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Sabe como melhorar a memória? Faça o teste e descubra

Há pessoas que já nascem com uma aptidão de concentração, retenção e evocação mais desenvolvida - Thinkstock
Há pessoas que já nascem com uma aptidão de concentração, retenção e evocação mais desenvolvida Imagem: Thinkstock

Rosana Faria de Freitas

Do UOL, em São Paulo

04/03/2013 07h00

Por que algumas pessoas têm boa memória e outras não? A pergunta pode soar meio enigmática, mas saiba que a capacidade de memorização depende de vários aspectos. Existe, por exemplo, um importante componente genético: há quem nasça com uma aptidão de concentração, retenção e evocação mais desenvolvidos. Porém, a esse presente dos genes vem se juntar uma série de fatores ambientais que também influenciarão, potencializando ou esmagando tal habilidade.

“Contam idade, atividade profissional, grau de escolaridade, ritmo do sono, prática de atividade regular, uso ou não de medicamentos que possam atrapalhar o processo, consumo ou não de álcool, nicotina e outras drogas, grau de organização e, claro, treinamento da memória”, salienta Leandro Teles, médico neurologista membro do corpo hospitalar do Albert Einstein, Sírio Libanês, Oswaldo Cruz e Samaritano, todos em São Paulo.

Com ele concorda Nanci Azevedo Cavaco, psicopedagoga e neurocientista com especialização em memória e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), sócia-diretora da Academia do Cérebro, no Rio de Janeiro. “Fatores hereditários inclinam, mas não são determinantes. Atitudes saudáveis – desde dormir bem e se exercitar até ter uma boa alimentação – contribuem muito para melhorar essa capacidade. Em uma comparação apenas ilustrativa, pense em uma pessoa magérrima que, à medida que faz musculação e come direito, começa a ganhar massa muscular. É mais ou menos a mesma coisa, o cérebro vai sendo turbinado.”

Em outras palavras, o componente ambiental pode limitar ou ampliar o resultado impresso no código genético. “Por isso, vale a pena, sim, mudar os hábitos e treinar a memória para obter melhores resultados”, completa Leandro Teles.

A emoção ajuda, e muito

Importante: embora o cérebro registre todas as experiências que vivemos, não significa que as guarde. Para memorizar algo, é necessário que haja atenção, concentração, repetição, motivação e emoção. “Quanto maior a carga emocional, maior a possibilidade de fixação, incluindo situações engraçadas e discrepantes”, salienta Nanci Cavaco. Segundo o neurologista Teles, a cabeça recebe a cada segundo milhares de estímulos externos (visuais, auditivos, táteis) e internos (pensamentos, raciocínios, associações) e não é capaz de lidar com todos eles. “O primeiro gargalo é a atenção: apenas alguns são realmente percebidos e, depois, classificados segundo um grau de relevância.”

Complicado? Sem dúvida. O cérebro, inteligentemente, só irá memorizar o que julgar importante para o futuro. Fixará, por exemplo, estímulos que destoam do ambiente, ou estão dentro da nossa área de interesse atual, ou que se apresentam em contextos emocionais, bons ou ruins. “Há parâmetros conscientes e inconscientes nessa seleção”, diz Leandro Teles.

 “Puxar” pela memória

Mas não pense que o processo cessa por aí. Não basta reter uma informação, é preciso conseguir resgatá-la depois. Para isso, parece incrível, mas o sistema nervoso deixa um rastro, de forma que a memória encontre um limiar de evocação.

“Para trazer o dado à tona, precisamos puxar a fio da meada, achar o link correto dentro da cabeça. Trata-se de um recurso complexo e sequencial, cheio de filtros e armadilhas”, considera o neurologista. Para um bom resultado, é fundamental ter um cérebro apto (descansado, atento e concentrado) diante de um estímulo adequado (claro, intenso e eficaz).

Outra dúvida frequente diz respeito à relação entre memória e inteligência. Na opinião de Cavaco, pessoas que memorizam com facilidade têm mais chance de melhorar sua inteligência. Para Teles, o poder de memorizar é um dos aspectos que compõe a capacidade intelectual. “Indivíduos argutos são atentos, engajados, criativos, com bom raciocínio lógico sequencial, poder de previsão de resultados, talento estratégico para levar a cabo determinada missão e, em geral, apresentam boa memória. Claro que nem sempre todas essas inclinações vêm juntas e bem desenvolvidas, existem composições variadas das citadas características.”

O neurologista admite, ainda, que há sujeitos brilhantes com memória ruim – embora seja uma minoria – e outros com memória prodigiosa que não são exatamente bem dotados intelectualmente.

Com a idade, há um natural declínio

É importante considerar, ainda, que a propensão para memorizar o novo depende da idade. Com o passar dos anos, ocorre uma discreta perda de retenção, perceptível geralmente após os 60. “Tal processo não traz grande prejuízo no dia a dia. O problema é que, em alguns casos, o envelhecimento vem acompanhado de doenças que aceleram muito esse curso, como o Alzheimer, a depressão, o hipotireoidismo e as lesões das artérias cerebrais”, salienta Leandro Teles.

Aí, o declínio patológico, com redução intensa da massa cerebral empenhada na cognição, fruto de distúrbios clínicos e neurológicos durante a vida ou na já na terceira idade, junto a um cotidiano cronicamente desregrado, será marcado por esquecimentos e inabilidade intelectual evidente.

Por outro lado, se não há doenças envolvidas, o comprometimento da memória pode ser compensado por fatores como experiência de vida, organização das atividades, treinamento cerebral e hábitos saudáveis. “Já está mais do que provado que o declínio cognitivo é maior dentre os que param no tempo e não cultivam amigos, ocupações e uma rotina que inclua exercícios físicos.

Por outro lado, vemos jovens que, em função da vida acelerada, acabam com a memória prejudicada por falta de atenção, noites de sono perdidas, uso de álcool e drogas. Portanto, o processo de degradação pode ocorrer em qualquer idade se não houver cuidado e estímulo”, destaca a psicopedagoga Nanci Cavaco.

Dicas para turbinar a memória

Trabalhe e estude em ambientes apropriados. O que isso significa? Silenciosos, iluminados e organizados. “Assim, o estímulo que interessa se destaca e a memorização é facilitada. Competição desnecessária de incitações gera sobrecarga dos filtros da atenção, taxa alta de distração e baixo rendimento”, assegura o neurologista Leandro Teles
Faça uma coisa de cada vez. Se pensar em diversos problemas ao mesmo tempo, você deixará passar dados que seriam relevantes. Identifique as prioridades do momento, dedique-se a resolver aquela questão e se desligue do resto. “Envolva-se no que estiver fazendo. Quanto mais motivado, mais facilmente se lembrará”, observa a psicopedagoga e neurocientista Nanci Azevedo Cavaco
Respeite seus períodos de descanso. O bom funcionamento cerebral, acredite, depende disso. Procure dormir ao menos oito horas ininterruptas de sono por noite, com qualidade, aconselha Teles. Uma ou mais noites em claro faz com que o processo cognitivo fique lento, aumentando a taxa de erros. “Além disso, é durante a noite que consolidamos e organizamos grande parte das memórias do dia anterior.” Também é fundamental tirar férias de tempos em tempos, curtir os fins de semana longe do trabalho e de preocupações e praticar atividades de lazer
Alimente-se adequadamente. Prefira itens de fácil digestão, em quantidade moderada e fracionados durante o dia. Refeição pesada e exagerada desloca o fluxo sanguíneo para os intestinos e, nessa, a cabeça fica devagar e preguiçosa. “Se gosta de ovo, leve-o à mesa. Ele é rico em colina, base para a produção de acetilcolina, elemento que age na memória”, informa Nanci Azevedo Cavaco. Para ajudar mais ainda, beba bastante água, um excelente hidratante. “Células desidratadas produzem sonolência”
Pratique atividade física e respiratória. A primeira ativa a circulação sanguínea, e a segunda ajuda a diminuir a ansiedade. “Ambas favorecem a oxigenação do cérebro e combatem os radicais livres, moléculas responsáveis pelo envelhecimento”, diz Nanci Cavaco
Evite medicamentos para dormir. “Muitos destes remédios, usados indiscriminadamente e sem orientação especializada, podem afetar a memorização. Lance mão deles apenas com acompanhamento médico”, adverte Leandro Teles
Trate depressão e ansiedade. Isso é de extrema importância, insiste o neurologista. O primeiro distúrbio torna lentas as ações cerebrais, e o segundo leva a pessoa a sofrer por antecipação, tirando o foco do agora e promovendo dificuldades de atenção e concentração. “O estresse também deve ser evitado, pois é nocivo para a memória e aumenta a produção de radicais livres”, complementa Nanci Cavaco
Exercite a cabeça. Coloque seu cérebro para realizar coisas novas, saindo da zona de conforto. Vale realizar atos rotineiros de forma diferente, mudar trajetos, trocar o mouse de lado, escovar os dentes ou comer com a outra mão. “Aprenda línguas, um instrumento musical, um novo esporte. Enfim, seja criativo e ative o cérebro como se ele fosse um músculo. De forma lúdica, você pode fazer quebra-cabeças, jogar xadrez, damas, cartas e dominó, encarar palavras-cruzadas e sudoku e por aí vai”, sugere Leandro Teles. Nanci Cavaco gosta de jogos de memória principalmente no fim do dia, buscando resgatar detalhes de coisas que viu e vivenciou nas últimas 24 horas. E também meditação, que fortalece a concentração, minimiza a ansiedade e ativa a oxigenação cerebral
Fique longe de álcool e cigarro. O primeiro é um inimigo da memória. “Você passa do ponto e não fixa nada. Em longo prazo, pode levar à atrofia cerebral – redução do tamanho do órgão – e a quadros graves de esquecimento”, afirma o neurologista. Já o tabagismo é outro vilão porque favorece isquemias cerebrais, mesmo que pequenas e imperceptíveis, que, com o passar do tempo, acarretam problemas cognitivos. “Eles produzem um barato imediato, mas outro caro para o resto da vida”, completa Nanci Cavaco
Invente regras mnemônicas. Trata-se de uma técnica milenar, usada por muitos estudantes, para decorar informações escolares de maior complexidade – como tabela periódica, fórmulas de física, datas históricas. Como fazer? Basta associar uma informação difícil de ser retida a algo mais fácil e familiar
Uma boa regra mnemônica carrega informações pela vida inteira. O bom é que tal recurso pode ser usado em todo tipo de dado, durante o dia a dia, incrementando o mecanismo de evocação”, diz Teles. Quer um exemplo: estudantes usam a palavra ‘chon’ para lembrar as iniciais dos quatro elementos químicos orgânicos: carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio
Não se furte a reviver boas lembranças. Tudo que é ligado à emoção será mais facilmente fixado. E tem mais, as emoções positivas apresentam prioridade sobre as negativas. “Viaje, encontre amigos, reúna a família, viva com intensidade e otimismo. Dessa forma, suas memórias serão mais vivas e resistentes”, afirma Leandro Teles. Vale recordar passagens prazerosas e rever álbuns de fotografia e vídeos antigos, remontando os momentos na cabeça. E esteja certo de que, quanto mais vezes algo for lembrado, mais firme ficará o registro. “Com o tempo, seu cérebro se empenhará em preservar as experiências da vida