Topo

Ocupações das escolas: por que devemos ouvir os estudantes

Tiago Queiroz/Estadão Conteúdo
Imagem: Tiago Queiroz/Estadão Conteúdo

Especial para o UOL

13/11/2016 06h00

A ocupação de mais de mil escolas por estudantes em todo o país é um sinal claro para a necessidade de um debate imediato entre gestores públicos e os próprios alunos em relação ao direito à educação de qualidade no Brasil.

É legítimo que outros alunos contestem e protestem contra ocupações e a favor de seu direito de voltar às aulas. Porém, a saída para esse impasse não deveria ser a ausência de diálogo e, muito menos, o uso da força pelo Estado.

O direito à participação é assegurado pela Convenção sobre os Direitos da Criança, do qual o Brasil é signatário, e também pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. O país tem ainda o Estatuto da Juventude, que garante "a participação individual e coletiva do jovem em ações que contemplem a defesa dos direitos da juventude ou de temas afetos".

Além disso, esses mesmos marcos legais garantem aos estudantes o direito à integridade física. O Unicef alerta que é dever do Estado brasileiro assegurar que as negociações com os estudantes sejam conduzidas preservando a integridade e a dignidade de todos os envolvidos, com as devidas transparência e clareza. Os atores envolvidos também são responsáveis por participar de forma construtiva e respeitosa. 

Há ainda um terceiro ponto que foi pouco explorado até agora nesse debate: as ocupações são uma oportunidade para os gestores públicos ouvirem e discutirem propostas com os estudantes –uma população que vivencia diariamente os desafios da educação no país e que, portanto, tem muito a contribuir com as discussões.

Feito em 2015 pelo Unicef, um levantamento sobre os desafios do ensino médio comprovou que os estudantes têm uma capacidade incrível de identificar problemas e apresentar soluções sobre o tema. O resultado dessa pesquisa se transformou em um relatório que aponta dez desafios para essa fase do ciclo escolar.

O Brasil conta hoje com 1,65 milhão de adolescentes de 15 a 17 anos fora da escola, e com outros milhares que passam pelo ensino médio sem terem plenamente garantido o seu direito de aprender. Baixos níveis de aprendizagem, altos índices de distorção idade-série, abandono e evasão fazem parte do atual cenário a que adolescentes e jovens são expostos. Para muitos, a escola não é atraente. A vivência dos alunos, como sujeitos de aprendizagem, não é valorizada. Falta conexão entre um projeto de vida, as suas realidades e o que se aprende nas salas de aula.

Neste momento, o país tem uma janela de oportunidade que talvez não se abra em outro momento da história. O Brasil está vivendo uma transição demográfica, em que os adolescentes de hoje serão, em 2030, adultos entre 30 e 40 anos e representarão a maior parcela da população. A escolaridade, a empregabilidade e a autonomia dessa geração vão depender do investimento que é feito hoje neles.

Reunir estudantes, professores e a comunidade, além de ouvir diferentes perspectivas para a retomada das aulas podem significar não apenas a solução de um impasse, mas o início de uma forma efetiva de promover no país uma reforma educacional que traga resultados hoje e no longo prazo.

  • O texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
  • Para enviar seu artigo, escreva para uolopiniao@uol.com.br