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Presídio com indústrias e escola nunca teve rebelião e vira modelo em AL

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

21/12/2014 06h00

No Estado mais violento do país, Alagoas registra bons resultados e está virando modelo para o país com uma iniciativa de ressocialização que une o trabalho e o estudo para detentos.

Inaugurado há três anos e meio, o Núcleo Ressocializador da Capital nunca registrou motim e praticamente zerou a reincidência dos egressos da prisão.
A unidade foi construída no prédio que abrigou o presídio Rubens Quintella, que foi fechado em maio de 2007 após constantes rebeliões e fugas.

Com 150 vagas, o presídio mantém hoje 134 presos: todos trabalham e estudam. Desses, 40 atuam em oficinas ou na manutenção do presídio e 94 são empregados nas empresas instaladas dentro do complexo industrial inserido no sistema prisional e inaugurado em  2010. 

Presídio sem problemas

Desde que foi inaugurado, em agosto de 2011, o Núcleo Ressocializador não teve uma rebelião ou sequer uma briga. "Nunca precisamos sacar nem uma arma de baixa letalidade. Aqui é tranquilo", disse um agente penitenciário.

O UOL visitou a unidade na tarde desta sexta-feira (19). No local, nã há sujeira, as paredes são limpas e as celas viraram alojamentos --cada um comporta três presos. Os reeducandos ficam soltos no patio externo da unidade, que tem uma área com direito a campo de futebol. Só à noite eles são trancados nos alojamentos.

A rotina dos presos começa às 6h, quando todos acordam e tomam café. Às 7h iniciam a jornada de trabalho até o fim da tarde. À noite, é a vez de terem aulas na escola dentro do presídio. Só depois de tudo isso é que eles são trancados nos alojamentos.

Seleção rigorosa

Para conseguir uma vaga no núcleo, os presos precisam passar por um processo seletivo rigoroso, que inclui uma análise da equipe multidisciplinar com psicólogo, assistente social e integrantes de gerências do núcleo.

O presídio só abriga presos condenados, com bom comportamento, com convivência familiar e sem mais envolvimento no crime.

Pelo trabalho nas empresas, os reeducandos recebem um salário mínimo. O dinheiro é depositado em uma conta, e o valor é sacado por um familiar próximo. Para as empresas, há a vantagem de ter benefícios fiscais e não pagar as demais obrigações trabalhistas.

“Todos são acompanhados diariamente por um agente e precisam estudar à noite. O índice de reincidência é baixíssimo, de 4%, enquanto a média pelo país chega a 70%”, diz a gerente-geral do Núcleo Ressocializador, Georgia Hilário.

Desempenho 'excelente'

Vizinho ao presídio, cinco empresas estão instaladas no Núcleo Industrial Bernardo Oiticica. Outras 10 estão em fase de instalação e devem começar a operar nos próximos meses. Até 2016, a previsão é que 500 reeducandos sejam aproveitados como mão de obra.

Para trabalhar na empresa, é necessário conseguir a transferência para o Núcleo Ressocializador. O desempenho dos presos nas indústrias é considerado excelente pelo presidente da Associação dos Empresários do Núcleo Industrial, Carlos Pinheiro da Costa Júnior.

“É muito bom a atuação deles, com assiduidade total. Os reeducandos são muito aptos ao trabalho. Cada setor que em que colocamos um, logo percebemos o bom desempenho. Muitos inclusive deixam o sistema fechado e são contratados com carteira assinada”, afirmou.

A empresa de colchões Bonsono, de propriedade de Júnior, foi uma das pioneiras no núcleo e na contrwtação de reeducandos.

A empresa tinha sede em São Miguel dos Campos (65 km de Maceió), e no final de 2012 migrou para o sistema prisional. À época, contratou 12 reeducandos. Hoje, já são 32 trabalhando–mais da metade dos 58 que atuam no local.

“A ideia é dobrar esse número em 2015. Hoje fabricamos 300 colchões por dia, e vamos aumentar”, completou.

Manga da farda diferencia

Para diferenciar os funcionários, os reeducandos têm a manga da camisa da farda vermelha. Mas todos atuam juntos.

Condenado a 19 anos de prisão por formação de quadrilha e tráfico de drogas Éliton Batista, 26, é operador de máquina na fábrica. Com mulher e duas filhas, ele conta que mudou de vida com a mudança do local. “Essa fase é um grande aprendizado, aprendo uma nova profissão. Vou sai daqui ressocializado”, disse.

Já José Cícero dos Santos, 33, marcineiro era microempresário, mas há sete anos entrou no sistema prisional. “O começo foi bem difícil, mas aqui a gente teve qualificação, ensino, e nos fez repensar a vida”, afirmou o reeducando, condenado a 21 anos de cadeia por homicídio.