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Em meio a "cenário de guerra", grevistas na Bahia exigem anistia e volta de líder aos quadros da PM

Janaina Garcia

Do UOL, em Salvador

07/02/2012 18h40Atualizada em 07/02/2012 20h07

Uma semana após a deflagração da greve por parte dos policiais militares na Bahia, o cenário no Centro Administrativo de Salvador –onde está localizada a Assembleia Legislativa e outros órgãos estaduais, em área nobre da capital– lembra uma paisagem de guerra. Dividem espaço tendas, barracas de acampamento precárias, oficiais fortemente armados (alguns deles encapuzados ou com cães) e jornalistas brasileiros e estrangeiros, alguns com coletes à prova de bala.

A concentração de familiares, imprensa e homens da Força Nacional, Exército e Polícia Federal acontece principalmente em frente à Assembleia, onde os grevistas estão acampados desde a semana passada. Em um terreno descampado, sob forte sol, a expectativa é pelo resultado das negociações que contemplem não mais apenas a reposição salarial e o aumento da gratificação: os grevistas não abrem mão de que o líder, o ex-soldado Marco Prisco, seja anistiado.

Atualizado por telefone com frequência sobre os desdobramentos da paralisação, Prisco, que está dentro da Assembleia, disse ao UOL pelo celular que há “munição para pelo menos 30 dias” –em referência ao estoque de comida e água entregues hoje pelo Exército e familiares.

Prisco é líder da Associação de Policiais e Bombeiros da Bahia (Aspra) –que lidera o movimento grevista, mas que tem filiados apenas 7% do efetivo da corporação. O líder, que surgiu politicamente na greve dos bombeiros de 2001 e que hoje está filiado ao PSDB, já deu declarações contraditórias à imprensa quando, por exemplo, afirmou na segunda-feira (6) que havia 2.000 policiais dentro da Assembleia –o contingente confirmado é de 300.

Uma das novas condições dos grevistas para dar fim à paralisação é que Prisco, ex-soldado da PM, também seja reintegrado à corporação. Ele foi expulso após envolvimento em uma greve ilegal em 2001, mas uma decisão de 2010 anistiou os manifestantes, e, em 26 de janeiro de 2011, o Tribunal de Justiça da Bahia determinou sua reintegração --o que o governo estadual ainda não cumpriu.

Boatos

Do lado de fora, os boatos de que mais categorias vão aderir à paralisação e chegar a Assembleia em caravanas vão e vêm –até as 18h, contudo, nenhum dos boatos se concretizou.

A estudante Gisa Oliveira, 19, tem pai e namorado na Assembleia. O pai, diz ela, recebe por mês cerca de R$ 1.700 após 20 anos de corporação. É a segunda greve da qual ele participa. “Vejo a vida miserável que meu pai leva, em que nem mesmo um carro ele consegue comprar, porque não consegue pagar juros de empréstimo. E nossa família ainda vive em área de risco.”

Gisa chegou hoje ao prédio. Já a funcionária pública Fernanda Pereira, também em uma barraca, disse que está desde a semana passada em um terreno descampado em apoio a seu marido, irmão, cunhado e primo, que são grevistas e estão acampados na Assembleia. “Não tem como esse salário vergonhoso não impactar na renda familiar. Nossa esperança é que não só praças, como também os demais PMs, venham para cá porque a negociação do governo é mesmo só pelo cansaço.”

Alheio aos valores de reposição salarial, o vendedor de picolés, Ronaldo, 28, afirmou que a greve é prejudicial não só aos “negócios do Carnaval”, mas aos dele também. “Antes eu vendia 350 picolés por dia sem sair do lugar, agora vendi só 280 e nesse trabalhão, debaixo de sol, andando de um lado para o outro”, comparou, pedindo licença para usar o ‘cercadinho’ reservado aos jornalistas para fugir do sol.


Entenda a greve

A greve na Bahia foi deflagrada na última terça-feira (31) por parte da categoria, liderada pela Associação de Policiais e Bombeiros da Bahia (Aspra). Doze mandados de prisão foram expedidos contra policiais militares que lideram o movimento --considerado ilegal pela Justiça. As prisões foram decretadas pela juíza Janete Fadul. Todos são acusados de formação de quadrilha e roubo de patrimônio público (carros da corporação). Além dos crimes, os policiais vão passar por um processo administrativo. Dois já foram presos.

Cerca de 300 policiais militares estão amotinados dentro da Assembleia Legislativa em Salvador, cercados pelas forças federais, que negociam o fim da greve. Na segunda-feira, soldados lançaram bombas de efeito moral e dispararam balas de borracha contra policias grevistas que estavam do lado de fora e que tentavam entrar no local.

De acordo com o líder Marco Prisco, os grevistas não vão deixar a Assembleia até que sejam revogados os pedidos de prisão de 12 grevistas, além da concessão da anistia irrestrita para os grevistas e o pagamento de gratificações. O governo estadual afirma que o orçamento deste ano não prevê pagamentos adicionais aos policiais, mas propõe que as gratificações reivindicadas pelo movimento, que juntas vão representar 30% de reajuste, sejam diluídas até 2015. Os grevistas querem que as gratificações sejam pagas este ano e em 2013.

A paralisação gerou um aumento da violência no Estado: aulas foram canceladas, assim como shows, a Justiça teve seu trabalho suspenso e os Estados Unidos chegaram a recomendar aos norte-americanos que adiem viagens "não essenciais" ao Estado. O número de homicídios e assaltos também aumentou --até o fim de semana, as mortes já eram superiores ao dobro do registrado no mesmo período na semana anterior à greve.