Acusada de censura por Zuckerberg e Musk, UE deve regular internet sem prejudicar relação com os EUA
A Comissão Europeia rejeitou "categoricamente", nesta quarta-feira (8), as acusações de censura lançadas na véspera pelo presidente da Meta, Mark Zuckerberg, contra a União Europeia. Diante da pressão das empresas de tecnologia americanas, o bloco deve se manter firme na regulamentação da internet sem, no entanto, prejudicar sua relação com os Estados Unidos.
"Refutamos absolutamente qualquer alegação de censura da nossa parte", disse em Bruxelas a porta-voz da Comissão Europeia, Paula Pinho.
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"O número de leis que institucionalizam a censura (na UE) continua a aumentar e é difícil construir algo inovador lá", disse na terça-feira (7) Zuckerberg, repetindo uma acusação de Elon Musk e de movimentos de extrema direita. A declaração foi feita ao mesmo tempo que o CEO da Meta anunciou o fim do sistema de checagem de fatos do Facebook nos Estados Unidos. A decisão não tem impacto na Europa de momento.
No ano passado, a Comissão Europeia adotou um vasto arsenal jurídico para regular o seu espaço digital, com um texto importante para combater o abuso de posição dominante no domínio econômico (o DMA), e outro para coibir os conteúdos ilegais e a desinformação na Internet (o DSA).
Apesar disso, utilização de verificadores independentes não é uma obrigação na UE, mas um compromisso voluntário que pode ser levado em conta pelo regulador entre os esforços das plataformas para reduzir os riscos de manipulação de informação. Diversas mídias participam de programas de checagem de fatos de maneira voluntária.
Diante dos ataques de Elon Musk e Mark Zuckerberg, agora alinhados com Donald Trump, a União Europeia, acusada de "censura", deve demonstrar que tem os meios legislativos - e a vontade política - para resistir às empresas da tech americana.
No entanto, desde a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, assumindo uma linha dura contra a Europa, o executivo de Bruxelas parece preocupado em não ofender seu aliado americano.
Silêncio de Bruxelas
O silêncio da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afastada devido a uma pneumonia, mas também de seus comissários, foi sentido nos últimos dias. Eles não fizeram a menor intervenção nas redes sociais apesar dos ataques de Elon Musk, que aumentou suas provocações no X, interferindo no debate político no Reino Unido e na Alemanha. O bilionário, indicado como futuro ministro da Eficácia de Donald Trump, participará na quinta-feira (9) de uma conversa com o líder do partido de extrema-direita alemão, AfD, transmitida pelo X, um mês e meio antes das eleições legislativas no país.
A porta-voz de von der Leyen, Paula Pinho, justificou o seu silêncio na terça-feira (7) pelo desejo de não dar mais visibilidade às mensagens problemáticas. "Ao reagirmos também alimentamos o debate, a escolha política neste momento é não alimentar ainda mais este debate", disse ela.
A aparente passividade provocou a reação de Paris. O chefe da diplomacia francesa, Jean-Noël Barrot, pediu a Bruxelas na quarta-feira que proteja os estados-membros da UE contra interferências no debate público europeu. "Ou a Comissão Europeia aplica com a maior firmeza as leis que protegem nosso espaço público, ou terá de concordar em devolver aos estados-membros da UE a capacidade para fazer isso", disse.
O silêncio da Comissão também contrasta com a firmeza demonstrada em dezembro quando anunciou a abertura de uma investigação contra o TikTok. A rede social chinesa é acusada de ter falhado em suas obrigações de vigilância e de ter facilitado possíveis manipulações russas nas eleições presidenciais canceladas na Romênia. "Devemos proteger as nossas democracias de todas as formas de interferência estrangeira", declarou Ursula von der Leyen na época.
Sem ataques frontais a Trump
"Há, sem dúvida, uma intenção de não atacar frontalmente Trump e Musk porque temos medo das reações", avalia Alexandre de Streel, especialista em legislação digital do Centro de Regulação na Europa (Cerre). A Comissão "foi mais rigorosa com as plataformas chinesas", sublinha, destacando o complicado contexto geopolítico com a guerra na Ucrânia e a dependência militar dos europeus em relação aos Estados Unidos.
"Se a Comissão abrisse um procedimento contra Musk, acrescentaria mais do que lenha na fogueira", observa também Umberto Gambini, sócio da consultoria Forward Global, especializada em assuntos europeus. A implementação do DSA "continua a ser muito política", segundo ele.
Isto também se aplica ao DMA. Segundo várias fontes, o gabinete de von der Leyen congelou recentemente o anúncio de uma multa contra a Apple por práticas anticompetitivas, preocupada em não prejudicar as relações transatlânticas.
Uma investigação também foi aberta contra o X em dezembro de 2023. Mas ainda não foi anunciada nenhuma acusação formal por suspeitas de manipulação de algoritmos que tornariam mais visíveis mensagens de Musk ou da extrema direita.
Nesta área, as violações são "muito difíceis de provar", explica de Streel. Segundo ele, a DSA "provavelmente não vai longe o suficiente" para regular a Internet. As plataformas digitais não estão sujeitas às mesmas regras de equilíbrio político que os meios de comunicação tradicionais.
(Com AFP)