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Por que o Brasil busca aproximação com a Colômbia?

19.jun.2014 - A presidente Dilma Rousseff recebe o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, no Palácio da Alvorada - Pedro Ladeira/Folhapress
19.jun.2014 - A presidente Dilma Rousseff recebe o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, no Palácio da Alvorada Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Ruth Costas

Enviada especial da BBC Brasil a Bogotá (Colômbia)

09/10/2015 06h07

Em meio ao acirramento da crise política no Brasil, a presidente Dilma Rousseff desembarcou em Bogotá para uma visita focada na cooperação econômica e comercial com a Colômbia.

A passagem de apenas um dia por Bogotá não deve dar a presidente exatamente um descanso após semanas de grandes mudanças no governo, derrotas no Congresso e no Tribunal de Contas da União e intensas articulações políticas.

Dilma terá uma agenda cheia que inclui um café da manhã com empresários, visita à casa onde Simon Bolívar viveu, encontros com o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, com representantes do Congresso e da Suprema Corte, assinatura de acordos bilaterais e um discurso de encerramento em um seminário empresarial.

Por outro lado, ao menos a agenda e as manchetes dos jornais locais devem ser um pouco mais positivas do que as que Dilma vêm enfrentando no Brasil.

"Essa crise brasileira não é algo que receba muito destaque na Colômbia ou que atraia a atenção do colombiano comum", diz Enrique Serrano, professor da Faculdade de Relações Internacionais da Universidade del Rosario.

"Mesmo a visita de Dilma deve ter pouca repercussão: nesta sexta-feira poderia apostar que o grande tema de conversas por aqui será o jogo com o Peru (das eliminatórias da Copa 2018)."

Serrano diz que o Brasil ganhou espaço nos noticiários colombianos durante o governo Lula, pelo estilo mais expansivo da política externa do ex-presidente, que algumas vezes se colocou como interlocutor com a Venezuela e até enviou helicópteros para ajudar no resgate de reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

"Com Dilma a relação voltou ao que até então era seu 'normal': um certo distanciamento no campo político, um isolamento que aumentou com esses problemas internos brasileiros. Mas isso não necessariamente é ruim do ponto de vista de Bogotá: pelo peso do Brasil na região, havia quem visse com desconfiança o fato do país se ocupar de temas que afetavam diretamente a Colômbia na gestão Lula."

Colômbia x Argentina

Com uma das economias que mais crescem na América Latina, a Colômbia está em uma espécie de disputa com a Argentina pelo posto de terceiro maior PIB latino-americano (atrás do Brasil e do México).

As expectativas para o crescimento das economias brasileira e colombiana neste ano são invertidas: enquanto analistas esperam que o PIB da Colômbia cresça de 2% a 3%, no Brasil a projeção é de queda da mesma magnitude.

Com a visita de Dilma, o governo brasileiro agora busca uma aproximação com foco econômico além de um aprofundamento de algumas iniciativas de cooperação técnica.

"A Colômbia hoje é a terceira força na América do Sul e os números indicam que em 2020 ela venha a passar a Argentina como segunda força. O Brasil não pode, como primeira força da região, ficar longe da Colômbia", disse David Baroni Neto, Presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), logo após desembarcar em Bogotá acompanhando Dilma.

"Esta já é a segunda missão à Colômbia em menos de 60 dias. O interesse é muito grande no mercado local."

Segundo uma nota do Itamaraty, devem ser assinados nesta visita acordos na área de facilitação de investimentos, comércio automotivo, agricultura e segurança alimentar, educação e pesquisa científica.

"Esta visita da presidente vai marcar um novo momento nas relações, um relançamento", disse o Ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, que também está acompanhando a presidente.

"Temos uma perspectiva de finalmente celebrar um acordo na área automotiva, extremamente importante para os dois países e seguimos trabalhando nas áreas de serviços e contas públicas e também celebrando um acordo na área de investimentos".

Tarifas

Na área comercial, também espera-se que seja acordada uma aceleração do cronograma de redução das tarifas de um acordo de complementação econômica que já existe entre os dois países - o ACE 59.

"O grande desafio é descongelar o cronograma de desgravação (espécie de 'agenda' que determina ritmo da redução progressiva de alíquotas de taxas de importação) que estava congelado. A partir de um acordo dos setores têxteis e siderúrgicos vamos retomar a desgravação e esperamos antecipar esse movimento de forma que o comércio esteja integralmente desgravado até 2017", disse Monteiro.

Outro tema na agenda é a cooperação do Brasil em um cenário de pós-conflito com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

Em setembro, o governo colombiano e a guerrilha estipularam um prazo de 6 meses para alcançar um acordo de paz definitivo.

Os colombianos teriam grande interesse na experiência brasileira de apoio à agricultura familiar por acreditarem que ela pode ajudar trabalhadores rurais das zonas hoje controladas pela guerrilha, estabilizando essas regiões.

Serrano acrescenta que também deve haver um mútuo interesse em expandir a questão da cooperação militar para lidar com grupos criminosos que atuam na região da fronteira, ou colaboram entre si.

"Sendo a crise política e econômica brasileira tão complexa, é natural que passe relativamente desapercebida em muitos países, entre eles a Colômbia - a não ser que haja um evento internacional de peso atraindo as atenções para o Brasil, como foi o caso da Copa do Mundo", diz o cientista político colombiano Carlos Medina, da Universidade Nacional da Colômbia.

"Mas é claro que isso vale para a opinião pública em geral. Entre as elites políticas colombianas e nas universidades acho que há, sim, uma preocupação crescente sobre o que uma desestabilização no Brasil pode representar para o resto da região. Sem dúvida, todos perdemos."