"Trump insultou nosso povo", diz embaixadora da Palestina na França

Hala Abou Hassira, embaixadora da Palestina na França, falou nesta quinta-feira (6) sobre seu "choque" e "decepção" após os anúncios recentes de Donald Trump para Gaza. Mas ela disse que a oposição da comunidade internacional às ideias apresentadas pelo chefe da Casa Branca, que quer assumir o controle da Faixa de Gaza, "são tranquilizadoras". Após a proposta do presidente norte-americano, Israel anunciou que prepara um "plano" para palestinos que querem deixar o enclave.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse nesta quinta-feira (6) que tropas americanas não serão enviadas para colocar em prática sua proposta de assumir o controle da Faixa de Gaza. "Não haverá necessidade de soldados americanos! A estabilidade reinará na região!", escreveu em sua plataforma Truth Social.     

Trump disse ainda que "a Faixa de Gaza será entregue aos Estados Unidos por Israel após o fim dos combates". Segundo ele, os palestinos "seriam reassentados em comunidades muito mais seguras e belas, com casas novas e modernas na área". O presidente americano sugeriu que os palestinos deslocados fossem enviados para a Jordânia e o Egito, que rejeitaram a proposta.

"Trump feriu e insultou nosso povo", disse Hala Abou Hassira em entrevista à RFI. "Sua declaração é ilegal, desumana e até mesmo criminosa", declarou a embaixadora da Palestina na França. "Ele vem dizendo, desde a eleição, que pretende colocar um fim nas guerras e na violência no mundo todo. Mas o que estamos vendo é que ele mesmo está submetendo o povo palestino à violência mais extrema que pode existir", ressaltou.

"O que Trump disse sobre Gaza tem um fundo de verdade. Gaza virou um inferno e viver lá é impossível. Mas não disse que foi Israel que destruiu Gaza, tornou o enclave inabitável e infligiu uma punição coletiva contra o povo palestino."

O presidente americano anunciou na terça-feira (4), na presença do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, que planejava, a longo prazo, "tomar o controle" da Faixa de Gaza. "Vamos fazer um bom trabalho. Vamos tomar posse", acrescentou em uma coletiva de imprensa. Mas deu poucos detalhes sobre como os Estados Unidos poderiam desalojar mais de dois milhões de palestinos e controlar o território destruído pela guerra, iniciada em 7 de outubro de 2023.

"Deslocar um povo à força de seu território, que está ocupado, é proibido pelo Direito Internacional", afirma Hala Abou Hassira. "É um crime de guerra. O presidente Trump coloca em risco o sistema internacional e o Direito Internacional", frisa. 

"Os EUA devem ter um papel construtivo e positivo na perspectiva de uma solução pacífica para a questão palestina. Mas isso deve ser feito de acordo com as regras do Direito. O povo palestino não pode ser utilizado como um pião a serviço de seus interesses políticos".

O governo americano pareceu recuar na proposta nesta quarta-feira (5), após enfrentar uma onda de críticas de palestinos, governos árabes e líderes mundiais, ao sugerir um deslocamento temporário.

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A proposta também seria "inaceitável", declarou a embaixadora. Para ela, a solução dos dois Estados "é a única possível", como defendem muitos países, inclusive a França. "Hoje a comunidade internacional, que criticou as declarações, tem a responsabilidade de agir e usar os mecanismos jurídicos e pacíficos do Direito Internacional e sancionar Israel, além de reconhecer o Estado Palestino", declarou. 

"É preciso assegurar a proteção do povo palestino, que é vítima de crimes de guerra e de genocídio. Estamos falando de Gaza, mas não podemos nos esquecer do que está acontecendo na Cisjordânia. A expulsão forçada dos palestinos dos territórios ocupados é o objetivo de Israel. A Knesset (Parlamento israelense) votou contra a criação de um território palestino", lembrou. Segundo ela, essa é a única solução para obter a estabilidade e a paz na região.

Limpeza étnica 

Qualquer transferência forçada ou deportação dos territórios ocupados é eestritamente proibida", disse o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, nesta quarta-feira (5). "O direito à autodeterminação é um princípio fundamental do direito internacional e deve ser protegido por todos os Estados, como recentemente sublinhado pela Corte Internacional de Justiça", disse.

O representante da ONU faz referência ao artigo 49.º da Convenção de Genebra relativa à Proteção das Pessoas Civis em Tempo de Guerra, que estipula que "as transferências forçadas, em massa ou individualmente, bem como as deportações de pessoas protegidas do território ocupado para o território da potência ocupante ou para o de qualquer outro Estado, ocupado ou não, são proibidos, seja qual for o motivo".

O texto acrescenta que "a potência ocupante pode proceder à evacuação total ou parcial de uma determinada região ocupada se a segurança da população ou razões militares imperativas assim o exigirem". Mas isso depende de certos critérios. "As evacuações só podem levar ao deslocamento de pessoas protegidas dentro do território ocupado, exceto em casos de impossibilidade material" e a população evacuada "será trazida de volta às suas casas assim que as hostilidades neste setor terminarem", disse Türk, citando a Convenção de Genebra.

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A proposta do presidente dos EUA é "ilegal" e "completamente absurda", segundo a relatora especial da ONU encarregada dos territórios palestinos, Francesca Albanese. O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou contra uma "limpeza étnica". A declaração é um gesto político forte, pois a limpeza étnica não é reconhecida como um crime por si só no direito internacional, ao contrário do genocídio.

"Saída voluntária"

Israel disse nesta quinta-feira que estava se preparando para uma "saída voluntária" dos moradores da Faixa de Gaza, após a proposta do presidente Donald Trump, segundo o ministro da Defesa israelense, Israel Katz".   

O representante de Israel disse em um comunicado que "ordenou que o Exército israelense prepare um plano que permitirá que qualquer cidadão de Gaza voluntário parta para qualquer lugar do mundo que concorde em recebê-lo". O dispositivo, disse ele, incluirá "opções de saída em pontos de passagem terrestre, bem como arranjos especiais para saídas marítimas e aéreas".

(RFI e AFP)

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