Em meio à crise de moradia, Espanha vai regular aluguéis de curta duração e turísticos
Iniciativa foi anunciada em meio à crise imobiliária enfrentada pelo país, marcada por mobilizações sociais pelo direito à moradia.
Ana Beatriz Farias, correspondente da RFI em Madri
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O governo espanhol anunciou, nesta terça-feira (15), a criação de um sistema de registro único para regular os aluguéis de curta duração. A ministra da Habitação e Agenda Urbana, Isabel Rodríguez, explicou que, como a Lei de Habitação de 2023 não contemplou plenamente o problema dos contratos de curto prazo, o objetivo agora é regulamentar especificamente aluguéis turísticos e por temporada.
A nova regulamentação incluirá uma plataforma digital onde todos os imóveis disponíveis para aluguel por períodos curtos deverão ser registrados. Cada imóvel receberá um número de inscrição que permitirá a sua operação em páginas de internet e aplicativos.
Caso o proprietário não tenha esse registro, o imóvel não poderá ser oferecido em plataformas digitais. A ideia é combater os apartamentos turísticos ilegais.
Em relação aos aluguéis por temporada, será necessário justificar a natureza temporária do contrato, como o fato de o inquilino estar matriculado em um curso que dura seis meses, por exemplo, ou ter cum contrato de trabalho de algumas semanas.
Para a ministra Isabel Rodríguez, essa iniciativa permitirá um maior controle do cumprimento das normas municipais e regionais relacionadas aos aluguéis turísticos e por temporada. "Estamos sendo aliados, com esse instrumento, de apoio às outras administrações que têm competência na matéria", disse.
Rodríguez também ressaltou que a iniciativa visa priorizar o aluguel de residências habituais, com o objetivo final de aumentar a oferta de moradia disponível para os residentes.
A ministra anunciou ainda que a regulamentação dos aluguéis de curta duração estará concluída antes do final de 2024. "Seremos o primeiro país da União Europeia a desenvolver esse regulamento, essa normativa europeia", afirmou.
Até maio de 2026, todos os países do bloco devem possuir um registro único de imóveis alugados por curtas temporadas.
"Vale Aluguel" para os jovens
O Conselho de Ministros também aprovou, nesta terça-feira, a renovação do programa "Vale Aluguel Jovem", que destinará € 200 milhões (R$ 1,2 bilhão) para que as Comunidades Autônomas redistribuam essa verba entre seus cidadãos. A medida, em vigor há dois anos, está sendo estendida num momento em que os preços dos aluguéis continuam a disparar no país.
A ajuda, no valor de € 250 (R$ 1.500) por mês, é válida por um período de 24 meses e deve beneficiar jovens entre 18 e 35 anos. Para ter direito ao benefício, é necessário comprovar uma renda anual que não ultrapasse, em geral, os € 21.600 (R$ 133.000). No entanto, esse limite pode variar conforme a região da Espanha onde o beneficiário reside.
Vale ressaltar que Navarra e o País Basco não estão incluídos no programa, já que possuem regimes e programas de benefícios próprios.
A renovação do "Vale Aluguel Jovem" gerou divergências com o Sumar, que compõe a coalizão governista. O partido de esquerda argumenta que medidas como essa podem acabar inflacionando ainda mais os preços dos aluguéis e que o vale para jovens "não faz sentido" se não vier acompanhado de um controle nos valores cobrados.
Por outro lado, a ministra da Habitação e Agenda Urbana defendeu que tanto o registro único de aluguéis de curta duração quanto a continuidade do Vale Aluguel Jovem são parte de um conjunto de medidas para tentar garantir que os cidadãos não tenham que destinar mais de 30% de sua renda à moradia.
Mobilização social
Essa movimentação por parte do governo acontece num momento em que a sociedade espanhola tem se mobilizado de diferentes formas para reivindicar o acesso à moradia.
No último domingo, Madri foi palco de uma grande manifestação contra a alta dos preços dos aluguéis. Segundo o governo, 22 mil pessoas participaram do protesto, mas os organizadores falam em mais de 100 mil.
Com o lema "Moradia é um direito, não um negócio", os manifestantes pediram, principalmente, a redução dos preços dos aluguéis. A porta-voz do Sindicato de Inquilinas, Valeria Racu, classificou o protesto como histórico e declarou à imprensa que, se os preços continuarem subindo, os inquilinos podem recorrer a uma greve de aluguéis, deixando de pagar aos locatários.
Entre 2015 e 2023, os preços de compra de imóveis na Espanha aumentaram 47%, enquanto os valores dos aluguéis subiram ainda mais, 58%. Na Comunidade de Madri, o aumento foi ainda mais acentuado, com os valores de compra de imóveis subindo 63% no mesmo período.