementos tóxicos na alimentação aumentou de maneira espetacular na última década.

Em 2009, uma resolução europeia introduziu uma nova categoria de substâncias ativas chamadas "candidatos à substituição", com o objetivo de identificar as substâncias comprovadamente mais nocivas e substituí-las por alternativas químicas e não-químicas menos prejudiciais ao homem e ao meio ambiente. Em 2020, o Conselho Europeu foi mais longe e apresentou uma estratégia para reduzir em 50% o uso de agrotóxicos até 2030. 

Mas de acordo com o relatório da PAN, publicado nesta semana, em fevereiro de 2022, 56 candidatos à substituição ainda eram usados. Entre eles, o fungicida Ziram, que, segundo pesquisas científicas, causa desequilíbrios hormonais; o inseticida Pirimicarb, que poderia causar câncer e o fungicida Metconazole, que poderia ser tóxico para a reprodução humana.

Obrigação para AAPs

Conhecidos como Agrotóxicos Altamente Perigosos (AAP), de acordo com a FAO, estas substâncias representam um perigo de intoxicação aguda ou crônica, particularmente elevado para a saúde ou para o meio ambiente. Por isso, estes produtos químicos têm regras mais rígidas de uso na Europa.

"A razão pela qual a gente enfrenta este aumento de resíduos dessa categoria de pesticidas mais tóxica nos últimos 10 anos, é simplesmente porque a obrigação que existe, de fazer desaparecer essas substâncias, substituindo por alternativas mais seguras, nunca foi respeitada", lamenta Salomé Roynel, encarregada de campanhas na PAN Europe,  em entrevista à RFI.

"É uma obrigação dos estados-membros, como a França, a Alemanha e a Bélgica, e eles nunca aplicaram essa obrigação. É por essa razão que temos agricultores cada vez mais dependentes dessas substâncias e continuarão a utilizá-las de maneira crescente", afirma.

O estudo se focalizou em frutas e legumes de consumo corrente na Europa como kiwis, cerejas, maçãs e amoras produzidos nos 27 estados-membros do bloco. "Todas as informações ligadas à importação foram retiradas", explica Roynel. "Isso nos faz pressupor que os consumidores estariam sendo expostos a mais resíduos do que os observados durante o estudo", analisa.

Kiwis e cerejas

Entre as frutas, o aumento mais expressivo é o do kiwi. Enquanto a fruta era quase totalmente livre de agrotóxicos dez anos atrás, com apenas 4% contendo resíduos, atualmente 32% estão contaminados. No caso das cerejas, atualmente 50% das frutas europeias contém agrotóxicos contra 22% em 2011. Considerando que 70% dos consumidores europeus comem pelo menos uma fruta ou legume por dia, a presença dos pesticidas nos pratos europeus é representativa.

O aumento do uso de agrotóxicos também poderia estar ligado ao lobby das empresas. "Os produtos observados são os mais tóxicos e os mais eficientes, por isso existe uma forte resistência da indústria agroquímica para mantê-los, para ter lucros, em detrimento dos agricultores, que já são muito dependentes, dos consumidores, isso sem falar do meio ambiente", afirma Roynel.

Mas a inação dos Estados é o que mais preocupa a organização. "Esse relatório, sua principal conclusão é do aumento da presença desses resíduos muito tóxicos que é ligada a uma inação do Estado, e pede mais transparência sobre o que foi feito nestes últimos 10 anos e a prestar contas sobre a razão da não substituição e da não substituição dessas substâncias", diz Roynel.

"Esperamos que leve a uma resposta política forte e compromissos para fazer desaparecer essas substâncias do mercado e dos pratos dos consumidores, nos próximos 10 anos", afirma.

No Brasil, 70%  dos agrotóxicos utilizados são do tipo AAP. Estes produtos são majoritariamente utilizados no país na agricultura, cerca de 85%, na produção, armazenamento e beneficiamento de produtos e nas pastagens e florestas plantadas, sendo a maioria deles herbicidas.