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A vitória incrível dos democratas

10/11/2012 00h01

Vamos dizer o óbvio: os democratas conquistaram uma vitória incrível. Eles não apenas conseguiram se manter na Casa Branca – apesar do cenário econômico ainda conturbado –, como, na verdade, também conseguiram aumentar seu número de assentos no Senado, num ano em que se previa que sua maioria na Casa acabaria.

E não foi só isso: eles também obtiveram vitórias importantes nos Estados. E o mais notável é que a Califórnia – Estado que há muito tempo é uma espécie de garoto-propaganda para a disfunção política que ocorre quando o legislativo não consegue aprovar nenhuma pauta sem uma maioria – não apenas votou pela adoção de aumentos de impostos, que se faziam muito necessários, como também elegeu – adivinhe? – uma maioria democrata.

Mas um gol iludiu os vencedores. Apesar de as estimativas preliminares sugerirem que os democratas receberam um número de votos um pouco maior do que o dos republicanos nas eleições para o Congresso, o Partido Republicano manteve um sólido controle sobre a Casa graças à extrema ampliação dos distritos de votação levada a cabo por tribunais eleitorais e pelos governos estaduais controlados pelos republicanos. E o deputado John Boehner, presidente da Câmara, não perdeu tempo em declarar que o seu partido continua tão intransigente quanto antes, e que os republicanos se opõem totalmente a qualquer aumento nas alíquotas fiscais – apesar de eles continuarem resmungando a respeito da dimensão do déficit dos Estados Unidos.

Por isso, o presidente Barack Obama tem que tomar uma decisão quase que imediata para determinar como vai lidar com a continuada obstrução republicana no legislativo. Até onde Obama deve ir para tentar acomodar as demandas do Partido Republicano?

Minha resposta é: ele não deve ir muito longe. Obama deve bater o pé e deve se mostrar disposto, se necessário, a se manter firme, mesmo ao preço de permitir que seus adversários inflijam danos a uma economia ainda frágil. E este definitivamente não é o momento para se negociar uma “grande barganha” para o orçamento – uma negociação que representaria uma vitória às avessas.

Ao afirmar isso, não estou tentando minimizar os reais perigos econômicos representados pelo chamado abismo fiscal, que parece iminente no final deste ano caso os dois partidos não cheguem a um acordo. Tanto os cortes de impostos da era Bush quanto a redução dos impostos sobre as folhas de pagamento realizada pelo governo Obama estão para expirar, enquanto entram em vigor os cortes automáticos dos gastos relacionados à área de defesa e a outras áreas, graças ao acordo firmado após o confronto travado em 2011 sobre o teto da dívida. E a iminente combinação de aumentos nos impostos e cortes de gastos parece, com certeza, grande o suficiente para empurrar os Estados Unidos de volta à recessão.

Ninguém quer ver isso acontecer. No entanto, esse cenário pode se materializar – e Obama tem que estar disposto a deixar que ele aconteça, caso necessário.

Por quê? Porque os republicanos estão tentando – pela terceira vez desde que Obama assumiu o governo – fazer chantagem econômica para alcançar um objetivo que eles não têm votos para alcançar por meio do processo legislativo normal. Em especial, os republicanos querem ampliar os cortes de impostos para os mais ricos implantados por Bush, apesar de o país não ter recursos para tornar esses cortes de impostos permanentes e de o público acreditar que os impostos cobrados dos ricos devem aumentar – e os colegas de Romney estão ameaçando barrar todo e qualquer acordo relacionado a outras questões, a não ser que eles consigam o que querem. Então, os republicanos estão, na verdade, ameaçando arruinar a economia a menos que suas exigências sejam atendidas.

Obama se rendeu, essencialmente, em face de táticas semelhantes adotadas no final de 2010, quando concordou em ampliar os baixos impostos cobrados dos ricos por mais dois anos. E ele novamente fez concessões significativas em 2011, quando os republicanos ameaçaram criar um caos financeiro ao se recusarem a aumentar o teto da dívida. E a atual crise potencial é o legado dessas concessões passadas.

Bem, isso tem que parar – a menos que nós queiramos que a transformação dos democratas em reféns e a ameaça de deixar o país ingovernável tornem-se parte normal de nosso processo político.

Então, o que Obama deve fazer? Basta dizer não e entrar no abismo, se necessário.

É importante ressaltar que o abismo fiscal não é realmente um abismo. Ele não é como o confronto sobre o teto da dívida, que poderia muito bem ter acarretado coisas terríveis imediatamente caso seu prazo tivesse sido perdido. Desta vez, nada de muito ruim vai acontecer com a economia se um acordo não for fechado até as primeiras semanas ou mesmo até os primeiros meses de 2013. Portanto, há tempo para negociar.

Mais importante, no entanto, é o fato de que um impasse prejudicaria os apoiadores dos republicanos – os doadores corporativos, em especial –, tanto quanto prejudicaria o restante do país. Como o risco de danos econômicos graves aumentou, os republicanos enfrentariam uma intensa pressão para fechar um acordo, no final das contas.

Enquanto isso, o presidente se encontra em uma posição muito mais fortalecida do que aquela em que estava durante confrontos anteriores. Eu não coloco muita fé quando se fala em “mandatos”, mas Obama venceu a reeleição com uma campanha populista e, dessa forma, ele pode alegar que os republicanos estão desafiando a vontade do povo norte-americano. E ele acaba de ganhar a sua grande e mais importante eleição, e está, portanto, em uma posição muito melhor do que antes para resistir a qualquer revés político causado pelos problemas econômicos – especialmente porque ficaria óbvio demais que esses problemas estão sendo deliberadamente infligidos pelo Partido Republicano, em sua última tentativa para defender os privilégios do 1% mais abastado da população dos EUA.

Acima de tudo, enfrentar a tentativa de transformar os democratas em reféns é a coisa certa a se fazer para o bem do sistema político dos Estados Unidos.

Por isso, defenda seu território, senhor presidente, e não ceda a ameaças. Nenhum acordo é melhor do que um mau negócio.