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'Se não liberarem, a gente vai acabar fazendo protesto', diz participante de rolezinho

20/01/2014 08h23

Flavio Azevedo, de 20 anos, mora no Capão Redondo e ainda pretende fazer faculdade de fisioterapia. Enquanto isto não acontece, ele trabalha e frequenta rolés em bairros de São Paulo para se divertir.

Segundo ele, rolés já acontecem há anos em bairros periféricos de São Paulo --não só em shopping centers, mas em ruas e praças, e sempre na mira dos policiais.

"A polícia diz que a gente atrapalha eles, mas eles atrapalham a gente. Os caras já chegam tacando bomba, bala de borracha e gás, principalmente na rua. Não precisava disso", disse à BBC Brasil.

Flavio afirma que os eventos --que continuam sendo marcados por adolescentes, mesmo após os episódios de repressão policial e a proibição de alguns shopping centers-- deveriam ser defendidos pelas autoridades.

"A gente trabalha e chega o final de semana a gente quer curtir, quer conhecer alguém, quer se divertir como qualquer pessoa. Deveriam fazer uma lei pra isso. A gente é jovem, quer curtir mesmo."


"Se eles não liberarem pra a gente fazer nossos rolés, a gente vai acabar fazendo protesto, como muitos protestos existem", afirmou.

Para ele, que trabalha como montador de móveis planejados e quer comprar uma moto, o "funk ostentação", tipo de música que faz sucesso entre jovens da periferia, mostra um caminho honesto para ter poder de consumo: "As músicas falam de crescer na vida, mesmo pelo funk".

"Quando eu comprei o meu tênis, minha mãe quase tem um treco, mas é meu dinheiro. Muitas pessoas ostentam roubando, mas o que vem fácil, vai fácil. A gente trabalha, a gente sua."

Flavio foi com dois amigos ao parque Ibirapuera no sábado, dia 18, para que tinha cerca de 3.000 confirmados no Facebook. O rolé do parque, no entanto, teve muitos jornalistas e pouco menos de 50 participantes, segundo a Guarda Civil, que havia reforçado o policiamento.

'Protesto pacífico'

Seu amigo Lucas Ávila, de 18 anos, acredita que marcar rolezinhos é "um tipo de protesto pacífico nosso, para a gente ter o nosso espaço".

"Todo mundo já ia para o shopping se encontrar. Só porque aumentou a quantidade a polícia começou a interferir e começou a dar esse tumulto todo. Aí o pessoal acabou se revoltando e querendo fazer essas manifestações de protesto, para conseguir alguma coisa para a gente", diz.

Os jovens dizem apoiar as manifestações de ativistas e movimentos sociais contra o que chamam de discriminação e segregação social em shopping centers de São Paulo - mas não participaram de nenhum deles.

"Foi igual àquele negócio que teve da condução (os protestos contra o aumento das tarifas de ônibus). Sempre tinha aquelas pessoas fazendo aquele protesto ali e insistindo. E acabaram conseguindo a diminuição. Eu acho que a se a gente continuar insistindo, a gente vai acabar conseguindo nosso espaço."

Lucas, que é instalador de pisos, gosta de usar roupas de marca e diz que quer comprar seu carro ainda esse ano. Mas no futuro próximo, ele quer ir à faculdade e tornar-se chefe de cozinha.

Pouca adesão

Durante o fim de semana, roles foram marcados por adolescentes no parque Ibirapuera, no shopping Center Norte e no shopping Tatuapé, em São Paulo. Nenhum dos três eventos teve muitos participantes, mas contou com presença maciça de jornalistas.

No shopping Center Norte, os adolescentes organizadores do evento foram abordados por policiais antes mesmo de entrarem no centro comercial.

Um deles, Caique Gonçalves, recebeu uma notificação judicial. O documento previa o pagamento de uma multa de R$ 10 mil reais por dia, caso o evento fosse realizado.

Um rolé de protesto marcado em um shopping de elite paulista no sábado também não chegou a acontecer, porque o centro comercial fechou as portas.

No Rio de Janeiro, o shopping Leblon --onde foi marcado rolezinho com cerca de 9.000 confirmados-- também decidiu fechar as portas para evitar o evento, depois que uma decisão judicial derrubou a liminar que proibia o evento.