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Brancos têm mais acesso a penas alternativas; negros vão mais para prisão

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

27/11/2014 09h30

Pesquisa “A aplicação de penas e medidas alternativas no Brasil”, divulgada nesta quinta-feira (27) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Apliada), aponta que o rigor da Justiça Criminal com os negros é maior que com os brancos, que têm mais direito a penas alternativas.

Segundo o levantamento, a diferença pode ser vista na definição do trâmite dos processos. Enquanto 41,9% dos acusados em varas criminais eram brancos, 57,6% eram negros. Já nos juizados especiais --que analisam casos de menor potencial ofensivo--, a ordem é inversa, com 52,6% dos réus eram brancos e 46,2%, negros.

A escolha da vara onde o processo irá tramitar depende da pena pedida e é uma decisão do promotor de Justiça, acolhida ou não pelo juiz responsável. 

Para os pesquisadores, isso quer dizer que os negros podem ser condenados com mais frequência a penas de restrição de liberdade. “Existe um maior número de réus negros nas varas criminais, onde a prisão é a regra, e maior quantidade de acusados brancos nos juizados, nos quais prevalece a aplicação de alternativas penais”, informou o estudo.

Para o Ipea, os dados chamam a atenção para “os processos de construção de desigualdades e de reprodução de opressões nas instituições brasileiras, que conferem a cor negra aos nossos cárceres".

Outro ponto citado também mostra que as pessoas pobres acabam sendo, também, mais vítimas das prisões provisórias.

O estudo apontou que, em alguns casos, as prisões cautelares são “terapêuticas”, ou seja, “uma oportunidade de desintoxicação do réu, caso se perceba seu envolvimento com drogas".  

“Manter a prisão também é uma 'estratégia' adotada quando se trata de pessoas em situação de rua, sem endereço fixo”, informou.

Cultura

Segundo o pós-doutor em Justiça Penal Internacional da Universidade de Pavia, na Itália, e professor de direito processual penal da Universidade Federal de Alagoas, Welton Roberto, a pesquisa apenas ratifica um pensamento quase unânime no meio jurídico.

“Isso demostra um claro rigor maior com os negros no direito penal. É como se fosse esteriotipado: o réu pobre é preso. Você vai em presídios brasileiros e vê isso. Essas pessoas não tem cidadania plena, não tem bons advogados. Defendo as cotas, porque não adianta ficar com discurso que todos iguais. Nós, da raça branca, não ficamos vivendo décadas de humilhação, como os negros."

Para o jurista, parte do problema está na formação dos profissionais do Direito.

“Existe ainda na formação do magistrado, do defensor, do promotor brasileiro agregado a um elitismo muito forte. Muitos deles não têm a mínima noção de como funciona a realidade das ruas. Eles passam por uma faculdade boa, o pai banca ele estudar num cursinho para ser juiz e ali é o primeiro emprego dele”, disse.