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Paulo Sampaio

Defesa do acusado de matar Tatiane Spitzner quer governador no julgamento

A advogada Tatiane Spitzner e o marido Luís Felipe Manvailler - Reprodução/Facebook
A advogada Tatiane Spitzner e o marido Luís Felipe Manvailler Imagem: Reprodução/Facebook

Colunista do UOL

13/09/2020 04h00Atualizada em 13/09/2020 21h21

A defesa do professor de biologia Luis Felipe Manvailer, acusado de matar a mulher, a advogada Tatiane Spitzner, em 22 de julho de 2018, pretende convocar o governador do Paraná, Carlos Roberto Massa Ratinho Jr. (PSD), para depor no plenário. O caso, de repercussão internacional, aconteceu em Guarapuava, cidade a 250 km de Curitiba.

O advogado Claudio Dalledone Jr. argumenta que a lei 19.873/2019, que instituiu 22 de julho como o Dia Estadual do Combate ao Feminicídio, pode sugestionar a opinião pública. De autoria da deputada Cristina Silvestre (Cidadania), a lei foi sancionada pelo governador Ratinho Jr. no ano passado.

"Se a lei é de combate ao feminicídio, em memória de Tatiane, no dia da morte dela, o que se deduz? Que Luis Felipe Manvailer cometeu feminicídio. É um prejulgamento. Como representante do povo, do povo que vai julgar o professor, o governador está influenciando os jurados", acredita Dalledone, que cita o "ineditismo" da convocação de um governador na Justiça, nessas circunstâncias.

Caso consiga a presença de Ratinho Jr. no tribunal, Dalledone diz que "o governador vai ter de dizer onde ele estava na cena; qual a sua participação no inquérito, e o quanto é investigador para apontar que Luis Felipe Manvailler é autor de feminicídio".

Agressões e queda

Tatiane caiu do 4º andar do edifício onde o casal morava, no centro de Guarapuava, na volta da comemoração do aniversário de 31 anos do marido, em um bar da cidade. Câmeras de segurança do condomínio registraram Manvailer agredindo a mulher no elevador, depois recolhendo o corpo dela na calçada e, por fim, limpando as marcas de sangue. Tatiane tinha 29 anos.

Para a acusação, Manvailer atirou a mulher da sacada. A defesa sustenta que ela se jogou. O professor foi preso ainda na madrugada de 22 de julho, depois de bater o carro na BR-277, em São Miguel do Iguaçu. Estava a 340 quilômetros de Guarapuava, no sentido do Paraguai.

Exclusão de qualificadoras

Na ocasião do crime, a juíza Paola Gonçalves Mancini, da 2a. Vara Criminal de Guarapuava, aceitou a denúncia do Ministério Público contra Manvailer, que se tornou réu pelos crimes de cárcere privado (impedir a fuga da vítima); homicídio quadruplamente qualificado (motivo fútil, meio cruel, recurso que dificultou a defesa da vítima e feminicídio); e fraude processual (remoção do corpo da vítima e alteração da cena do crime).

Em janeiro, por unanimidade, três desembargadores da 1a. Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) excluíram duas qualificadoras — "motivo fútil" e "recurso que dificultou a defesa da vítima". De acordo com trecho da decisão, "impõe-se a exclusão do motivo fútil, pois o homicídio foi precedido de animosidade e sério atrito envolvendo as partes, antecedentes que não podem ser considerados como insignificantes e banais".

Palavra do governador

Procurado pela coluna, o governador Ratinho Jr. encaminhou nota por intermédio de sua assessoria: "Não compete ao Governo do Estado nominar ou modificar o nome de nenhuma lei de iniciativa do Poder Legislativo, e sim avaliar o mérito da proposta, para a sanção da mesma. A Lei nº 19.873/2019, elaborada pelo parlamento estadual, foi sancionada por apresentar a proposição de ampliar o debate sobre a questão da violência contra mulher, especialmente na rede estadual de ensino".

Consultado a respeito do suposto "ineditismo" da convocação de um governador no plenário e sobre a possibilidade de a juíza considerar a presença de Ratinho Jr. no julgamento, o TJ-PR informou à coluna que "não emite opinião sobre as testemunhas ou informantes que a defesa tenha interesse em arrolar. Todas as manifestações da Justiça ocorrem nos autos".

A respeito da eventual influência sobre o júri do Dia Estadual de Combate ao Feminicídio e que tipo de providência a juíza poderia tomar para evitar o comprometimento do julgamento, o TR informou: "A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN) proíbe o magistrado de manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obrar técnicas ou no exercício do magistério. (Art. 36, III, da LOMAN)"

O julgamento ainda não tem data marcada. No último dia 17 de julho, a juíza Paola Gonçalves encaminhou ofício à 1ª Vara Criminal e ao Tribunal do Júri determinando urgência no agendamento.

"Acusação tem medo"

Dalledone diz não temer o julgamento: "Estamos tão seguros da inocência do meu cliente que queremos o júri." O advogado acredita que a acusação "está com medo do júri, e foge como o diabo da cruz". "Não é confortável para eles dizer a quantas anda esse processo", acha.

O TR-PR informa que ainda não julgou um pedido de "desaforamento" do processo (transferência do julgamento para uma cidade distante de onde o caso ocorreu), feito pela defesa. Nesses pedidos, em geral, alega-se que o "clamor social" na cidade onde tudo aconteceu pode influenciar o júri.

Por sua vez, a acusação costuma ver no pedido um modo de adiar o julgamento (e ganhar tempo) e de submeter o réu a um júri que não tem tanta informação sobre o caso.

O promotor Pedro Henrique Brazão Papaiz não quis comentar as afirmações da defesa. Procurado pela coluna, o assistente de acusação, Gustavo Scandelari, não respondeu às ligações.