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"Faltam políticas públicas em agroecologia no Brasil", defende vencedora de prêmio internacional

28/06/2022 15h35

O Brasil teve um crescimento no número de cursos superiores de agroecologia nos últimos oito anos, mas ainda é preciso avançar muito em termos de políticas públicas nessa área. A avaliação é da bióloga pernambucana Patrícia Medeiros, especialista em etnobotânica. Ela esteve em Paris na semana passada para a cerimônia de entrega do prêmio Jovens Talentos Internacionais, que recebeu em 2020 da Unesco e da Fundação L'Oréal por suas pesquisas com plantas alimentícias não convencionais (PANCs).

Patrícia Medeiros é coordenadora do bacharelado em agroecologia da Universidade Federal de Alagoas realizado em parceria com o Pronera (Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária), um curso voltado especificamente para acampados, assentados e quilombolas.

"Estamos formando mais profissionais para trabalhar com agroecologia, porque a gente precisa de alimentos saudáveis e de uma produção de base sustentável", explicou a pesquisadora. "Mas ainda temos muito poucas políticas públicas em relação ao que deveríamos ter, dada a importância dessa forma de manejo", disse a professora da Ufal em entrevista à RFI.

Com dois anos de atraso, por causa da pandemia de Covid-19, Patrícia Medeiros e mais 23 pesquisadoras de várias regiões do mundo estiveram na capital francesa para receber o prêmio Unesco-L'Oréal. Ao todo, 30 laureadas que se destacaram na ciência em 2020 e 2022 deveriam estar presentes, mas algumas não puderam fazer a viagem. A brasileira saboreou a imersão científica. "Foi interessante entender a diversidade, as particularidades de cada país, de cada cultura. Muitas vezes nós passamos pelos mesmos problemas e estar inserida tão fortemente nesse meio foi uma felicidade muito grande, um privilégio", revelou a pernambucana.    

Em seu dia a dia, Patrícia Medeiros faz pesquisas de campo para identificar plantas pouco conhecidas, mas que podem contribuir para a preparação de pratos e bebidas com alto valor nutricional. O trabalho dela e de sua equipe consiste em percorrer comunidades para conhecer os usos de frutos ditos não convencionais, como o cambuí, o araçá ou o ouricuri, entre outros.

Durante a pandemia, as visitas às comunidades foram suspensas, assim como a ida aos mercados e feiras para fazer as pessoas degustarem os frutos. "Mas aproveitamos para fazer pesquisas online e obtivemos resultados interessantes sobre o público que estaria mais propenso a consumir as plantas alimentícias não convencionais (PANCs)", conta a brasileira. Segundo ela, foi importante colher informações sobre aspectos que podem interferir na aceitação desses produtos. 

Popularização de produtos e valorização cultural

Os questionários revelaram que em alguns casos, as pessoas mais velhas estão mais dispostas a consumir uma planta do que as mais jovens, apenas porque já tiveram uma experiência anterior com o produto. Além do cheiro, do sabor e da aparência do alimento, o nome da planta pode interferir no interesse que ela desperta. "Estudos mostram que se você chama um prato com um nome gourmet, ele pode ter uma aceitação maior do que se tivesse um nome mais simples", explica Patrícia Medeiros. 

Hoje, os pesquisadores da área questionam se a denominação PANCs é a mais apropriada. "Nomes desconhecidos, como cambuí ou ouricuri, tendem a gerar menos expectativas do que se colocamos nomes que se assemelham ao de uma planta convencional", relata a bióloga especialista em etnobotânica. Nem por isso as populações de agricultores e extrativistas devem mudar o nome dessas plantas, estima. "A popularização desses produtos deve vir acompanhada de uma valorização cultural", destaca a professora da Ufal.