Supremo Tribunal britânico determina que o termo "mulher" se refere apenas ao "sexo biológico"
A mais alta instância jurídica do Reino Unido estabeleceu nesta quarta-feira (16) que a definição legal do que é ser mulher deve ser baseada no sexo biológico, e não no gênero. Os juízes analisaram um recurso apresentado pela associação "For Women Scotland", que argumentou que colocar em pé de igualdade as mulheres transgêneros e as nascidas com o sexo feminino feria a legislação britânica sobre igualdade.
A disputa judicial entre o governo escocês, que se comprometeu ativamente com os direitos das pessoas trans nos últimos anos, e a associação "For Women Scotland" era travada desde 2018. Ao analisar os argumentos das feministas escocesas, os juízes foram categóricos. "A decisão unânime deste Tribunal é que os termos 'mulher' e 'sexo', na Lei da Igualdade de 2010, se referem a uma mulher biológica e a um sexo biológico", diz a sentença.
Após uma vitória inicial nos tribunais escoceses, a associação havia sofrido dois reveses em 2023.
Em sua sentença, a Suprema Corte afirma que as pessoas transgênero continuam protegidas por lei. "Não apenas contra a discriminação com base na característica protegida da mudança de gênero, mas também contra a discriminação direta, a discriminação indireta e o assédio relacionados ao gênero adquirido", considerou o tribunal.
Dezenas de ativistas da "For Women Scotland" receberam a decisão com aplausos. "Estou tremendo (...). É um ótimo dia", reagiu uma delas.
"Achávamos que os direitos das mulheres seriam revogados e hoje os juízes disseram o que sempre acreditamos: as mulheres estão protegidas por seu sexo biológico", comemorou Susan Smith, codiretora do grupo "For Women Scotland". "As mulheres agora podem se sentir seguras sabendo que os serviços e espaços designados para mulheres estão reservados para mulheres", acrescentou.
Por outro lado, os grupos de defesa LGBTQIAPN+ temem que as mulheres transgênero sejam impedidas de acessar alguns lugares, como os centros de acolhimento para mulheres.
Debate polarizado
A questão é extremamente polarizadora e gera disputas violentas entre defensores dos direitos das pessoas trans e ativistas que acreditam que os direitos das mulheres são ameaçados por algumas de suas reivindicações. O julgamento se concentrou na interpretação da Lei da Igualdade britânica (Equality Act), de 2010.
Para o governo escocês, o texto era claro: se uma mulher trans obteve um Certificado de Reconhecimento de Gênero (GRC) após sua transição, ela é considerada uma mulher e tem direito às mesmas "proteções daquelas que foram declaradas mulheres ao nascer".
No entanto, a associação "For Women Scotland" argumentou que a regra é baseada no sexo biológico. A organização recebeu apoio, entre outros, da autora de "Harry Potter", a escritora J.K. Rowling, que mora na Escócia e fez inúmeras declarações sobre o assunto, o que lhe rendeu várias acusações de transfobia. Ao tomar conhecimento da decisão da mais alta instância jurídica do país, J.K. Rowling disse que os direitos das mulheres estão finalmente "protegidos".
Segundo dados oficiais de novembro passado, quase 8.500 pessoas receberam um certificado GRC no Reino Unido desde que o sistema foi criado em 2004.
O assunto sempre foi particularmente sensível na Escócia. Em 2022, o governo local aprovou uma lei para facilitar a mudança de gênero sem um parecer médico a partir dos 16 anos, mas a lei foi bloqueada pelo governo conservador em Londres.
Em janeiro de 2023, as autoridades escocesas também tiveram que anunciar a suspensão das transferências de detentas transgênero com histórico de violência contra mulheres para prisões femininas, após dois casos que geraram comoção na opinião pública.
Governo trabalhista aprova 'clareza' da decisão judicial
A Suprema Corte fornece "clareza (...) para mulheres e prestadores de serviços para hospitais, refugiados e clubes esportivos", disse um porta-voz do governo trabalhista. "Espaços exclusivos para homens e mulheres são protegidos por lei e sempre serão por este governo", acrescentou.
Os conservadores britânicos, que perderam as eleições legislativas de 2024, haviam prometido, em caso de vitória, apresentar "esclarecimentos" na lei para que a palavra "sexo" fosse limitada ao sexo biológico.
A líder da oposição conservadora Kemi Badenoch considerou a sentença "uma vitória". "Dizer que 'mulheres trans são mulheres' nunca foi verdade na prática e não é mais verdade na lei", declarou ela.
Entretanto, a Stonewall, uma das principais organizações de direitos LGBT+ da Europa, expressou sua "profunda preocupação com as amplas implicações da decisão do tribunal", considerando-a "incrivelmente preocupante para a comunidade transgênero".
Impacto nos Estados Unidos?
A decisão da Suprema Corte britânica poderá ter repercussão nos Estados Unidos. Desde que retornou à Casa Branca em janeiro, o presidente Donald Trump tem atacado as pessoas transgênero, ao tentar expulsá-las do exército e restringir os procedimentos de transição para os menores de 19 anos.
Com informações da AFP
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