Cada vez mais vazia, cidadezinha na Suíça vai virar hotel para tentar sobreviver
A menor cidade da Suíça, Corippo, com 12 habitantes, desistiu de tentar atrair novos moradores. Para não desaparecer do mapa, resolveu, então, atrair hóspedes: a cidade vai virar uma espécie de hotel, com capacidade para 26 pessoas.
A decadência do vilarejo se arrasta desde o século 19, quando moradores mais jovens começaram a deixar a região dos Alpes, rumo às cidades grandes. A maior cidade do país, Zurique, está a duas horas de viagem. E a cidade grande mais próxima, Milão, está do outro lado da fronteira, na Itália, a cerca de 1 hora e 30 minutos de carro.
A iniciativa é da Fundação Corippo, uma organização sem fins lucrativos que desde os anos 1970 busca manter e revitalizar a cidadezinha, valorizando sua arquitetura histórica e algumas tradições locais. A singularidade de Corippo é a harmonia das casinhas simples, todas de pedra, construídas na mesma direção, apoiadas na montanha e conectadas por caminhos bem estreitos.
Em sua origem, Corippo era uma vila de camponeses, mas também com pousadas para visitantes apaixonados pela montanha. “No século 19, Corippo tinha cerca de 350 habitantes”, disse ao UOL o vice-presidente da Fundação, Marco Molinari. “Nas últimas décadas do século 20, houve uma diminuição da atividade agrícola primária e um despovoamento. Assim, chegamos a 12 habitantes e havia o risco de que a vila ficasse cada vez mais abandonada.”
Os moradores de Corippo são quase todos idosos. “Quase não vejo nenhum deles na rua”, diz a responsável pelo restaurante Osteria Corippo, Claire Amstutz, 62. Ela mora em Vogorno, cidade próxima, com cerca de 300 habitantes.
“Venho aqui só para trabalhar e praticamente só vejo turistas. Os moradores são todos idosos e passam o dia dentro de casa”, afirma. A senhora Claire recebe de 15 a 20 clientes por dia --no verão-- para o almoço. “São sempre suíços, austríacos e alemães. Os italianos não gostam de caminhada”, brinca.
O morador mais jovem de Corippo era o próprio prefeito, Claudio Scettrini, 54, que ano passado pediu para deixar o cargo, alegando falta de motivação. A cidadezinha estava cada vez mais vazia, pobre e em degradação. Hoje, Corippo é administrada por um secretário de outra cidade vizinha, Tenero-Contra. Em 2020 deve ser agregada a um grupo de municípios que formarão uma única cidade do chamado Vale Verzasca.
De vilarejo abandonado a hotel difuso
A saída dos mais jovens deixou marcas profundas no vilarejo: casas vazias e ruas e saneamento básico se desfazendo.
Segundo Molinari, a primeira proposta da fundação era atrair mais habitantes jovens e famílias. Mas não deu certo.
Daí surgiu a ideia do empreendimento turístico, que será um "hotel difuso".
Para isso, será necessário reformar e reativar edifícios típicos, como um moinho de trigo, um forno de pão e um espaço onde se secavam castanhas --algo típico da região. Quatro ou cinco casas de Corippo que pertencem à fundação serão transformadas em quartos de hotel. O restaurante local será a recepção, e espera-se que as ruas da cidade ganhem vida com o vai e vem típico de corredores de hotel.
Serão investidos cerca de 3,2 milhões de francos suíços --algo como R$ 12 milhões. A Fundação Corippo já tem cerca de 70% do montante, mas o restante ainda deve chegar com doações.
O governo já autorizou o projeto, mas ainda faltam algumas licenças.
“O conceito de hotel difuso já existe na Itália, em vilas da montanha e perto do mar, mas não na Suíça. A ideia é ter um ponto de referência, o centro da estrutura, que será o restaurante. Os edifícios próximos a esse ponto de encontro são os quartos --a no máximo 100 ou 200 metros de distância”, explica Molinari.
Os prédios tradicionais serão restaurados. Algumas casas que têm escadas do lado de fora, por exemplo, preservarão essa característica local. “Nossa estratégia é que também a paisagem de Corippo seja íntegra e interessante.”
Atualmente, já existem dois quartos com quatro camas disponíveis, mas a ideia é, dentro de um ano e meio, ter lugares para 26 pessoas.
O vilarejo já tem algumas casas utilizadas como hospedagem temporária para turistas, que poderão ser incorporadas ao hotel em possíveis parcerias. Os preços devem seguir a média da região: de 100 a 150 francos por noite, isto é, de R$ 350 a R$ 600.
O plano do hotel prevê, ainda, um espaço para palestras e internet rápida.
“Parece até que Corippo está fora do mundo. Embora esteja só a 20 minutos de outra cidade, é quase isolada em comunicação”, diz o vice-presidente da fundação. “Por outro lado, temos que adaptar algumas estruturas para poder realizar conferências, por exemplo.” Além disso, os idealizadores têm mente contratar pelo menos uma ou duas pessoas, que serão gerentes do hotel e, portanto, passarão a viver na vila.
Construída sobre a rocha, Corippo resiste
Os (poucos) moradores atuais devem continuar em Corippo e levar adiante suas vidas normalmente. Segundo Claire Amstutz, o que se ouve no vilarejo é que estão satisfeitos com o tal “hotel difuso”.
Inquilina da Fundação no prédio da Osteria --onde serve queijos dos Alpes e queijo de cabra, salames, presunto, sopas, massas e salada--, Claire deve se aposentar nos próximos dois anos e devolver o ponto. “Até lá já não estarei mais. Mas em geral, ao que parece, as pessoas dizem ser uma boa ideia”, resume.
Para Marco Molinari, o declínio de Corippo era uma situação trágica e parecia irreversível. “Sem uma mudança geracional, fica difícil manter em pé esses edifícios não habitados. Seria impossível seguir em frente”, lamenta. Ele acha que, com o novo hotel, será possível reanimar Corippo e recuperar o “esplendor de sua estrutura, da arquitetura, e estimular a economia da região”.
Para ele, Corippo é uma típica “cidade cartão-postal” da Suíça. “Corippo é um ícone. A foto da vila, as casas em pedra, construídas sobre rocha. Não é só um ícone simbólico. Queremos que seja também uma vila viva, animada, e um ponto de atração cada vez mais difuso”, diz o vice-presidente.
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