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Ex-PM que conheceu companheiro no Orkut participa de casamento gay coletivo no Rio

Felipe Martins

Do UOL, no Rio

08/12/2013 06h00

Após cinco anos de relação, o ex-policial militar Maury Ribeiro, 62, e o fiscal de supermercado Joelcio Hanbrick, 41, vão enfim realizar o desejo que dividiam desde que passaram a viver juntos: o casamento. Eles são um dos 130 casais homossexuais que irão oficializar o matrimônio em uma cerimônia no Rio de Janeiro neste domingo (8).

Ansiosos para o momento do “sim”, eles definem o evento não apenas como uma celebração dos casais como também para todos os LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais).  “É uma vitória para a gente. Apesar de ainda haver muito preconceito, estamos ganhando mais espaço, as conquistas estão acontecendo. Acho que esse  momento é de reflexão para que a sociedade seja mais aberta e passe a nos aceitar e nos respeitar”, disse Maury.  

Vejas os países que já permitiram o casamento gay

O casal se conheceu há cinco anos pelo Orkut, rede de relacionamentos popular até o final da última década.  “Eu estava me sentindo muito sozinho. Criei minha página e, quando vi as fotos dele, meu coração disparou. Desde o momento que vi aquelas fotos senti alguma coisa diferente”, contou Joelcio.

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Era a primeira vez que ele se relacionava com um homem. As relações com as mulheres foram curtas e sem ligação afetiva. “Até conhecer ele, eu não tinha coragem de me relacionar com um homem. O Maury me trouxe a certeza do que eu realmente queria. Amor mesmo, só com ele”, disse.

Mais experiente, Maury teve a primeira relação homossexual por volta dos 20 anos de idade, quando trabalhava como policial militar. Durante uma noite de trabalho externo, foi abordado por um jovem que passava pela rua. “Eu trabalhava como guarda de trânsito na PM. Numa noite, um rapaz passou por mim e me chamou para tomar um drink no apartamento dele. Foi a primeira vez que beijei a boca de um homem”, lembrou.

Maury teve três relacionamentos longos: o primeiro durou 14 anos, o segundo 15 e o anterior a Joelcio, quatro anos. Após sete anos na PM, Mauri pediu baixa da corporação depois de passar para um concurso público do Metrô, na época uma empresa do Estado, onde se aposentou.

Durante o período como policial, Maury recorda que era muito assediado pelos colegas de corporação. “Eu era um rapaz bonito. Recebia cantada de tenente, de oficial, de sargento, mas nunca rolou nada. Fazia a linha bofe. Eu sigo aquele ditado: onde se ganha o pão não se come a carne”, afirmou.

Depois de um ano morando juntos, eles assinaram o contrato de união estável. Os últimos três anos de convivência diária são descritos por Joelcio como a descoberta de si mesmo e do amor. “É uma felicidade tamanha. Cada dia estamos mais apaixonados um pelo outro. É uma relação de respeito mútuo, troca de carinhos, olhares”.

O casal revela ansiedade para o momento do matrimônio. “Estou muito ansioso para o grande dia. A minha vontade de casar só apareceu após conhecer o Maury”, declarou Joelcio. “Quando você tem certeza do que quer e tem o pé no chão, não tem muito o que pensar, é se jogar e ser feliz. Além do mais, é a certeza de que vou deixar tudo para a pessoa que me faz feliz”, afirmou Maury.

“Maior casamento coletivo gay do mundo”

O Programa Estadual Rio Sem Homofobia --órgão do Governo do Estado vinculado à Secretaria de Assistência Social, um dos organizadores do evento -- anuncia a cerimônia como "o maior casamento coletivo entre pessoas do mesmo sexo do mundo”.  Para o coordenador do programa e idealizador do ato, Cláudio Nascimento, a união pública dos casais homoafetivos representa ação afirmativa para o reconhecimento da igualdade de direitos.

“Já realizamos três cerimônias coletivas de união estável, onde participaram mais de 200 casais. Agora damos mais um passo para efetivação dos direitos e é por isso que o poder público estadual realiza esta cerimônia coletiva de casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, que será a maior do mundo. É uma ação afirmativa para chamar a atenção de todos para as conquistas e os desafios na área dos direitos civis e humanos da comunidade LGBT”, disse Nascimento.

Participam ainda da organização do evento o Tribunal de Justiça do Rio, a Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro, através do Núcleo de Defesa da Diversidade Sexual e Direitos Homoafetivos e a Arpen (Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado do Rio de Janeiro). O evento também celebrará o Dia da Justiça, comemorado neste domingo.

Após a cerimônia, uma festa será oferecida aos recém-casados no Centro de Convenções da Bolsa de Valores, também no centro. Os casais e convidados terão direito a bolo, bem-casados, coquetel, música ao vivo e discoteca.

Foi cobrado dos casais valor das despesas processuais, que variam entre R$ 250 e R$ 500. Aos casais  que alegaram não ter condições de arcar com as despesas, foi disponibilizado o recurso de pedido de isenção à Defensoria Pública.

Histórico

Na última quinta-feira (5), cinco casais homoafetivos casaram oficialmente em cerimônia na cidade de Uberlândia (MG).  Foi o primeiro casamento coletivo no Estado, segundo a Associação Homossexual de Ajuda Mútua, grupo que atua na causa dos direitos dos LGBTs em Minas. Em São Paulo, 13 casais casaram em cerimônia realizada no CTN (Centro de Tradições Nordestinas) no último dia 29. O casamento coletivo foi uma iniciativa entre o Centro de Integração da Cidadania Norte, programa do Governo do Estado, e o CTN.

Em julho deste ano, 11 casais formados por mulheres disseram sim em uma cerimônia coletiva em Campo Grande. Segundo a Defensoria Pública , organizadora do evento, nenhum casal formado por homens procurou o órgão para participar do casamento.

Para celebrar a legalização do casamento gay na Nova Zelândia, cerca de 30 casais se casaram no primeiro dia que a lei entrou em vigor, 19 de agosto deste ano. Linley Bendall e Ally Wanikau se casaram em pleno voo entre as cidades de Queenstown e Auckland.  A cerimônia foi patrocinada por uma empresa aérea local e contou com a presença de amigos e familiares.

Em 14 de maio deste ano, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou uma resolução que obriga os cartórios de todo o país a celebrar o casamento civil e converter a união estável homoafetiva em casamento. A proposta do presidente do conselho, Joaquim Barbosa, foi aprovada com apenas um voto contrário (14 a um).

Após a aprovação da união estável entre casais do mesmo sexo pelo STF,  em maio de 2011, juízes em diferentes Estados negavam a conversão das uniões em casamentos, alegando inconstitucionalidade. A medida do CNJ efetivou não apenas a conversão como também o casamento de forma direta.