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Avanços tecnológicos melhoram a qualidade de vida dos diabéticos

Na imagem, um glicosímetro antigo que media os níveis de glicose no sangue com uma quantidade muito maior de sangue do que a necessária nos aparelhos atuais - Reprodução/Clube do Diabetes
Na imagem, um glicosímetro antigo que media os níveis de glicose no sangue com uma quantidade muito maior de sangue do que a necessária nos aparelhos atuais Imagem: Reprodução/Clube do Diabetes

Thamires Andrade

Do UOL, em Chicago*

28/06/2013 07h00Atualizada em 01/07/2013 16h06

Há mais de 30 anos, a psicóloga Graça Camara tomou um susto quando recebeu o diagnóstico de que sua filha, com um ano e três meses, tinha diabetes. Nem o próprio pediatra desconfiou do quadro de diabetes da criança que estava "prostrada", segundo a mãe, e foi internada em coma na UTI de um hospital infantil. Naquela época ainda não existiam glicosímetros no Brasil, o que dificultava ainda mais o tratamento da doença, que exige uma monitoração dos níveis de glicose no sangue constantemente. De acordo com os endocrinologistas ouvidos pelo UOL Saúde, o avanço tecnológico no tratamento melhorou não só a qualidade de vida dos pacientes, mas também a monitoração e a administração da insulina.

A endocrinologista Denise Reis Franco, membro da diretoria da Associação de Diabetes Juvenil (ADJ), conta que, antes de os glicosímetros existirem, a única maneira de medir a glicose era ferver a urina em um tubo de ensaio. "Era necessário ferver um reagente com 10 ml de urina e conforme a mudança da cor é que se calculava quanto de insulina era necessário tomar. Imagina fazer esse procedimento quatro vezes ao dia?", relembra também Mauro Scharf, endocrinologista e chefe do serviço de endocrinologia pediátrica do Hospital Nossa Senhora das Graças, em Curitiba.

A psicóloga conseguiu fazer sob encomenda um glicosímetro para medir os níveis de glicose de sua filha."O aparelho, que funcionava com pilhas ou energia elétrica, era tão caro que a empresa em que eu trabalhava fez um financiamento do valor para mim", lembra Graça. Como as tiras para a medição também tinham custo elevado, ela fazia as medições eventualmente. "Além disso, não havia lancetas para fazer a punção do sangue para medição. Tinha que usar agulhas descartáveis imensas e em um bebê com menos de dois anos de idade. Era um sofrimento", relata.

Para Scharf, a medição de forma rápida, prática e indolor é um dos pilares para que o paciente possa aderir ao tratamento. "Antes era preciso colher 0,5 mililitro de sangue do paciente para fazer a medição e atualmente basta 0,3 microlitro. Pode parecer besteira, mas, para um paciente que vai se picar de quatro a sete vezes ao dia, isso é importante", destaca. Em outras palavras, a quantidade de sangue necessária para aferir os níveis glicêmicos diminuiu mais de 99%.

A rapidez da monitorização também é um fator importante para evitar a angústia dos pacientes. "Nos aparelhos mais antigos o tempo para aferir a glicemia era longo e, enquanto o resultado não aparecia, os pacientes ficavam tensos e com medo de passarem mal. Nos aparelhos atuais esse resultado é dado rapidamente", destaca.

Aplicação mais precisa

A aplicação da insulina, medicamento necessário no tratamento de todos pacientes com diabetes tipo 1 - doença autoimune em que o pâncreas para de produzir esse hormônio, também evoluiu com o passar do tempo. "Antigamente era usada uma seringa de vidro e uma agulha intramuscular, ou seja, além de doer, era necessário esterilizar todo o material a cada aplicação", revela Franco.

Membro da diretoria da Associação de Diabetes Juvenil (ADJ), Franco explica ainda que essa evolução ajudou a diminuir o estigma com relação à doença. "Antes era preciso preparar uma seringa e aspirar a insulina e isso chocava um pouco as pessoas. Hoje você só tira uma caneta e aplica. Além de ser mais fácil, a precisão do medicamento aplicado também é maior", destaca.

As agulhas também ficaram mais finas e o isopor com gelo para levar a insulina também não faz mais parte do dia a dia dos diabéticos. "Atualmente, apenas a insulina que está fora de uso fica dentro da geladeira e isso faz com que o tratamento seja mais fácil, pois o paciente não precisa mais levar a caixa com gelo para [acondicionar] o hormônio", explica Franco.

Outros aparelhos, como as bombas, também contribuem para a precisão na hora de aplicar a insulina. O sistema funciona com a infusão subcutânea e a cada três dias é necessário trocar o cateter. "A bomba é programada para liberar a insulina basal e a ultrarrápida e, quando o paciente tem alguma indisposição, como diarreia ou vômitos, é possível desligar o aparelho", destaca a endocrinologista.

Ainda que seja mais preciso, o que também ajuda a evitar episódios de hipoglicemia, problema comum entre os diabéticos tipo 1, pode levar à inconsciência, à convulsão e até à morte, o aparelho ainda tem custo alto. "A bomba é para poucos, pois seu custo é elevado e varia de R$ 15 mil a R$ 18 mil. E ainda é preciso arcar com a manutenção, pois é preciso trocar o cateter e os sensores. Mensalmente o custo dessa tecnologia varia de R$ 1.500 a R$ 2.000", afirma Scharf.

Os adesivos sem fio ainda não estão disponíveis no Brasil, mas são outra opção para os diabéticos que fazem uso da insulina. "Esse aparelho contém um reservatório de insulina que é programado via wireless e bluetooth. Os pacientes devem trocar o patch a cada três dias e o custo é um pouco mais barato que o das bombas de insulina", conta o chefe do serviço de endocrinologia pediátrica do Hospital Nossa Senhora das Graças de Curitiba.

Aparelhos com insulina inalada que já foram retirados do mercado também estão passando por novos testes de segurança e estudos para se tornam uma nova alternativa para os diabéticos que precisam tomar insulina de ação rápida antes das refeições. "Ao invés de aplicar a insulina, o paciente coloca a cápsula, assopra e inspira. É bem rápido e igual às bombinhas de asma", explica Franco.

Aplicativos

Além dos glicosímetros tradicionais, que já diminuíram bastante de tamanho desde sua invenção, os diabéticos também contam com a ajuda dos aplicativos para facilitar o dia a dia. "Com eles é possível colocar os dados da medição de glicose e enviar para o médico para que ele possa acompanhar mais de perto o paciente", destaca Franco.

Outra função comum nos aplicativos disponíveis para iPhone e Android são a contagem de carboidratos a cada alimentação. "O paciente coloca o que vai comer e o programa conta quantos carboidratos tem em cada alimento. Esse cálculo é determinante para saber a quantidade de insulina que deve ser tomada", explica a endocrinologista.

  • O glicosímetro iBGStar funciona acoplado no smartphone e pretende unir a monitorização ao benefício dos aplicativos

Previsto para ser lançado no fim deste ano ou início de 2014, o glicosímetro iBGStar pretende unir a monitorização ao benefício dos aplicativos. "Hoje em dia, os jovens são muito conectados e estão sempre com os smartphones na mão. Esse glicosímetro é pequeno e é acoplado ao celular. Para fazer a medição será preciso baixar um aplicativo e ele vai fornecer gráficos para acompanhar o tratamento e enviar os dados ao médico", explica Scharf.

Além disso, ao medir os níveis de glicose no sangue não será possível apagar essa informação, evitando que os pacientes, especialmente os mais jovens, mintam a respeito dos números da doença. "Os pais dão os medicamentos certinho para as crianças quando elas são pequenas, mas quando o paciente fica jovem, muitos param de tomar a insulina porque não querem engordar, por exemplo, e isso atrapalha o tratamento", afirma.

O iBGStar já é vendido nos Estados Unidos e o custo varia de 30 a 40 dólares, segundo Scharf, o preço não vai variar muito dos glicosímetros já vendidos no Brasil.

Na opinião de Graça, que acompanhou a evolução do tratamento do diabetes, o acesso a esses novos recursos tem ficado mais acessível para a população. "O governo também tem fornecido os glicosímetros e as fitas para fazer a medição, pois hoje não dá pra aceitar o tratamento da doença sem testes de glicemia. No entanto, ainda há muito o que melhorar com relação aos custos ", declara.

Individualização do tratamento

Uma nova recomendação que a ADA (Associação Americana de Diabetes) defende é tornar o tratamento dos diabéticos ainda mais individualizado. "A ideia é que os tratamentos não sejam iguais, pois é preciso levar em conta aspectos como idade, tempo de evolução da doença, presença de outras patologias, adesão do paciente ao tratamento, entre outros", defende Isabela Bussade, endocrinologista e orientadora científica da Pronokal.

Marcos Antônio Tambáscia, endocrinologista e chefe da disciplina de endocrinologia da faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), também ressalta que a condição financeira do paciente também deve ser avaliada antes da prescrição do tratamento. "A tendência é a individualização, é cada paciente usar uma droga diferente e conseguir controlar a glicemia e reduzir o peso", destaca.

A psicóloga Graça reconhece que os médicos estão mais preparados para ajudar os pacientes na educação com diabetes, mas defende que todos saibam o quanto a individualização do tratamento é importante. "O preparo dos profissionais de saúde com relação à importância dessa prescrição que deve ser focado para cada paciente é necessário para melhorar ainda mais o tratamento e a qualidade de vida dos pacientes", opina.

* A repórter viajou a convite da Sanofi