Invasões aos Três Poderes podem fortalecer Lula, mas aumentam pressões do mercado
A fraca reação da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) aos ataques à Praça dos Três Poderes por vândalos bolsonaristas sinaliza que o mercado financeiro entendeu a reação do governo Lula como adequada e o risco de ruptura institucional, limitado. Entretanto, a crise política aberta logo na primeira semana do mandato aumenta ainda mais as pressões sobre a agenda econômica do presidente petista, avaliam analistas ouvidos pela RFI.
No dia seguinte às invasões ao Planalto, Supremo Tribunal Federal e o Congresso, a Bovespa fechou em alta de 0,15%. Do ponto de vista externo, os atos criminosos ao coração do poder entram numa continuidade de instabilidade política iniciada em 2013 no país, assinala o consultor francês Stéphane Witkowski, presidente do Instituto de Altos Estudos sobre a América Latina (IDEAL), em Paris, e conhecedor de longa data do ambiente de negócios no Brasil.
Para ele, mensagem de união e defesa da democracia dos presidentes dos Três Poderes da República e a condenação unânime dos acontecimentos em Brasília pela comunidade internacional reforçam a confiança do mundo em Lula, já demonstrada na posse do novo presidente.
"Eu tenho a convicção de que os meios econômicos e financeiros podem entender perfeitamente que é uma consequência dos últimos atos da presidência Bolsonaro, mas alguns aspectos dessa crise ficarão ainda por alguns anos porque tem uma crise profunda de tendências da sociedade brasileira, nos últimos dez anos. Uma crise institucional, política, mas também democrática do Brasil", salienta.
Ainda mais pressões pelo equilíbrio fiscal
Em outras palavras, pior do que estava, não ficou. Daniela Magalhães Prates, economista sênior da Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), em Genebra, afirma que as instabilidades políticas sempre afetam as decisões dos agentes econômicos - empresários, consumidores, investidores. Num contexto internacional que está desfavorável para a América Latina, ela considera que o mercado tende a usar esse argumento para pressionar ainda mais o governo. Na mira, está o ajuste fiscal necessário para equilibrar as receitas e poder bancar o excesso de despesas previsto no orçamento deste ano.
"A economia internacional vai desacelerar e, com isso, os preços das commodities não vão continuar altos como estavam. Essa situação reduz a margem de manobra para adotar políticas mais expansionistas. O embate com o mercado vai ser um problema", afirma a economista. "A incerteza política pode ser usada para isso: reduzir a margem na política fiscal e monetária. Dizem que como o governo está enfrentando incerteza política, insegurança institucional, então não é hora de diminuir juros nem de achar que podem gastar."
Witkowski acrescenta ainda a reforma política, que se mostra mais necessária do que nunca. O consultor empresarial ressalta que "esses primeiros meses serão muito decisivos" para o presidente demonstrar liderança e transmitir confiança. "Eu diria que o verdadeiro teste para a comunidade econômica e financeira internacional será a capacidade do governo Lula de passar as reformas econômicas no Congresso e avançar nos principais objetivos econômicos do seu programa, nas próximas semanas", sublinha o francês.
Falhas de segurança
O professor de economia da PUC-SP Antonio Alves dos Santos observa ainda que os ataques em Brasília, com provável colaboração das forças de segurança, evidenciam a fraqueza do governo petista para garantir a segurança - um alvo histórico de críticas ao partido. Os acontecimentos também escancaram o diálogo frágil entre o Planalto e as Forças Armadas - e coloca na berlinda dois ministros do primeiro escalão do governo, o da Justiça, Flávio Dino, e o da Defesa, José Múcio Monteiro.
"A leitura que o mercado vai fazer desses dois ministros me parece ser muito mais relevante do que a avaliação que será feita a respeito da atuação do ministro Haddad. Quer dizer, o governo está batendo cabeça na área econômica, mas também na área de segurança", comenta o professor. "Isso é preocupante, e deve assustar muito os investidores internacionais."
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