Haiti admite contratar mercenários estrangeiros para lutar contra gangues que atuam no país

As autoridades do Haiti admitiram usar os serviços de mercenários estrangeiros para lutar contra a ação das gangues que aterrorizam o país. A confirmação preocupa as organizações de defesa dos direitos humanos, que temem o impacto da presença desses justiceiros no território haitiano.

Peterson Luxama, correspondente em Porto Príncipe, e Aurore Lartigue, da RFI em Paris

O Conselho Presidencial de Transição (CPT), que dirige atualmente o Haiti, finalmente rompeu seu silêncio sobre uma assunto tabu: a presença de mercenários estrangeiros envolvidos na guerra contra as gangues no país. O coordenador do CPT, Fritz Alphonse Jean, confirmou o fato em uma entrevista com um grupo de jornalistas haitianos no fim de semana.

O presidente da CPT não forneceu nenhum detalhe sobre os valores envolvidos ou os termos do contrato com a empresa de segurança contratada. No entanto, a informação confirma as suspeitas sobre a presença de mercenários atuando neste país caribenho dominado por gangues fortemente armadas que controlam grande parte do território, inclusive a capital Porto Príncipe.

No final de maio, uma investigação do jornal The New York Times afirmou que o americano Erik Prince, fundador da empresa militar Blackwater, tem fornecido drones de ataque para lançar explosivos em bairros controlados por gangues no Haiti desde março. Segundo o diário, o contrato assinado com as autoridades haitianas também envolveria o envio de 150 mercenários este ano, em uma tentativa de retomar territórios estratégicos. Até o momento, cerca de 200 pessoas teriam sido abatidas durante as ações da empresa no Haiti, mas nenhum líder de gangue estaria entre as vítimas fatais.

Risco para os direitos humanos no Haiti

A ausência de controle direto do Estado na segurança do Haiti gera temores de violações dos direitos humanos. Várias estruturas da sociedade civil, em especial organizações como a Ordem dos Defensores dos Direitos Humanos (ORDEDH), alertam para os riscos dessa intervenção de grupos externos na segurança local.

"A chegada de mercenários ao Haiti é uma faca de dois gumes e um risco inaceitável", aponta o coordenador geral da ORDEDH, Darbensky Gilber. "Essa perspectiva, embora apresentada por alguns como um meio rápido de restaurar a ordem, é vista pelo ORDEDH com grande preocupação", afirma.

A organização Fondasyon Je Klere, sediada em Porto Príncipe, também expressa seu medo de abusos cometidos por mercenários. A entidade exige transparência, principalmente com relação às obrigações desses agentes estrangeiros e aos riscos de danos colaterais à população.

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Mercenários atuaram no Iraque, nos Emirados e no continente africano

A Blackwater chegou a atuar para o governo americano durante anos. Entre 2001 e 2009, a empresa recebeu mais de US$ 1,6 bilhão em contratos federais, sem incluir um número desconhecido de missões confidenciais para a CIA. No entanto, sua ação foi frequentemente marcada por acusações de uso excessivo de força. Em 2007, seus funcionários abriram fogo em um cruzamento de Bagdá, no Iraque, matando 14 civis.

Em 2011, a imprensa americana revelou que Erik Prince, frequentemente descrito como um "aproveitador de guerras" havia assinado um contrato de US$ 529 milhões para montar um exército secreto de 800 mercenários para os Emirados Árabes. O grupo também é acusado de estar reconstruindo uma rede de empresas de fachada que operam junto a organizações contestadas pelo direito internacional. Esse é o caso da Frontier Services Group (FSG), uma empresa sino-africana que protege infraestruturas estratégicas e mineração na África e fornece apoio militar sob o pretexto de segurança.

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