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O partido insano

21/09/2013 00h01

No início deste ano, Bobby Jindal, governador da Louisiana [Estados Unidos], chegou às manchetes dizendo a seus colegas republicanos que eles precisavam deixar de ser o “partido tolo”. Infelizmente, Jindal não ofereceu sugestões construtivas sobre como eles poderiam fazer isso. E, nos meses que se seguiram, ele próprio passou a dizer e a fazer uma série de coisas que não eram, digamos, especialmente inteligentes.

Não obstante, os republicanos de fato seguiram o seu conselho. Nos últimos meses, o Partido Republicano parece ter deixado de ser um partido tolo para se tornar um partido insano.

Eu sei que estou sendo direto. Mas como está cada vez mais difícil ver como, em face da histeria republicana com a reforma da saúde, podemos evitar uma paralisação do governo -e, talvez, a perspectiva ainda mais assustadora de um calote da dívida- passamos da hora de eufemismos.

Eu acho que é útil entender como o clima político de hoje realmente é sem precedentes.

Em si, um governo dividido não é incomum –na verdade é mais comum do que o contrário. Desde a Segunda Guerra Mundial, houve 35 congressos, e em apenas 13 desses casos o partido do presidente controlou totalmente a legislatura.

Ainda assim, o Executivo continuou a funcionar. Na maior parte dos casos, o governo dividido levou a acordos, algumas vezes a um impasse. Ninguém sequer considerava a possibilidade de que um partido pudesse tentar realizar seus interesses de uma forma que não pelo processo constitucional, e sim por chantagem -ameaçando deixar o governo federal, e talvez toda a economia, de joelhos, a menos que suas exigências fossem atendidas.

É verdade que houve a paralisação do governo de 1995. Mas posteriormente isso foi considerado uma afronta e um erro. E esse confronto veio apenas depois de uma vitória republicana radical nas eleições, permitindo que o Partido Republicano alegasse ter o mandato popular para questionar o que ele imaginava ser um presidente deficiente e patinho feio.

Hoje, pelo contrário, os republicanos estão saindo de uma eleição em que não conseguiram retomar a presidência, apesar da economia fraca, não conseguiram retomar o Senado, embora muito mais assentos democráticos estivessem em risco, e só conseguiram manter o controle da Câmara por meio da manipulação das divisões das zonas eleitorais. Os democratas de fato ganharam a votação popular para a Câmara por 1,4 milhão de votos. Este não é um partido que, por qualquer padrão concebível de legitimidade, tem o direito de fazer exigências extremas ao presidente.

No entanto, no momento, parece altamente provável que o Partido Republicano se recusará a financiar o governo, forçando a uma parada no início do próximo mês, a menos que o presidente Barack Obama desmonte a reforma da saúde, que é a principal realização de sua presidência. Os líderes republicanos percebem que esta é uma má ideia. Até recentemente, eles pregavam a moderação exortando os radicais do partido a não deixarem o país refém do orçamento federal, mas que esperassem algumas semanas para mantê-lo refém do teto da dívida. Agora eles desistiram até dessa manobra de adiamento. A última novidade é que John Boehner, presidente da Câmara, abandonou seus esforços para promover um recuo que salve o orçamento, o que significa que está tudo pronto para fechar o governo, e depois ainda teremos a crise da dívida.

Como chegamos a este ponto?

Alguns especialistas insistem, mesmo agora, que de alguma forma isso é culpa de Obama. Afinal, por que ele não pode sentar e conversar com Boehner, como Ronald Reagan costumava fazer com Tip O'Neill? Mas O'Neill não liderava um partido cuja base exigia que ele fechasse o governo caso Reagan não revogasse seus cortes de impostos, e O'Neill não enfrentava um eleitorado preparado para depô-lo como presidente ao primeiro sinal de acordo.

Não, essa situação é obra do Partido Republicano. Primeiro veio a estratégia do Sul, na qual a elite republicana explorou cinicamente a questão racial para promover metas econômicas, principalmente os impostos baixos para pessoas ricas e a desregulamentação. Com o tempo, isso gradualmente se transformou no que poderíamos chamar de estratégia de louco, em que a elite passou a explorar a paranoia que sempre foi um fator na política americana -Hillary matou Vince Foster! Obama nasceu no Quênia!- para promover os mesmos objetivos.

Mas agora estamos em uma terceira fase, em que a elite perdeu o controle do monstro que criou.

Então, agora nós começamos a presenciar o espetáculo hilariante de Karl Rove no “The Wall Street Journal”, implorando para os republicanos reconhecerem que o Obamacare não pode ser des-financiado. Por que hilário? Porque Rove e seus colegas passaram décadas fazendo com que a base republicana vivesse em uma realidade alternativa definida por Rush Limbaugh e a Fox News. Podemos dizer que foram pegos na própria armadilha?

Claro que os próximos confrontos devem lesar os EUA como um todo, e não apenas a marca republicana. Mas, você sabe, esse momento da verdade ia acontecer mais cedo ou mais tarde. Podemos muito bem tê-lo agora.