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"Temos medo que o controlador vire bode expiatório", diz mulher de vítima do acidente da Gol

Guilherme Balza

Do UOL Notícias <BR> Em São Paulo

26/10/2010 21h32

A condenação na Justiça Militar do controlador de voo Jomarcelo Fernandes dos Santos a 1 ano e 2 meses de prisão pelo acidente da Gol que matou 154 pessoas em setembro de 2006 surpreendeu a Associação de Familiares e Amigos das Vítimas do Voo 1907.  Rosane Amorim Gutjahr, 52, que integra o grupo e perdeu o marido, Rolf Gutjahr, no acidente, disse que o controlador não pode virar bode expiatório e que os pilotos norteamericanos do Legacy também devem ser punidos.

“A gente não está entendendo muito o que foi esse julgamento. Pegou todo mundo de surpresa”, diz. “Ficamos com medo de que usem o controlador, que tem apenas uma parcela de responsabilidade, de bode expiatório e os verdadeiros culpados [os pilotos Jan Paladino e Joseph Lepore] fiquem impunes”, afirmou.

O controlador foi condenado nesta terça-feira (26) por homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Foram absolvidos os outros quatro controladores --João Batista da Silva, Felipe Santos Reis, Lucivando Tibúrcio de Alencar e Leandro José Santos de Barros.

Santos trabalhava no dia do acidente no Cindacta I, de Brasília. De acordo com a acusação, ele teve uma conduta negligente, deixou de observar normas de segurança, dando causa direta à colisão entre as duas aeronaves.

Conforme a denúncia, ele não atentou para o desaparecimento do sinal do transponder do Legacy (o equipamento anticolisão que avisa os pilotos sobre a possibilidade de choque no ar), não orientou o piloto quanto a uma mudança de frequência, não deu importância ao nível de altimetria na aerovia e passou o serviço a outro militar sem alertá-lo sobre as irregularidades.

Santos não quis dar entrevista após ouvir a sentença de condenação imposta por 4 votos a 1 pela auditoria da 11ª Circunscrição Judiciária Militar, em Brasília. O advogado dele, Roberto Sobral, afirmou que vai recorrer da decisão ao Superior Tribunal Militar (STM) e, se necessário, ao Supremo Tribunal Federal (STF). Ele disse que seu cliente não tinha nível de proficiência em inglês para orientar um piloto estrangeiro, como no caso.

Segundo Sobral, o militar está afastado e se for condenado definitivamente terá direito ao sursis, que é a suspensão da execução da pena. "A condenação é inaceitável", afirmou o advogado. "Não foi permitido provar que ele não fala inglês e estava obrigado a sentar em um console para coordenar voo de pilotos estrangeiros", disse.

A assessoria jurídica da associação dos familiares das vítimas teme que a decisão atrapalhe o andamento do processo que está sendo julgado na Justiça Federal de Sinop (MT). O argumento é que a decisão permite que a defesa do controlador e o Ministério Público Federal (MPF) aleguem que houve “conflito de competência”, ou seja, que decisão na esfera militar entre em conflito com a decisão na Justiça comum.

Em setembro desse ano, ao julgar uma liminar da defesa dos controladores que solicitava o arquivamento da ação na esfera militar, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa julgou que a Justiça Militar decidiria sobre questões militares internas e que a Justiça Federal sobre questões comuns.

Caso alguma parte entre com ação no STF alegando conflito de competência, o processo civil pode retardar e até prescrever, já que perde sua validade a partir de junho do ano que vem.

Theo Dias, advogado dos pilotos do Legacy, retira a responsabilidade dos seus clientes e culpa os controladores pelo acidente. “O relatório [do Cenipa] diz claramente que a autorização de voo dada aos pilotos estava errada. Ela deveria ser segmentada, por partes, mas, como não foi, induziu os pilotos ao erro”, afirma.

*Com informações da Agência Estado