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Filme da brasileira Ana Vaz em competiçao no Festival de Locarno navega por vários gêneros do cinema

11/08/2022 12h30

O longa-metragem "É Noite na América", da artista e cineasta brasiliense Ana Vaz, foi exibido na noite de quarta-feira (10) no Festival de Cinema de Locarno, na Suíça. Neste novo trabalho, a diretora, que tem Brasília como eixo de construção e reflexão crítica de sua obra, segue com sua câmera uma série de animais que foram parar na capital federal, perdidos, depois de serem expulsos de seu habitat selvagem no Cerrado, tanto pela expansão urbana quanto pela violência do agronegócio. 

O longa-metragem "É Noite na América", da artista e cineasta brasiliense Ana Vaz, foi exibido na noite de quarta-feira (10) no Festival de Cinema de Locarno, na Suíça. Neste novo trabalho, a diretora, que tem Brasília como eixo de construção e reflexão crítica de sua obra, segue com sua câmera uma série de animais que foram parar na capital federal, perdidos, depois de serem expulsos de seu habitat selvagem no Cerrado, tanto pela expansão urbana quanto pela violência do agronegócio. 

"O peso da construção, dessa modernidade excludente, extrativista, é algo que assombra e acompanha meu trabalho desde o início", disse Ana Vaz em entrevista à RFI. Ela recorda que todas as cidades modernas foram erguidas a partir da expulsão dos animais do espaço urbano. "Essa separação criou o princípio da modernidade, mas com o foco na proteção de apenas um certo tipo de humanidade", critica Vaz. 

A intensificação da destruição do Cerrado tem causado a fuga de espécies selvagens que nunca deveriam buscar refúgio nas cidades. São tamanduás, lobos-guará, jibóias, corujas ou capivaras que aparecem nos locais mais improváveis. Muitos são recolhidos ao Zoológico de Brasília. 

Em seu filme, Ana Vaz busca o olhar animal como um olhar de perplexidade, "um olhar de confrontamento à edificação dessa modernidade que nós conhecemos, neste caso incorporado pela cidade de Brasília, mas que poderia ser muitas outras cidades", explica a cineasta. O longa é um constante confrontamento com o olhar dos animais que nos olha, diz ela. 

"Eu sempre procurei ler a topografia e a história da cidade a partir de perspectivas múltiplas que tentam descentralizar o olhar humano como o único olhar que traz significado e sentido para nossa relação com o mundo", destaca a cineasta. 

De acordo com a diretora, que vive entre França, Brasil e Portugal, depois de ter morado na Austrália, a história do cinema foi inteiramente construída a partir de uma ideia de que a câmera seria um objeto de observação passiva do mundo que sempre observa e nunca é observada. "No meu cinema, a câmera se torna um corpo, um corpo presente que tenta uma relação de reciprocidade com os outros corpos que esse corpo-câmera está a filmar", afirma.  

Reclamação das espécies

O longa navega entre vários gêneros do cinema, como "uma espécie de western documentário ou como uma fábula de 'eco-terror' que trata da reclamação das espécies que foram maltratadas, extraídas e vítimas da modernidade colonizadora e que voltam aos espaços urbanos para reclamar o que lhes foi tirado", explica Ana Vaz.

Para a filmagem, ela utilizou uma técnica bastante conhecida na história do cinema, particularmente nos filmes de faroeste, que é a noite americana, também incorporada ao título do longa. Essa técnica permite transformar o dia em noite, permitindo explorar a potência da noite como elemento transformador das relações. 

"É Noite na América", uma coprodução franco-italiana-brasileira, concorre a um prêmio Leopardo na seção Cineastas do Presente. Os vencedores desta 75ª edição do Festival de Locarno serão conhecidos no sábado (13). O filme também tem duas versões instalativas, atualmente em cartaz em Portugal e na Itália.