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Novo presidente da Colômbia promete reformas ambiciosas e foca na liderança regional

08/08/2022 05h59

Com a promessa de realizar reformas profundas, reunificar a Colômbia, acabar com a corrupção e promover dignidade - sobretudo das mulheres - Gustavo Petro e Francia Marquez assumiram neste domingo (7) a presidência e a vice-presidencia da Colômbia. Na cerimônia, eles foram aplaudidos por centenas de eleitores, que lotaram a Plaza de Bolívar, na capital Bogotá. O ex-guerrilheiro e a afrodescendente ambientalista escrevem um novo capítulo da História colombiana com a chegada da esquerda ao poder.

Elianah Jorge, correspondente da RFI na Venezuela

Em um discurso ambicioso, Petro prometeu implementar muitas reformas durante sua gestão de apenas quatro anos (2022-2026). Para este economista eleito em sua terceira disputa à presidência, uma das principais mudanças diz respeito às questões tributárias, focando também na educação e previdência. O objetivo, segundo ele, é oferecer um país mais igualitário aos mais de 50 milhões de habitantes da Colômbia. 

Seus audaciosos projetos vão além do plano nacional. Durante o discurso de posse, Petro afirmou que pretende se tornar um líder regional e global. A alocução foi realizada ao lado da espada original de Simón Bolívar (1783-1830), conhecido como "o Libertador", e considerado um herói nacional na Colômbia.

O novo presidente defende que seu mandato é uma oportunidade ao país de corrigir as falhas do passado. Petro defendeu mais esforços para preservação do meio ambiente, como o uso de energias limpas não apenas na Colômbia, mas no mundo. 

Igualdade salarial e oportunidades para todos

Petro foi aplaudido ao falar sobre igualdade salarial e de oportunidades entre homens e mulheres. Várias vezes durante seu discurso ele fez referência à importância de reconhecer os esforços das colombianas e de oferecer a elas melhores condições. 

"Não podemos permitir que as mulheres ganhem menos que os homens e que estejam menos representadas nas instituições. É hora de equilibrar essa balança", declarou Petro.

Com um gabinete diverso quanto a sexo e origens étnicas, à imagem da população colombiana, Petro se mostra disposto a implementar as mudanças exigidas pelo povo. 

O novo presidente também defendeu um novo enfoque em relação à política global anti-drogas. A Colômbia continua sendo o país que mais produz cocaína no mundo. 

Petro vai governar junto com a vice-presidente Francia Márquez, advogada de 40 anos. Afrodescendente, ex-empregada e mãe solteira, ela é conhecida no país por seu ativismo ambiental. Originária de uma das regiões mais discriminadas da Colômbia, Francia representa uma parte da população relegada pelos governos anteriores.

Petro terá muitos desafios 

O fato de Petro ser o candidato à presidência mais votado da História do país e levar a esquerda ao poder na Colômbia traduz o apelo popular por mudanças. Essa necessidade foi evidenciada pelos mais de 50% dos votos que o o líder recebeu no segundo turno das eleições presidenciais.

O novo presidente promete fazer jus ao eleitorado. No discurso de posse, Petro reforçou a necessidade de paz em um país ferido por décadas de sangue derramado devido às disputas dos carteis de drogas ou dos grupos armados que ainda existem em regiões remotas da Colômbia. 

"Temos que acabar com anos de guerra. Cumpriremos com o acordo de paz. Temos que construir o país da vida", bradou.

Mesmo com a favorável taxa de crescimento econômico de 7,2% esse ano, os colombianos sofrem com as altas taxas de juros e de impostos, além dos estratosféricos preços dos serviços públicos, da saúde e da educação. 

De acordo com a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal) a taxa de pobreza na Colômbia foi de 36,3% no ano passado. Em 2022, esse índice deve chegar a 39%, incitado pelo aumento da inflação. 

"Somos uma das sociedades mais desiguais no planeta terra e isso é uma aberração! Não é possível se queremos viver em paz. Vamos fazer uma Colômbia mais igual para todos", prometeu o presidente. 

Para analistas, a reforma mais complexa será a tributária, que pode trazer novos investimentos ao país. Outro ponto sensível será o aumento de impostos aos mais ricos. 

Durante a cerimônia que oficializou a troca de governo, a mesma população que aplaudia Gustavo Petro vaiava intensamente Iván Duque (2018-2022). O presidente deixa o poder com uma aprovação de apenas 27%.

América Latina à esquerda

Com a posse de Petro, a balança latino-americana pende ainda mais à esquerda. O cenário pode se reforçar se Luiz Inácio Lula da Silva ganhar as eleições presidenciais deste ano no Brasil. 

Durante o discurso, Petro ressaltou sua disposição para assumir a liderança da região. "A união latino-americana não foi possível durante a pandemia. Teremos uma América Latina sem poder coordenar pesquisas de saúde? Buscaremos aliança com a África e com o mundo árabe. Uniremos a Colômbia ao mundo", sentenciou.

O novo chefe de Estado colombiano alfinetou os Estados Unidos e também saudou os líderes da esquerda presentes na cerimônia, entre eles, os presidentes Albertos Fernándes, da Argentina, Luis Arce, da Bolívia e Xiomara Castro, de Honduras. A ex-presidente do Brasil Dilma Rousseff também marcou presença. Já o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, representou a direita no evento.  

Retomada das relações com a Venezuela

Antes da posse, Gustavo Petro vinha articulando uma reaproximação com Nicolás Maduro. Iván Duque rejeitava a legitimidade do líder bolivariano, em defesa do político opositor Juan Guaidó, autoproclamado presidente da Venezuela.

No último 28 de julho o chanceler venezuelano Carlos Faría se reuniu com então indicado e agora ministro de Relações Exteriores da Colômbia Álvaro Leyra. O encontro marcou o interesse da Colômbia e da Venezuela avançarem na normalização gradual das relações bilaterais após a posse de Petro, com a nomeação de diplomatas para trabalhar nas embaixadas e consulados dos respectivos países.  

Na reunião, ambos os representantes se comprometeram a "garantir a segurança e a paz" nos mais de 2.200 quilômetros de fronteira em comum. Com a iniciativa, os mais de 2,5 milhões de venezuelanos em solo colombiano podem ser beneficiados com a flexibilização das leis em prol dos imigrantes. 

Há uma forte expectativa pela reabertura da Ponte Internacional Simón Bolívar, o principal ponto de passagem entre os dois que está fechado ao tráfego de veículos desde 2019. 

O comércio bilateral também deverá ser aquecido com a reaproximação dos países, sobretudo nas cidades fronteiriças de Cúcuta, no lado colombiano, e na de São Cristóvão, na parte venezuelana. De acordo com o economista venezuelano Asdrúbal Oliveros as relações comerciais entre os dois países poderiam chegar a US$ 250 milhões de dólares em 2023, com a balança favorável às empresas colombianas por causa da atual falta de infraestrutura venezuelana.