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Um ano após acidente com bonde, moradores de Santa Teresa ainda pedem denúncia contra secretário do Rio

Acidente com bonde em Santa Teresa, no Rio, deixou seis pessoas mortas e outras 48 feridas - Giuseppe Bizzarri/Folhapress
Acidente com bonde em Santa Teresa, no Rio, deixou seis pessoas mortas e outras 48 feridas Imagem: Giuseppe Bizzarri/Folhapress

Júlio Reis

Do UOL, no Rio

27/08/2012 06h01

Passado um ano do acidente com o bonde de Santa Teresa, que matou seis pessoas e deixou outras 48 feridas, moradores do bairro ainda esperam que o Ministério Público denuncie o secretário de Transportes do Estado do Rio, Julio Lopes. Segundo a Associação de Moradores e Amigos de Santa Teresa (Amast), o secretário deve ser responsabilizado pelo acidente uma vez que sabia das condições precárias do sistema.

Eles pretendem entregar na tarde desta segunda feira (27) um dossiê ao Ministério Público do Estado e ao Ministério Público Federal com documentos –entre relatórios de instituições como a Câmara Municipal e o Tribunal de Contas do Estado–e declarações reportadas pela imprensa, que evidenciam o conhecimento do secretário sobre a situação do transporte.

O dossiê traz um artigo publicado por Julio Lopes no jornal “O Globo”, em setembro de 2009. No artigo intitulado "Entestados com o progresso", Lopes diz que "ficou claro para os engenheiros de então, que dão suporte técnico ao serviço de bondes, da precariedade do velho bonde e da necessidade de modernizá-lo, em particular, dos sistemas de freio e de tração”.

O secretário comentava um acidente que havia ocorrido em 2002 e defendia a adoção pelo governo do novo modelo de bonde (conhecido como VLT), que começou a ser adotado em 2007 e passou a operar conjuntamente com os bondes antigos –entre eles o bonde n° 10, que sofreu o acidente de agosto do ano passado.

Diretor da Amast e um dos organizadores do dossiê, Alvaro Braga diz que o Ministério Público do Estado tem sido conivente com a participação do secretário na tragédia. “Não se sabe como anda o procedimento que o MP-RJ abriu para investigar as responsabilidades do secretário de Transportes, que candidamente alegou na época do acidente que não conhecia os riscos com que o bonde estava operando” disse.

Braga disse ainda que os moradores foram recebidos apenas uma vez, em setembro de 2011, pelo procurador-geral do Estado, Cláudio Lopes. “Depois do indiciamento do MP de alguns funcionários dos bondes, fomos lá cobrar do procurador-geral a responsabilidades de Júlio Lopes, mas acabamos recebidos pelo subprocurador de direitos humanos, que também não nos deu maiores esclarecimentos.”

Procurado pela reportagem do UOL, a assessoria de imprensa do Ministério Público do Rio respondeu que o procedimento foi enviado para a Procuradoria Geral da República em 31 de maio deste ano porque Júlio Lopes é deputado federal e, apesar de estar licenciado da função, possui foro privilegiado.

O MP disse ainda que o processo só foi enviado nesta data porque optou por aguardar o término da investigação no âmbito policial e por reunir todos os laudos de perícias técnicas e demais elementos probatórios.

Já a Procuradoria Geral da República disse que recebeu o processo em junho e que ele está sob análise na assessoria jurídica, sem prazo para ser avaliado.

A Secretaria de Transportes do Rio foi procurada para que o Julio Lopes se manifestasse, mas nenhuma resposta foi enviada até o fechamento desta reportagem.

Denúncia do MP

Em maio deste ano, o MP denunciou por homicídio e lesão corporal culposa o motorneiro Gilmar Silvério de Castro, o engenheiro mecânico José Valladão Duarte e o chefe de manutenção Cláudio Luiz Lopes do Nascimento, além dos assistentes de manutenção Zenivaldo Rosa Corrêa e João Carlos Lopes da Silva, todos funcionários da Central (empresa do Estado que administra o sistema de bondes).

Segundo a denúncia ajuizada pela titular da 5ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal, Janaína Marques Corrêa, o veículo acidentado foi entregue ao motorneiro Nelson Correa da Silva, uma das vítimas fatais do acidente, que o conduziu em diversas viagens durante o período da tarde.

Às 15h do dia 27 de agosto do ano passado, ocorrera uma batida entre o bonde e um ônibus de passageiros na rua Joaquim Murtinho, em direção à Estação Carioca.

O motorneiro prosseguiu com o bonde até a estação para o desembarque dos passageiros, retornando ao local da batida para a confecção do boletim de registro de acidente de trânsito. Enquanto isso, o primeiro denunciado, o maquinista Gilmar de Castro, assumiu o veículo dirigindo-se, em tese, para a garagem dos bondes.

Porém, Gilmar passou a permitir o embarque de passageiros e a realizar o trajeto padrão de tráfego. Ele não levou o bonde para a garagem e depois o entregou ao condutor Nelson, próximo ao local da primeira colisão.

Após a troca de condutores, o sistema de freios do bonde falhou no declive da rua Joaquim Murtinho, resultando no descarrilamento até a colisão com um poste e o tombamento do veículo.

Peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) apontaram diversos problemas de manutenção no bonde, que não apresentava condições de segurança para os usuários. Segundo a análise pericial, vários foram os fatores que concorreram para o acidente, sendo a causa determinante a falha no sistema de freios.

Dentre os problemas relacionados à falta de manutenção, estavam a falta de procedimento de drenagem dos cilindros, o desgaste do compressor e peças remendadas de forma grosseira.

De acordo com o Ministério Público, anotações registradas no livro de manutenção da oficina de bondes demonstravam que o veículo acidentado apresentava problemas crônicos no sistema de frenagem, sendo a frequência dos reparos insuficiente para solucionar os problemas verificados.

Segundo uma declaração registrada na apuração dos fatos, o bondinho em questão "apresentava problemas nas sapatas que precisavam ser trocadas com muita frequência, pois eram de má qualidade".