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Altos índices de desemprego favorecem economia do medo

Paul Krugman

28/12/2013 00h01

Mais de 1 milhão de americanos desempregados estão prestes a receber o mais cruel dos "presentes" de Natal. Eles estão prestes a ter seus benefícios de desemprego cortados. Os republicanos no Congresso insistem que se uma pessoa não encontrou um emprego após meses procurando, é porque não deve ter tentado o bastante. De modo que ela precisa de um incentivo extra, na forma de puro desespero.

Consequentemente, o apuro dos desempregados, já terrível, está prestes a ficar ainda pior. Obviamente, aqueles que estão empregados estão em situação muito melhor. Mas a continuidade da fraqueza do mercado de trabalho também os atinge. Então vamos falar um pouco sobre o apuro dos empregados.

Algumas pessoas querem que você acredite que as relações de emprego são iguais a qualquer outra transação de mercado; os trabalhadores têm algo a vender, os empregadores querem comprar o que eles oferecem e eles simplesmente fecham um negócio. Mas qualquer pessoa que já teve um emprego no mundo real --ou ao menos leu uma tira de quadrinhos do "Dilbert"-- sabe que não é bem assim.

O fato é que o emprego geralmente envolve uma relação de poder. Você tem um chefe que lhe diz o que fazer, e se você se recusar, pode ser demitido. Isso não precisa ser ruim. Se os empregadores valorizarem seus funcionários, eles não farão exigências despropositadas. Mas não é uma transação simples. Há um clássico da música country intitulado "Take This Job and Shove It" ("Pegue esse emprego e enfie no...", em tradução livre). Não há e nem haverá uma canção intitulada "Pegue esse bem de consumo durável e enfie".

Logo, o emprego é uma relação de poder e o desemprego elevado enfraqueceu enormemente a posição já fraca dos trabalhadores nesse relacionamento.

Nós até podemos quantificar essa fraqueza analisando a taxa de pedidos de demissão --o percentual de trabalhadores que deixam voluntariamente seus empregos (em vez de serem demitidos) a cada mês. Pedir demissão é um risco; a menos que um trabalhador já tenha um novo emprego acertado, ele ou ela não sabe quanto tempo levará para encontrar um novo emprego e se esse emprego será melhor ou pior do que o anterior.

E o risco de pedir demissão é muito maior quando o desemprego é alto e há muito mais pessoas procurando emprego do que abertura de vagas de trabalho. Como resultado, você esperaria ver a taxa de pedidos de demissão crescer durante booms econômicos e cair durante recessões --e de fato é o que acontece. Os pedidos de demissão despencaram durante a recessão de 2007-2009 e se recuperaram apenas parcialmente, refletindo a fraqueza e inadequação de nossa recuperação econômica.

Agora pense no que isso significa para o poder de barganha dos trabalhadores. Quando a economia está forte, os trabalhadores ficam empoderados. Eles podem partir se estiverem descontentes com a forma como são tratados e sabem que podem encontrar rapidamente um novo emprego se estiverem livres. Mas quando a economia está fraca, os trabalhadores têm uma mão fraca e os empregadores ficam em posição de exigir que trabalhem mais, de pagar menos, ou ambos.

Há alguma evidência de que isso está acontecendo? E como. A recuperação econômica, como eu disse, é fraca e inadequada, mas todo o fardo dessa fraqueza está sendo carregado pelos trabalhadores. Os lucros das empresas despencaram durante a crise financeira, mas rapidamente se recuperaram e continuam subindo. De fato, a esta altura, o lucro líquido está mais de 60% maior do que em 2007, antes do início da recessão. Nós não sabemos quanto desse aumento do lucro pode ser explicado pelo fator medo --a capacidade de espremer os trabalhadores que sabem que não têm outra opção. Mas deve ser ao menos parcialmente a explicação. De fato, é possível (apesar de longe de certo) que os interesses das empresas sejam melhor atendidos em uma economia um tanto deprimida do que se tivéssemos pleno emprego.

Além disso, não acho que seja um exagero sugerir que essa realidade ajuda a explicar por que nosso sistema político deu as costas para os desempregados. Não, não acredito que haja uma cabala secreta de presidentes-executivos tramando para manter a economia fraca. Mas eu acho que um grande motivo para a redução do desemprego não ser uma prioridade política é que a economia pode estar ruim para os trabalhadores, mas a América corporativa vai muito bem, obrigado.

E assim que você entender isso, você também entenderá por que é tão importante mudar essas prioridades.

Ultimamente há um debate um tanto estranho entre os progressistas, com alguns argumentando que o populismo e as condenações à desigualdade são uma distração, que o pleno emprego deveria ser a prioridade. Como apontaram alguns importantes economistas progressistas, o pleno emprego é por si só uma questão populista: os mercados de trabalho fracos são o principal motivo para os trabalhadores estarem perdendo terreno, e o poder excessivo das empresas e dos ricos é o principal motivo para não estarmos fazendo nada a respeito do desemprego.

Americanos demais vivem em um clima de medo econômico. Há muitas medidas que podemos tomar para colocar um fim nesse estado das coisas, mas o mais importante é recolocar os empregos na agenda.