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Argentina se despede de Francisco com missa a céu aberto e peregrinação na maior favela de Buenos Aires

25/04/2025 15h28

A Arquidiocese de Buenos Aires e organizações sociais de bairros carentes preparam para este sábado (26) uma missa de despedida para o papa Francisco, incluindo uma extensa caravana popular até a maior favela de Buenos Aires, passando pelos lugares emblemáticos da obra de Jorge Bergoglio, antes de tornar-se sumo pontífice. As homenagens têm início com uma vigília na Praça de Maio na noite desta sexta-feira (25).

Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

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Na Praça de Maio, em frente à Catedral Metropolitana de Buenos Aires, operários trabalham na construção de um altar para a missa protocolar a céu aberto, enquanto organizações sociais das favelas da capital preparam uma estrutura logística para passar a noite em vigília, transformando a praça num refeitório popular improvisado, com velas, tochas e uma fogueira, além de faixas e bandeiras com frases emblemáticas do sumo pontífice.

"Tantas vezes o papa pediu 'rezem por mim'; agora, será a nossa última reza por ele. O papa está colhendo agora todo o amor que ele nos deu ao longo desses anos, durante os quais foi pai de todos, foi pastor de todos. Então, como filhos, vamos realizar a missa central e a despedida final", disse à RFI monsenhor Jorge García Cuerva, arcebispo de Buenos Aires, quem conduzirá a missa. "Depois, com uma gigante imagem do Papa, vamos fazer uma caravana que simbolizará o abraço que não lhe pudemos dar e também o abraço que nós precisamos dar como argentinos porque ficamos órfãos ao morrer o pai de todos nós", completou.

Numa carta às demais arquidioceses, García Cuerva expressou: "Quero convidá-los especialmente a participarem da missa exequial pelo eterno descanso do nosso querido papa Francisco no próximo sábado, 26 de abril, às 10 horas, na Catedral de Buenos Aires. Será a missa oficial com a qual nos despediremos todos juntos do Santo Padre. Depois da celebração eucarística, realizaremos uma caravana para expressar, simbolicamente, no coração da cidade, o nosso agradecimento pela sua vida, pelo seu testemunho e pelo seu magistério", convidou o atual arcebispo de Buenos Aires, indicado por Francisco para ocupar o posto que lhe pertenceu antes de tornar-se papa.

A despedida espiritual de Francisco na sua terra natal começa exatamente depois do funeral no Vaticano e terá duas partes: uma protocolar; outra, popular.

A Catedral de Buenos Aires, em frente à histórica Praça de Maio, foi a última moradia do cardeal Jorge Bergoglio na Argentina. A mencionada caravana é o toque popular em linha com o lema de Francisco, que defendia "uma Igreja pobre para os pobres".

À Catedral Metropolitana rumarão diversas caravanas dos pontos mais populares da cidade, como a favela 31, a favela 11-14 e a favela 21-24, a maior da cidade. Após a missa protocolar, serão armadas longas mesas numa espécie de santa ceia popular para alimentar milhares de fiéis em comunhão. Depois do almoço, a caravana começa a percorrer "O Caminho de Francisco", um roteiro que vai passar por diversos pontos por onde Jorge Bergoglio andou e fez história.

Peregrinação

A primeira parada é a Casa de Mamá Antula como ficou popularmente conhecida a religiosa María Antonia de San José (1730-1799), canonizada pelo papa Francisco em 11 de fevereiro de 2024, tornando-se a primeira santa nascida na Argentina. A segunda parada é a Praça Constitución, onde o cardeal Jorge Bergoglio celebrava missas a favor dos excluídos e dos marginados. As seguintes paradas são os hospitais Borda (psiquiátrico), Tobar (infanto-juvenil) e Rawson (doenças sexuais), todos pontos de atenção por parte de Francisco, quando era arcebispo da cidade.

A caravana vai passar também pela Penitenciária Muñíz e pelo abrigo popular Hogar de Cristo (Lar de Cristo) antes de terminar na paróquia Virgem de Caacupé, na favela 21-24, a maior da cidade de Buenos Aires.

Papa das Favelas

Nessa última parada, prevista para as 17 horas, haverá um encontro das comunidades de todas as favelas de Buenos Aires, agrupadas num movimento de sacerdotes conhecido como "Padres das Favelas" ('Curas Villeros').

"Uma das primeiras expressões de Francisco, quando foi eleito papa, foi dizer que gostaria de ver uma Igreja pobre para os pobres. Quem viu isso de longe pode acreditar que ele inventou essa igreja. Não foi assim. O papa vem dessa igreja pobre para os pobres que já existia na Argentina, na pastoral das favelas, nas comunidades de base do Brasil e em outros lugares da América Latina. Ele formou-se nessa igreja e soube como a representar de forma maravilhosa, fazendo transcender essa visão que hoje ganhou dimensão mundial. Esse é o seu maior legado", explica à RFI o padre Lorenzo de Vedia, 58 anos, popularmente conhecido como o padre Toto, amigo do papa e representante do chamado "Padres das Favelas", o segmento religioso que ocupava um lugar de destaque no coração de Francisco.

"Padres das Favelas" ('Curas Villeros') é um movimento de sacerdotes da Igreja Católica Argentina, surgido em 1967, com padres que decidiram viver em bairros precários e humildes como um compromisso de vida pelos pobres, exercendo uma ação pastoral em sintonia com a situação dos fiéis.Em 1997, nomeado arcebispo de Buenos Aires, o cardeal Mario Jorge Bergoglio aproximou-se desse segmento religioso, fortalecendo-o. Bergoglio tornou-se o seu maior aliado e esse segmento reconheceu sempre essa liderança espiritual.

"Quando somos padres jovens, temos crises, problemas, situações. Nessas horas, eu conversava com ele. Bergoglio foi um guia espiritual, orientando o caminho, esclarecendo o pensamento e organizando a fé. Com paternidade, humanidade e fé, ele me ajudou, assim como a vários padres. Aprendi muito com ele. A Igreja que Francisco conduz é a Igreja com a que sonhei desde menino. É a igreja dos pobres", aponta o padre Toto.

Nascia ali o que o mundo inteiro conheceria como "uma Igreja pobre para os pobres", como citaria Bergoglio ao tornar-se papa Francisco em março de 2013 e onde vai, simbolicamente, terminar o seu papado na Argentina neste sábado.


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