"Estou desprotegida, mas mantenho a aliança no dedo", desabafa viúva
Mais saudade, mais indignação, mais lembranças de sonhos interrompidos e, paradoxalmente, mais esperança de que a Justiça brasileira aplaque ao menos parte desses sentimentos. São com essas palavras que a curitibana Rosane Gutjahr, 56, descreveu ao UOL os sete anos de luto pelo marido, Rolf Ferdinando Gutjahr, uma das 154 vítimas do voo 1907, da Gol. Ele morreu aos 51 anos.
Desde a tragédia, Rosane se tornou uma espécie de referência entre as centenas de familiares ao liderar a criação da Associação de Familiares e Amigos do Voo 1907, da qual é uma das diretoras. É também uma das cinco parentes de vítimas que não aceitaram acordo de indenização com a Gol, uma vez que isso a obrigaria a abdicar se seguir como parte nos processos judiciais sobre o caso.
Mãe de uma menina de dez anos, em tratamento contra um câncer de mama e firme na convicção de que os processos trarão resultado, ela deu o depoimento abaixo à reportagem, por telefone, a partir de Brasília, onde estará para a missa em homenagem aos mortos no acidente, marcada para as 10h de domingo (29).
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“A vida da gente para no sentido dos planos que eram feitos. Tenho 56 anos –em 2006, tinha 50 e uma filha então com três anos. Batalhamos tanto por ela! Tínhamos um projeto de nos aposentar em 2007 para curtir essa criança, sabe?
A gente, a associação, está louca para que esse processo encerre logo e esses pilotos cumpram a pena. Que é irrisória: se alguém roubar um pote de margarina no mercado, fica três anos preso.
A ação comprovadamente negligente desses sujeitos causou a morte de 154 pessoas, eles foram condenados a três anos de prisão, não foram presos ainda e continuam com suas permissões de voo ativas nos Estados Unidos.
Não tem como cicatrizar uma ferida dessas.
Acho que a única forma mesmo de a gente amenizar toda essa situação, ou de fechar esse ciclo, é ver os responsáveis por essas mortes pagando por esse crime.
Minha filha sabe que vim a Brasília por isso. Fez um desenho com quatro pessoas: dois homens algemados, um policial e, de outro lado, outro policial dizendo aos presos: ‘vamos?’, apontando para uma cadeia. É a forma dela de expressar tudo isso.
Hoje estou em um tratamento contra um câncer de mama. Não tenho com quem me apoiar, somos eu e minha filha, não tive mais ninguém. Nessas horas você olha para o lado e constata: seu marido não está ali. Me sinto sozinha. Desprotegida. Mas com certeza deve ter outras famílias na mesma situação.
Passaram-se sete anos. A saudade aumenta, a indignação é ainda maior por ver tanto tempo decorrido e nada de efetivo acontecendo com esses réus... mas a gente briga para conseguir reiniciar a vida.
Porque um lado ela paralisa, sim, mas, de outro, tem que arranjar força de algum lugar para ela seguir. Continuo com minha aliança no dedo, eu realmente amava meu marido. Isso me fortalece.”
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