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Paralisação de aeroportuários não provoca aumento nos atrasos e cancelamentos de voos

Do UOL Notícias*

Em São Paulo

20/10/2011 14h15Atualizada em 20/10/2011 19h14

A greve por 48 horas dos aeroportuários que trabalham nos aeroportos de Guarulhos (Grande SP), Viracopos (Campinas-SP) e Brasília começou nesta quinta (20) sem número significativo de atrasos ou cancelamentos de voos.

Segundo o boletim das 20h publicado pela Infraero (estatal que administra os aeroportos), o total de voos atrasados em mais de meia hora no país, entre 0h e 20h de hoje, era de 161, ou 6,8% dos 1.812 programados; os cancelados são 82 (3,5%).

Em Brasília, os atrasados são 6.4 %: 11 de 173 programados. Os cancelados são 10 (5,8%). Em Guarulhos, são 22 voos atrasados (10,4%) e seis cancelados (2,8%), de 212 programados até o momento. Em Campinas, apenas dois atrasaram (1,9%) e três foram cancelados (2,9%) em 105 voos.

Os aeroportuários cruzarão os braços hoje (20) e amanhã (21) contra a privatização dos três terminais, que começarão a ser entregues à iniciativa privada até o início de 2012. "Nosso objetivo é só chamar atenção", diz Francisco Lemos, presidente do Sindicato Nacional dos Aeroportuários (Sina). Segundo Lemos, o impacto para o passageiro deve ser sentido apenas no período da tarde.

Greve dos aeroportuários tem pouco efeito em Cumbica

Ainda segundo Lemos, as pessoas estão "liberadas para trabalhar" no setor de operações aéreas e nas atividades do terminal de cargas que envolvem produtos perecíveis e medicamentos.

O sindicato levou um carro de som ao aeroporto internacional de Guarulhos, logo cedo, para incentivar a participação dos trabalhadores da área operacional –que soma cerca de 1.500 pessoas. Segundo Lemos, 80% do quadro aderiu na madrugada. Apesar disso, os funcionários envolvidos no andamento de cargas perecíveis e no setor de navegação aérea foram liberados. “Queremos chamar a atenção para o risco na segurança aeroportuária com a privatização, mas não queremos radicalizar”, disse.

Entre aqueles que decidiram não trabalhar nesta quinta-feira (20), nem todos são contrários à privatização dos aeroportos de Brasília, Viracopos e Guarulhos. Jeannie Sanches, 44, trabalha no terminal de cargas e é funcionária de Cumbica há 23 anos. A preocupação dela é perder a estabilidade no emprego, com a possível terceirização de serviços. “Não sou contra a privatização, acho que, se a engrenagem do governo não está dando conta, é preciso melhorar essa engrenagem e a privatização pode ajudar. Mas as pessoas que trabalham aqui precisam ter a situação avaliada, temos direito à estabilidade.”

A privatização na avaliação dos grevistas

- É comparável ao abandono do sistema ferroviário na década de 50

- As tarifas de embarque irão subir, o que provocará o aumento das passagens e a elitização dos aeroportos

- Irá piorar os serviços aeroportuários, o que aumentará a vulnerabilidade da segurança operacional e de voo

- Foi decidida com base em estudos acadêmicos sem aplicação prática
 

Nas áreas de embarque e desembarque do aeroporto, a greve praticamente não foi notada pelas pessoas que usaram os terminais. Muitas disseram que não sabiam da paralisação e que não tiveram problemas para retirar bagagens, por exemplo.

Acostumado a trabalhar em Cumbica diariamente no transporte de passageiros, Sandro Lopez Orellana, 42, teve uma manhã tranquila. “Teve voo que até chegou mais cedo”, afirma.

Entenda a paralisação

A concessão dos terminais à iniciativa privada, que já vinha sendo estudada no governo Lula, foi decisão da presidente Dilma Rousseff. De olho na Copa de 2014 e nas Olimpíadas de 2016, o governo alega que as concessionárias têm mais capacidade de realizar investimentos para ampliar a capacidade dos aeroportos e evitar um novo caos aéreo.

"A segurança dos aeroportos ficará em segundo plano com a privatização", diz Lemos, que cita o aeroporto de Buenos Aires como mau exemplo do que pode acontecer.

O Sina é filiado à CUT (Central Única dos Trabalhadores), que está dando apoio integral na mobilização da categoria contra a privatização dos aeroportos. Os principais dirigentes da central, inclusive, participaram de protestos recentes nos aeroportos.

Em um deles, no último dia 7, em Guarulhos, os manifestantes entoaram palavras de ordem contra a presidente. “Dilma, eu não me engano, privatização é coisa de tucano” ou “Dilma, eu não entendo, o nosso patrimônio, você está vendendo”, foram alguns dos slogans cantados.

Além de Dilma, o ministro da Defesa, Celso Amorim, é do PT, aliado histórico da CUT e sigla a qual os principais dirigentes cutistas estão filiados. Nas últimas eleições presidenciais, a CUT declarou apoio à Dilma e puxou outras quatro centrais para a campanha (Força Sindical, CTB, Nova Central e CGTB).

Nos documentos e manifestos contra a privatização, tanto o Sina, quanto a CUT poupam Dilma e o novo ministro da Defesa, Celso Amorim, que não costumam ser citados. As críticas das entidades recaem principalmente sobre o ex-ministro Nelson Jobim e a presidente da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Solange Vieira, apontados como os responsáveis pela privatização.

Para o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, a paralisação não se justifica, já que, segundo ele, o processo de privatização está sendo transparente.

“É uma questão sensível, mas acreditamos na responsabilidade dos funcionários. Temos participado de reuniões desde o início, formando mesas de diálogo com eles e mostrado que ninguém será prejudicado. Por isso, na avaliação do governo, e tendo por base a transparência e a mesa [de diálogo] criada, não se justifica uma greve", afirmou.

Modelo de concessão

A privatização dos aeroportos será feita no modelo de concessão, no qual todas as funções hoje sob responsabilidade da Infraero passarão para o comando de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), formada por investidores privados e pela própria estatal. Enquanto as empresas privadas terão no mínimo 51% das ações da sociedade, a Infraero terá no máximo 49%.

Os editais de licitação já foram publicados e ficarão sob consulta pública até o final do mês. O leilão deve ocorrer entre dezembro e janeiro. O valor mais alto de concessão será o do aeroporto de Guarulhos --R$ 2,9 bilhões, por 20 anos. Viracopos será concedido por, no mínimo, R$ 521 milhões, com prazo de 30 anos de concessão. Brasília terá o menor valor, de R$ 75 milhões, por 25 anos de contrato.

O concessionário de Guarulhos deverá pagar ao governo 10% de sua receita bruta todos os anos. Quem vencer o leilão de Viracopos precisará entregar 5%. Em Brasília, o valor de contribuição foi definido em 2%.

Além dos três terminais, o Aeroporto de São Gonçalo do Amarante, que está sendo construído na região metropolitana de Natal, foi privatizado em agosto. O governo também estuda transferir para o setor privado a exploração de outros aeroportos internacionais, como Galeão-Tom Jobim, no Rio de Janeiro, e Confins, em Minas Gerais.

Críticas à privatização

O Sina afirma que a privatização dos aeroportos é um erro comparável ao abandono do sistema ferroviário a partir da década de 50 e foi decidido com base em estudos acadêmicos sem aplicação prática. O sindicato acredita que as tarifas de embarque irão subir, o que provocará o aumento das passagens e a elitização dos aeroportos.

A privatização, na avaliação do Sina, irá ainda piorar os serviços aeroportuários, o que aumentará a vulnerabilidade da segurança operacional e de voo, na medida em que os novos profissionais não tem a qualificação dos servidores da Infraero.

A proposta dos sindicalistas ante a privatização é explorar comercialmente os espaços dos aeroportos, transformando-os em algo semelhante a shoppings centers. O argumento é que, nos últimos oito anos, o número de passageiros aumentou em mais de 110%, mas não houve aproveitamento das possibilidades comerciais, que poderiam gerar lucros à Infraero superiores ao que será pago pela iniciativa privada.

A reportagem procurou a secretaria de Aviação Civil para comentar as críticas, mas o órgão disse que não irá se manifestar por enquanto.

* Com informações de Gabriela Fujita e Guilherme Balza, do UOL Notícias, da Agência Brasil e do Valor Online