Turquia: quem é Kemal Kiliçdaroglu, o homem que desafiará Erdogan nas urnas?
Na Turquia, a pouco mais de dois meses das eleições legislativas e presidenciais, previstas para 14 de maio, o lançamento oficial da campanha eleitoral aconteceu nesta sexta-feira (10), com um grande desafio para a oposição: pôr fim aos 20 anos de poder de Recep Tayyip Erdogan.
Depois de 11 anos à frente do governo e outros nove à frente do Estado, Erdogan deve enfrentar este ano uma coalizão de oposição fortíssima, que inicia sua campanha com otimismo: uma primeira pesquisa de intenção de voto dá 14 pontos de vantagem a seu candidato Kemal Kiliçdaroglu.
A escolha foi feita há apenas poucos dias, após longas e difíceis negociações entre os partidos reunidos na chamada Mesa dos Seis, a aliança nacional composta pelos seis partidos de oposição. A aliança oposicionista tem agora dez semanas para vencer o poder estabelecido, o que não consegue fazer há duas décadas.
Kiliçdaroglu, de 74 anos, ex-funcionário público e economista de formação, prometeu uma ruptura total com a era Erdogan: "Estamos hoje muito perto de derrubar o trono dos tiranos", lançou ele esta semana.
Kemal Kiliçdaroglu costuma estar sorridente em suas aparições públicas, mantém uma fala sempre calma, destacando sua origem humilde. Sua figura esguia lhe rendeu o apelido de Gandhi turco. Ele está na política há mais de 20 anos, mas será sua primeira vez na disputa presidencial à frente do CHP, o Partido Popular Republicano fundado pelo primeiro presidente da República Turca, Mustafa Kemal Atatürk (1923-1938).
Mais diversidade
Ao dialogar com curdos, mulheres que portam véus e nacionalistas conservadores, ele abriu as portas para mais diversidade, correndo o risco de desagradar alguns políticos de suas próprias fileiras. Mas essa arte de conciliação parece ser um pouco sua marca registrada.
Kiliçdaroglu não tem o carisma de Erdogan para dominar as multidões, mas não tem poupado esforços para conquistar Istambul e Ancara. Desde o terremoto que abalou o país em 6 de fevereiro, ele é o principal crítico do governo.
As pesquisas de opinião preveem uma eleição apertada, a mais perigosa para Erdogan desde que chegou ao poder, em 2003. A disputa eleitoral ainda prevê um possível apoio da sigla pró-curda Partido Democrático dos Povos (HDP) à coalizão da Mesa dos Seis.
A Justiça turca liberou recentemente a ajuda pública ao HDP. Com isso, o partido pró-curdo, terceira força política do país, acusado de estar ligado ao PKK, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão descrito como "terrorista" por Ancara e seus aliados ocidentais, vai reaver cerca de € 27 milhões em fundos que lhe seriam atribuídos este ano.
Alguns analistas políticos conferem ao HDP um papel crucial no resultado da eleição, mas o partido segue ameaçado de fechamento, e deve ser ouvido pela Justiça nos próximos dias. O HDP obteve quase 12% dos votos nas eleições legislativas de 2018.
Terremoto político
O atual presidente deve enfrentar fortes críticas, durante a campanha, após os fracassos da resposta ao terremoto. Erdogan deve também, e principalmente, responder por uma inflação desenfreada, um colapso da moeda, além de uma crise social que desgastou sua autoridade.
Não por acaso, ao lançar sua campanha nesta sexta-feira, o presidente turco prometeu "curar as feridas" do país, se referindo às consequências do terremoto. O chefe de Estado precisou ainda que, pelas circunstâncias e pelas mais de 46 mil mortes registadas nesta catástrofe que assolou o sul e o sudeste do país, esta será uma "campanha sem música".
Erdogan, de 69 anos, que falava do palácio presidencial em Ancara, justificou a manutenção das eleições antecipadas de 14 de maio porque "a Turquia não tem tempo a perder, nem pode se distrair ou gastar energia em vão".
"Queremos fazer de 14 de maio uma data que apague o impacto da destruição de 6 de fevereiro", ele defendeu, antecipando o provável slogan de sua campanha: "Agora, pela Turquia!".
Reconstrução gratuita e em um ano
O presidente turco prometeu uma reconstrução gratuita, "em um ano", quando o terremoto de magnitude 7,8 devastou cerca de 278 mil edifícios e, além dos mortos, deslocou mais de 3 milhões de pessoas. Ele também começou a distribuir 10 mil liras turcas (cerca de R$ 2,7 mil) às famílias afetadas.
O chefe de Estado também anunciou que qualquer candidato ao parlamento de seu partido, o AKP, terá que anunciar a quantia que pretende depositar em favor das vítimas.
Recep Tayyip Erdogan, no entanto, ainda mantém muitos ativos a seu favor - incluindo uma mídia e uma sociedade civil sob forte controle, um certo carisma junto a uma parte da população e uma imagem internacional reforçada pelo conflito na Ucrânia.
(Com informações da AFP)
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