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Isolar a Grécia não é a melhor solução para a zona do euro

Gregos iniciam novo conflito após aprovação do novo pacote de medidas econômicas no parlamento - Thanassis Stavrakis/AP
Gregos iniciam novo conflito após aprovação do novo pacote de medidas econômicas no parlamento Imagem: Thanassis Stavrakis/AP

Paul Krugman

07/05/2010 02h11

Então a Grécia é o próximo Lehman? Não. Ela também não é grande o bastante ou interligada o bastante para causar uma paralisação dos mercados financeiros globais como ocorreu em 2008. O que tenha causado aquele breve queda de 1.000 pontos no Dow não se justificava pelos eventos na Europa. 

Nem você deve levar a sério os analistas que alegam que estamos vendo o começo de uma corrida contra todas as dívidas públicas. Os custos de tomada de empréstimo pelos Estados Unidos na verdade caíram na quinta-feira (06) ao seu nível mais baixo em meses. E apesar das preocupações de que o Reino Unido poderia ser a próxima Grécia, as taxas britânicas também caíram ligeiramente. 

Isso é uma boa notícia. A má notícia é que os problemas da Grécia são mais profundos do que os líderes da Europa estão dispostos a reconhecer, mesmo agora –e são compartilhados, em menor grau, por outros países europeus. Muitos observadores agora esperam que a tragédia grega terminará em calote; eu estou cada vez mais convencido de que eles são otimistas demais, de que o calote será acompanhado ou seguido por um abandono do euro. 

De certa forma, esta é uma crônica de uma crise anunciada. Eu me recordo de ter brincado, quando o Tratado de Maastricht que colocou a Europa no caminho para o euro foi assinado, que eles tinham escolhido a cidade holandesa errada para a cerimônia. Ela deveria ter ocorrido em Arnhem, local da infame “ponte longe demais” da Segunda Guerra Mundial, onde um plano de batalha Aliado exageradamente ambicioso terminou em desastre. 

O problema, tão óbvio olhando para trás como é agora, é que a Europa carece de alguns atributos-chave para uma área de moeda bem-sucedida. Acima de tudo, ela carece de um governo central. 

Considere a comparação feita com frequência entre a Grécia e o Estado da Califórnia. Ambos estão em profundos problemas fiscais, ambos têm uma história de irresponsabilidade fiscal. E o impasse político na Califórnia talvez seja ainda pior –afinal, apesar das manifestações, o Parlamento grego aprovou as duras medidas de austeridade. 

Mas os apuros fiscais da Califórnia não importam tanto, mesmo para os próprios californianos, quanto os da Grécia. Por quê? Porque grande parte do dinheiro gasto na Califórnia vem de Washington, não de Sacramento. Os recursos estaduais podem ser cortados pela metade, mas os reembolsos do Medicare (o seguro-saúde público), os pagamentos das aposentadorias pelo Seguro Social e os pagamentos às empresas contratadas pela Defesa continuarão sendo feitos. 

O que isso significa, entre outras coisas, é que os apuros orçamentários da Califórnia não impedirão o Estado de compartilhar uma recuperação econômica americana mais ampla. Os cortes orçamentários da Grécia, por outro lado, terão um forte efeito depressor sobre uma economia já deprimida. 

Assim, a reestruturação da dívida –um termo educado para calote parcial– é a resposta? Não ajudaria tanto quanto muitas pessoas imaginam, porque os pagamentos dos juros representam apenas parte do déficit orçamentário da Grécia. Mesmo se deixar de pagar totalmente o serviço de sua dívida, o governo grego ainda não disporia de dinheiro suficiente para evitar cortes orçamentários brutais. 

A única coisa que poderia reduzir seriamente a dor grega seria uma recuperação econômica, que geraria tanto receitas mais altas, reduzindo a necessidade de cortar gastos, quanto criaria empregos. Se a Grécia tivesse sua própria moeda, ela poderia tentar promover essa recuperação por meio da desvalorização de sua moeda, aumentando a competitividade de suas exportações. Mas a Grécia está no euro. 

E como isso termina? Logicamente, eu vejo três formas para Grécia permanecer no euro. 

Primeiro, os trabalhadores gregos poderiam se redimir por meio do sofrimento, aceitando grandes reduções salariais que tornariam a Grécia competitiva o bastante para voltar a criar empregos. Segundo, o Banco Central Europeu promoveria uma política muito mais expansionista, entre outras coisas comprando muitos títulos da dívida do governo e aceitando –na verdade dando as boas-vindas– à inflação resultante; isso tornaria o ajuste na Grécia e em outros países problemáticos da zona do euro muito mais fácil. Ou, terceiro, Berlim poderia se tornar para Atenas o que Washington é para Sacramento –isto é, governos europeus fiscalmente mais fortes poderiam oferecer aos seus vizinhos mais fracos ajuda suficiente para tornar a crise suportável. 

O problema, é claro, é que nenhuma dessas alternativas parece politicamente plausível. 

O que resta parece impensável: a Grécia deixar o euro. Mas quando você descarta tudo mais, é isso o que resta. 

Se acontecer, será parecido com o que aconteceu à Argentina em 2001, que mantinha uma paridade supostamente permanente, inquebrável, com o dólar. O fim dessa paridade era considerado impensável pelos mesmos motivos que o abandono do euro parece impossível: até mesmo sugerindo a possibilidade de uma corrida capaz de quebrar os bancos. Mas corridas aos bancos aconteceram mesmo assim, e o governo argentino impôs restrições de emergências aos saques. Isso deixou aberta a porta para a desvalorização e a Argentina posteriormente passou por aquela porta. 

Se algo assim vier a acontecer na Grécia, isso enviaria ondas de choque por toda a Europa, possivelmente provocando crises em outros países. Mas a menos que os líderes europeus estejam dispostos a agir mais audaciosamente do que vimos até agora, é nesta direção que a situação está seguindo.