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Republicanos querem limitar regulamentações e criar "primavera" para os banqueiros

Paul Krugman

04/05/2011 03h02

No ano passado, o Partido Republicano realizou dois exemplos espetaculares de campanha enganosa. A do Medicare (o seguro-saúde público para idosos e inválidos), onde as mesmas pessoas que criticavam que a reforma da saúde o transformaria em um painel da morte agora estão tentando desmontar todo o programa, foi a mais óbvia. A mesma coisa aconteceu em relação à reforma financeira.

Como você pode lembrar, os republicanos concorreram contra o resgate aos bancos. Entre outras coisas, eles conseguiram convencer um grande número de eleitores que a legislação profundamente impopular de resgate, que foi proposta e aprovada pelo governo Bush, foi aprovada pelo presidente Barack Obama.

E agora estão fazendo tudo o que podem para assegurar que ocorram resgates ainda maiores nos próximos anos.

O que é necessário para limitar futuros resgates? Declarar que nunca mais faremos isso de novo não é resposta: quando a turbulência financeira ocorre, ficar de lado enquanto os bancos caem como dominós não é uma opção. Afinal, foi isso o que os autores de políticas fizeram em 1931, e a crise bancária resultante transformou uma mera recessão na Grande Depressão.

E não vamos esquecer que os mercados estavam em queda livre quando o governo Bush permitiu que o Lehman Brothers entrasse em liquidação. Apenas uma ação rápida – incluindo a aprovação do odiado resgate – impediu uma repetição plena de 1931.

Qual então seria a solução? A resposta é uma regulamentação que limite a frequência e tamanho das crises financeiras, combinada com regras que permitam que o governo feche um bom negócio quando resgates se tornarem necessários.

Lembre-se que dos anos 30 aos anos 80 os Estados Unidos conseguiram evitar grandes resgates de instituições financeiras. A era moderna de resgates teve início apenas nos anos Reagan, quando os políticos começaram a desmontar a regulamentação dos anos 30.

Além disso, a regulamentação não foi atualizada à medida que o sistema financeiro evoluía. As instituições que foram resgatadas em 2008-2009 não eram bancos à moda antiga; eram impérios financeiros complexos, muitos deles com atividades na prática não regulamentadas – e foram essas atividades não regulamentadas que deixaram a economia americana de joelho.

Ainda pior, o governo claramente carece de autoridade para tomar esses impérios financeiros da mesma forma que a corporação federal de seguro de depósitos pode tomar um banco convencional quando ele quebra. Esse é um motivo para o resgate parecer tanto um presente: as autoridades sentiam que careciam de instrumentos legais para salvar o sistema financeiro sem deixar as pessoas que provocaram a crise de fora.

No ano passado, os democratas do Congresso aprovaram um projeto de lei de reforma financeira que buscava fechar esses buracos. O projeto de lei ampliava a regulamentação de muitas formas: proteção ao consumidor, padrões de capital mais elevados para grandes instituições, maior transparência para instrumentos financeiros complexos. E criava novos poderes –“autoridade de solução”– para ajudar as autoridades a obter uma barganha mais dura em futuras crises.

Há muitas críticas que podem ser feitas a esta legislação, que pode ser considerada fraca demais. E o governo Obama frustrou muitas pessoas com sua postura leniente demais em relação a Wall Street – como a decisão da semana passada de isentar de regulamentação os swaps cambiais, uma grande fonte de problemas em 2008.

Mas os republicanos estão tentando minar a coisa toda.

De volta a fevereiro, os legisladores republicanos reconheceram francamente que estavam tentando minar a reforma financeira ao cortarem seus fundos. E a recente proposta orçamentária da Câmara, que pede pela privatização e “voucherização” do Medicare, também pede pela eliminação da autoridade da solução, na prática armando as coisas para que os banqueiros consigam um negócio tão bom na próxima crise quanto o que conseguiram em 2008.

É claro que não é assim que os republicanos colocam. Eles alegam que sua meta é “encerrar o ciclo de futuros resgates”, sob a rubrica geral do “fim do bem-estar corporativo”.

Mas como já vimos, futuros resgates ocorrerão independente do que os políticos digam atualmente – e serão maiores, mais frequentes e mais caros sem uma regulamentação eficaz.

Para ver o que está realmente acontecendo, basta seguir o dinheiro. Wall Street costumava favorecer os democratas, talvez porque os financistas tendem a ser liberais em questões sociais. Mas a ganância fala mais alto que os direitos dos gays, e as contribuições do setor financeiro passaram a pender fortemente para os republicanos nas eleições de 2010. Aparentemente Wall Street, diferente dos eleitores, não tem dificuldade em perceber as verdadeiras intenções do partido.

E mais uma coisa: ao ficarem no caminho das regulamentações que limitariam futuras crises financeiras, os republicanos estão dando mais uma evidência de que realmente não ligam para os déficits orçamentários, pois nossa atual crise é resultado da crise financeira de 2008, que devastou receita e aumentou o custo de programas como o seguro-desemprego. E apesar de termos conseguido evitar grandes custos diretos do resgate (um fato não apreciado no debate público), nós poderemos não ter tanta sorte da próxima vez.

Mais e maiores crises; mais e maiores resgates; mais e maiores déficits. Se você gosta dessa perspectiva, você deve amar o que o Partido Republicano está fazendo com a reforma financeira.