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Conservadores norte-americanos seguem presos a seus dogmas

Paul Krugman

24/11/2012 00h01

No início da semana, a revista GQ publicou uma entrevista com o senador Marco Rubio, que muitos consideram um candidato à nomeação presidencial republicana de 2016. A revista perguntou a Rubio a idade da Terra. Depois de declarar “não sou um cientista, cara”, o senador buscou uma evasiva desesperada, terminando com a declaração de que a idade da Terra “é um dos maiores mistérios”.

Foi um negócio engraçado, e os conservadores gostariam que nós esquecêssemos o assunto o mais rápido possível.  Eles dizem que o colega só estava tentando agradar os prováveis eleitores nas primárias republicanas de 2016 –uma justificativa que, por alguma razão, deveria nos confortar.

Mas não devemos esquecer o assunto assim tão facilmente. Ler a entrevista de Rubio é como caminhar por dentro de um canyon muito erodido: você pode ver claramente o que está por baixo da superfície. Assim como as camadas de pedras falam dos tempos, a incapacidade dele em admitir as evidências científicas falam da mentalidade antirracional que está dominando seu partido político.

E por falar nisso, a pergunta não tinha saído do nada. Na função de presidente da Câmara da Flórida, Rubio forneceu uma ajuda poderosa aos criacionistas que tentavam aguar a educação científica. Em uma entrevista, ele comparou o ensino da evolução às táticas de doutrinação comunistas –apesar de ter, graciosamente, acrescentado que não estava “comparando o pessoal da evolução com Fidel Castro”. Puxa, legal.

Qual era a reclamação de Rubio quanto ao ensino de ciências? Que este poderia minar a fé das crianças no que seus pais diziam para acreditarem. E é exatamente esta a atitude moderna do Partido Republicano, não apenas em relação à biologia, mas em relação a tudo: se as evidências parecem contradizer a fé, suprima as evidências.

Além da evolução, o exemplo mais evidente é o da mudança climática provocada pelo homem. Enquanto as evidências para o aquecimento do planeta se tornam cada vez mais fortes –e mais assustadoras- o Partido Republicano fecha os olhos cada vez mais, afirmando que a coisa toda é uma enganação criada por uma enorme conspiração de cientistas. E essa negação tem sido acompanhada por esforços frenéticos para silenciar e punir todos que divulgam os fatos inconvenientes.

Mas o mesmo fenômeno é visível em outros campos. A demonstração mais recente aconteceu na questão das pesquisas eleitorais. Nessas últimas eleições, as pesquisas estaduais claramente apontavam para uma vitória de Obama –mas ainda assim quase todo o Partido Republicano se recusava a admitir essa realidade. Em vez disso, os analistas e políticos negaram ferozmente os números e pessoalmente atacaram todos que apontavam o óbvio; as críticas a Nate Silver do The Times, em particular, foram inacreditáveis.

Qual é a causa desse padrão de negação? No início deste ano, o autor científico Chris Mooney publicou “The Republican Brain” (O cérebro republicano) que não é, como se poderia pensar, um ensaio partidário. Em vez disso, ele faz uma análise das extensas pesquisas que associam as opiniões políticas aos tipos de personalidade. Como mostrou Mooney, o conservadorismo moderno americano é altamente correlacionado com inclinações autoritárias –e os autoritários são fortemente inclinados a rejeitarem quaisquer evidências que contradigam suas crenças. Os republicanos de hoje se protegem em uma realidade alternativa definida pela Fox News, por Rush Limbaugh e pelo editorial do “The Wall Street Journal”. Somente em raras ocasiões –como na noite das eleições- eles encontram alguma pista de que o que acreditam pode não ser verdade.

E não, o fenômeno não é simétrico. Os liberais, sendo humanos, muitas vezes cedem ao pensamento positivo –mas não da mesma forma sistemática e abrangente.

De volta à idade da Terra: e isso importa? Não, diz Rubio, chamando a questão de “uma discussão entre teólogos” –e os geólogos?- que “não tem nada a ver com o produto interno bruto ou o crescimento econômico dos Estados Unidos”. Mas ele não poderia estar mais errado.

Afinal, estamos vivendo em uma era na qual a ciência tem um papel econômico crucial. Como vamos pesquisar efetivamente os recursos naturais, se as escolas que tentam ensinar geologia moderna são obrigadas a dedicar a mesma quantidade de tempo para as alegações que o mundo tem apenas 6.000 anos de idade? Como vamos nos manter competitivos em biotecnologia, se as aulas de biologia evitam qualquer material que possa ofender os criacionistas?

E, depois, tem o uso das evidências para formatar a política econômica. Talvez você tenha lido sobre o recente estudo do Serviço de Pesquisa do Congresso que não encontrou base empírica alguma para o dogma que cortar os impostos para os ricos leva a um maior crescimento econômico. Como os republicanos reagiram? Suprimindo o relatório. Na economia, como nas ciências, os conservadores modernos não querem ouvir falar em nada que questione suas ideias preconcebidas –e eles não querem que ninguém outro ouça tampouco.

Então não deixe passar em branco o momento desconfortável de Rubio. Sua incapacidade de lidar com as evidências geológicas foi sintomática de um problema muito maior –que poderá, no final, colocar os EUA em um caminho de declínio inexorável.