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Atraso torna mapeamento das áreas de risco de SP ineficiente, dizem especialistas

Fabiana Uchinaka<br> Do UOL Notícias

Em São Paulo

12/01/2011 07h00

O mapeamento das áreas de risco está desatualizado e atrasado, não foram feitas ações preventivas ou emergenciais, a dinâmica de ocupação das várzeas e de impermeabilização do solo continua a mesma e as encostas permanecem sem monitoramento. Esta é a situação na qual se encontra a cidade de São Paulo no auge de mais uma temporada de chuvas, na opinião do professor Edílson Pissato, da Faculdade de Geociências da USP (Universidade de São Paulo), especialista em geologia de engenharia. 

“O levantamento dos pontos críticos deveria estar pronto um junho, quando ainda daria tempo de tomar providências preventivas. Ou até novembro, quando daria para colocar em prática ações emergenciais. Agora não dá mais tempo”, ressalta.

No final do ano passado e no começo deste ano, foram inúmeros os casos de enchentes, transbordamentos de rios e córregos, deslizamentos de terra sobre casas e desabamentos de encostas provocados por chuvas na cidade. Na noite de segunda-feira (10) e madrugada de terça, os desastres voltaram a atingir a capital e colocar em risco centenas de famílias.

A prefeitura promete desde dezembro divulgar um estudo do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) com o mapeamento das áreas de risco, mas até o momento ele não foi apresentado. Segundo o governo municipal, o relatório está sendo analisado por técnicos da prefeitura e deve sair na próxima semana, junto com propostas de ações para resolver o problema.

Pissato chama a atenção para o fato de que, mais uma vez, o município não está preparado para as chuvas de verão, segundo ele, “por falta de interesse e de uma ação política para atuar e resolver”.

“Eu sei que os problemas são complicados, mas eles acontecem há muitos anos, há mais de 20 anos. E a época de chuva é a mesma todos os anos. Se medidas preventivas tivessem sido tomadas ao longo dos anos, todos os anos, grande parte das 400 áreas de risco da cidade estaria solucionada”, diz.

De acordo com ele, em cinco anos já daria para diminuir bastante os problemas decorrentes dos temporais. Para isso, seriam necessários investimentos na remoção dos moradores que ocupam áreas inundáveis ou sujeitas a deslizamentos e na reurbanização dessas localidades --com obras de contenção e estruturais, moradias adequadas ou com parques, quando as condições geológicas não permitirem a ocupação.

“O que acontece é que há um desleixo em relação à prevenção. Os problemas são deixados de lado quando a chuva não é tão forte e aparecem quando vêm os temporais. Mas a chuva forte sempre ocorre, cedo ou tarde. Se a atualização fosse constante, os deslizamentos não aconteceriam”, analisa o especialista.

Além disso, ressalta ele, é preciso um monitoramento constante das áreas de risco, porque elas mudam todos os anos, por conta de erosões e ocupações, por exemplo. Segundo Pissato, esse acompanhamento na maioria das encostas está abandonado.

“As enchentes também vão continuar acontecendo, porque não mudou a forma de ocupação da cidade: há impermeabilização do solo e ocupação das várzeas. As grandes avenidas em São Paulo ficam ao longo dos rios e impedem o escoamento da água, que enche os córregos”, enfatiza.

Controle da ocupação é falho

O urbanista Kazuo Nakano, especialista em gestão urbana e ambiental do Instituto Pólis, concorda que a adoção de medidas preventivas e emergenciais na cidade é falha e reflete um problema de gestão. Segundo ele, o mapeamento prometido pela prefeitura não evitaria que os incidentes provocados pela chuva fossem evitados.

“Ele serve para orientar as ações e os investimentos no curto, médio e longo prazo, mas não resolve os problemas de agora”, reforça. “Nós temos uma gestão pública da cidade muito limitada. São necessárias várias ações e a gente não vê muitos avanços. Além das ações imediatas --como a manutenção das galerias pluviais, o desassoreamento e a limpeza dos córregos para evitar entupimentos--, as ações de prevenção também são falhas, o controle urbano é falho”, diz.

Para Nakano, é preciso evitar que surjam bairros em áreas de risco. A ocupação irregular, ressalta ele, é consequência, principalmente, da falta de uma política pública capaz de dar apoio às pessoas que não têm dinheiro para alugar ou comprar uma moradia em um local seguro.

Além disso, a cidade precisa combater a ocupação inadequada de pontos ao longo dos rios, que, segundo o especialista, provoca alagamentos em outros pontos da capital, inclusive nos bairros onde não há ocupação irregular.

“No longo prazo, é preciso repensar os piscinões, porque do jeito que está são inadequados do pontos de vista urbanístico. Eles desvalorizaram a área onde são instalados e viram local de acúmulo de lixo e mosquitos. Em outras cidades do mundo, as áreas de retenção são parques, áreas permeáveis. Isso deveria ser feito aqui”, completou.

Outro lado

A prefeitura informou que os investimentos em obras de drenagem e na manutenção do sistema foram ampliados --de R$ 309 milhões, em 2009, para R$ 420 milhões previstos em 2010, mas apenas R$ 280 milhões foram empenhados.

No ano passado, foram feitas 26 obras no sistema de drenagem, que é composto por 19 piscinões, 400 mil bocas de lobo, 57 mil poços de visitas, 2.850 km de galerias e ramais e 281 córregos. Entre as intervenções estão o dique e o canal de escoamento na região do Jardim Romano, na zona leste, área que sofreu durante meses com os alagamentos do ano passado.

Para evitar alagamentos, a prefeitura afirma que usa 116 bombas --56 nos túneis e passagens, 30 nos piscinões, 26 em diques nas pontes e quatro na estação de bombeamento Eng. Eduardo Yassuda. “Todas as bombas passam por manutenção preventiva continuamente”, disse o governo, em nota.

Em 2010, a prefeitura diz que foram iniciadas 65 obras em áreas de risco, sendo que 23 foram concluídas. Seis mil famílias foram retiradas desses locais. Essas áreas são mapeadas pelo Sistema de Informações para Habitação Social.

Para aumentar a permeabilização do solo, estão previstos 20 novos parques, completa o governo municipal.