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Itália: começa julgamento movido por Giorgia Meloni contra escritor Roberto Saviano

15/11/2022 10h22

Um julgamento que opõe a líder do governo italiano de extrema direita Giorgia Meloni contra o escritor e jornalista investigativo Roberto Saviano começa nesta terça-feira (15). O autor de "Gomorra", sobre a máfia, foi acusado de difamação por ter criticado Meloni violentamente em 2020 por causa de sua postura contra os migrantes. Ele a chamou de "bastarda". 

O partido Irmãos da Itália, de Meloni, estava na oposição na época, mas assumiu o poder no mês passado após uma vitória esmagadora nas eleições, motivada em parte por sua promessa de interromper o fluxo de migrantes pelo Mediterrâneo.

Saviano, mais conhecido por seu best-seller internacional sobre a máfia, "Gomorra", pode pegar até três anos de prisão. Meloni, a caminho de Bali, Indonésia, para o encontro do G20, não estará presente na audiência.

O caso remonta a dezembro de 2020, quando o escritor foi convidado num programa político a comentar a morte, num naufrágio, de um bebê de seis meses da Guiné.

A criança, Joseph, foi um dos 111 migrantes resgatados pelo navio humanitário Open Arms, mas morreu antes que pudesse receber tratamento médico.

Em imagens feitas por salva-vidas e mostradas a Saviano no programa, a mãe do bebê pode ser ouvida chorando "Onde está meu bebê? Socorro, estou perdendo meu bebê!"

Ele então apontou o dedo para Meloni e Matteo Salvini, o líder da Liga Anti-Imigração, agora membro do atual governo de coalizão.

"Meloni e Salvini, seus bastardos! Como vocês puderam?", disse Saviano no programa.

Meloni havia dito, em 2019, que navios humanitários de ONGs que resgatam migrantes "deveriam ser afundados", enquanto Salvini, como ministro do Interior no mesmo ano, bloqueou a chegada de tais navios à Itália.

Apelo internacional

A associação de escritores PEN International, que defende a liberdade de expressão, enviou uma carta aberta a Giorgia Meloni esta semana, pedindo que retirasse a queixa.

Saviano, 43, disse à AFP que o julgamento é um "confronto desigual, decididamente grotesco", enquanto grupos de liberdade de imprensa alertaram que isso enviava uma "mensagem assustadora" aos jornalistas.

Para o autor, sob proteção policial desde a publicação de "Gomorra" devido a ameaças da máfia napolitana da Camorra, os processos contra ele visam "intimidar um para intimidar cem".

"Será ainda mais difícil (para os jornalistas) relatar o que está acontecendo" se suas palavras forem "julgadas quando criticam o poder e suas políticas desumanas", disse Saviano.

Grupos de liberdade de imprensa dizem que tais julgamentos simbolizam uma cultura na Itália, em que figuras públicas, muitas vezes políticos, intimidam jornalistas com processos judiciais repetidos.

A Itália está classificada em 58º lugar no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa de 2022 publicado pelos Repórteres Sem Fronteiras, o nível mais baixo da Europa Ocidental.

O julgamento de terça-feira não é o único que Saviano enfrenta por difamação. Ele foi processado em 2018 por Matteo Salvini após chamá-lo de "il ministro della Malavita", ou ministro da vida desgraçada. Esse julgamento deve começar em fevereiro.

"Gomorra" foi adaptado para o cinema em 2008, com roteiro escrito pelo próprio Saviano, com direção de Matteo Garrone. O filme foi o vencedor do Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes. A trama deu ainda origem à série "Gomorra", criada por Saviano, com seis temporadas. 

(com informações da AFP)