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Conferência do Oceano busca avanços para acordo global de proteção

30/06/2022 08h28

A Conferência do Oceano acontece nesta semana em Lisboa, cinco anos depois do último encontro de alto nível promovido pela ONU para abordar a proteção dos ecossistemas marinhos. Adiado dois anos pela pandemia, o evento busca acelerar um consenso quanto à importância de um acordo global para proteger os ecossistemas marinhos, a exemplo de outros temas ambientais que chegaram a tratados entre os países, como o clima.

A última grande conferência da ONU sobre o assunto tinha acontecido em 2017, e esta agora é a apenas a segunda. Mas esse quadro está se revertendo, inclusive no âmbito da ONU. A relevância do tema é cada vez menos questionada: os oceanos cobrem 70% da superfície do planeta e geram mais de 50% do oxigênio que os seres vivos respiram sobre a Terra.

"A emergência climática só não está mais grave porque o oceano foi barrando isso enquanto conseguia, removendo CO2 da atmosfera", ressalta o professor Ronaldo Christofoletti, do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e presente em Lisboa. "Mas enquanto ele segurou, ele começou a cansar. Já começamos a ter sinais muito claros disso: o oceano está pedindo ajuda. E ainda há tempo de fazermos diferente."

A Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, fixada pelas Nações Unidas entre 2021 e 2030, foi crucial para aumentar a mobilização em torno do assunto. Mas um amplo acordo global sobre o oceano ainda parece distante.

"Quem sabe na próxima conferência, em 2025. Acho que todos os arranjos necessários para que esse acordo vá sendo construído coletivamente estão sendo feitos", avalia Christofoletti. "A gente teve um exemplo recente, sobre os plásticos, com um acordo especificamente para o lixo no mar. Já é um grande avanço, mas ainda teremos de trabalhar mais um pouco por um tratado global."

Áreas protegidas

Em março, os países reunidos na Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente no Quênia chegaram às bases de um texto para limitar a poluição por plásticos, que mata a cada ano 100 mil mamíferos marinhos. A expectativa é de que um pacto formal sobre o tema seja assinado em 2024.

A cúpula em Lisboa, com representantes de cerca de 100 países, empresas e a sociedade civil, também pretende avançar rumo a um compromisso para frear a pesca excessiva. Hoje, um terço das espécies selvagens de peixes são pescados além dos limites que garantem a sua sobrevivência.

Passar dos atuais menos de 10% de áreas marinhas protegidas para 30% é outro grande desafio, que a ONU se coloca para 2030. Nesta quarta-feira (29), uma centena de países se comprometeram com este objetivo em Lisboa - pouco mais da metade dos 193 que compõem as Nações Unidas.

"São tantas frentes: plásticos, produtos químicos, fertilizantes, que chega a dar um desespero. Mas tudo isso tem duas raízes: as atividades humanas, que podem ser regulamentadas, e colocar em prática o que a gente combinar, pelas leis", observa Alexander Turra, professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo e coordenador da Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano no Brasil. "Não há antagonismo entre a natureza e a economia, o desenvolvimento. Outro aspecto é a pobreza: ela é um sintoma de um modo insustentável da sociedade", sublinha o especialista.

"Racismo oceânico"

A maneira como o oceano é tratado reflete o nível de desenvolvimento de cada país. O velho embate entre nações desenvolvidas e em desenvolvimento também emerge nos temas relacionados aos oceanos: como exigir dos países pobres mais cuidado com a gestão do mar sem ajudá-los a financiar os mecanismos mais adaptados, menos nocivos ao ambiente marinho?

"A gente precisa de um sentimento de empatia, de cooperação. A vulnerabilidade a que milhões de pessoas estão expostas precisa ser combatida, inclusive aquelas que estão morando no que chamamos de aglomerados subnormais, que são áreas de risco como encostas, áreas de manguezal - que são, também, mais sujeitas aos efeitos das mudanças do clima", salienta Turra. "Isso nos remete ao racismo oceânico, o racismo ambiental. As pessoas que acabam sofrendo desproporcionalmente mais com essa situação são as pobres, as negras, todas as que estão à margem da sociedade hoje."

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