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Ficha criminal de 1940 contra Lampião e seu bando é encontrada no RN

Na ficha encontrada, não há o nome da companheira de Lampião, Maria Bonita - Divulgação/Itep
Na ficha encontrada, não há o nome da companheira de Lampião, Maria Bonita Imagem: Divulgação/Itep

Aliny Gama

Colaboração para o UOL, em Maceió

23/11/2016 17h37

Um prontuário criminal de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e seu bando, datado de 1940, foi encontrado na última semana no arquivo do Itep (Instituto Técnico-Científico de Polícia) do Rio Grande do Norte.

Engavetado há quase oito décadas, o documento foi encontrado há duas semanas e faz parte de um dos três processos contra o bando de cangaceiros mais temido do Nordeste da década de 1930. Lampião e seu bando invadiram as cidades de Mossoró, Martins e Pau dos Ferros, no ano de 1927, e após essa invasão três processos foram instaurados. 

O prontuário é datado de dois anos após a morte de Lampião, ocorrida em 1938, mas o Itep atesta sua veracidade. O prontuário é parte de uma peça criminal instaurada em 1927, no qual consta a identificação de Lampião e mais 55 integrantes do grupo. Foi encontrado nos arquivos criminais do Itep e estava misturado com outros que não possuem valor histórico.

Na ficha, não há o nome da companheira de Lampião, Maria Bonita. O órgão, desde aquela época, detinha as fichas criminais de acusados de crimes no Estado, como também os primeiros registros de identificação de moradores e já fazia exames de corpo de delito e necropsia. 

De acordo com o chefe de gabinete do Itep-RN, Thiago Tadeu Santos de Araújo, foi neste documento que Lampião e seu bando foram incluídos no cadastro criminal do Estado.

“O documento consta o número 2261, que sugere ser a página do processo. O prontuário criminal de Lampião estava como um documento comum, no arquivo criminal, mas, devido ao seu valor cultural, já separamos e guardamos em outro local”, explica Araújo. “Vamos também digitalizá-lo.”

Lampião - Domínio Público - Domínio Público
O temido cangaceiro Lampião
Imagem: Domínio Público
Futuro museu

Pesquisador das histórias da Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e outros órgãos de segurança pública do Estado do Rio Grande do Norte, o coronel Angelo Dantas também diz que o prontuário é parte de peça criminal do processo aberto na comarca de Pau dos Ferros. Dantas estuda há mais de 15 anos o resgate da história de segurança pública e possui acervo de fatos históricos que ocorreram no Estado.
 
"Descobrimos que em 1936 houve uma nova legislação vigente e foi implantado um sistema de identificação criminal. Essa peça, certamente veio da comarca para o Itep com esse novo sistema para identificação dos réus no processo da comarca de Pau dos Ferros. Lá, um soldado foi assassinado pelo bando, que também cometeu roubos e furtos. Como nessa época tudo era difícil, pode-se explicar a demora desse documento ter chegado ao Itep", explica.
 
Segundo Dantas, as pesquisas apontaram também que existe a certidão do oficial de Justiça cumprindo a ordem do juiz de prender Lampião. "Por ser um cangaceiro temido e ágil, que fugia rápido após os crimes, o oficial relatou no cartório que percorreu o município de Vitória, atualmente Marcelino Vieira, onde estava o distrito de Pau dos Ferros e não achou o bando."

No documento, Lampião e seu bando foram enquadrados no artigo 294, parágrafo 1º (assassinato), e no artigo 356 (roubo) do Código Penal brasileiro de 1890.

“Os artigos que ele e seu bando foram enquadrados equivalem ao artigo 121, que é matar alguém, e artigo 157, que é subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça, dispostos no código penal atual [que é de 1940]”, explica Araújo.

Lampião 2 - Eduardo Vessoni/UOL - Eduardo Vessoni/UOL
Vista do rio São Francisco, entre Sergipe e Alagoas, uma das vias de acesso ao local onde Lampião e seu bando foram mortos
Imagem: Eduardo Vessoni/UOL
O achado fará parte de uma sala-museu do Itep-RN que deverá ser criada em breve. Além do documento, constarão máquinas fotográficas antigas, material usado em necropsias, documentos das primeiras pessoas civis identificadas no Rio Grande do Norte e fotos, entre outros. 

Segundo Dantas, Lampião ficou quatro dias no Rio Grande do Norte e, “por onde passou, só deixou desgraça”. Em 1927, segundo Dantas, o bando chegou à região oeste do Estado e invadiu a cidade de Mossoró, porém o então prefeito, Rodolfo Fernandes, e os moradores defenderam o município. 

Lampião nasceu em Pernambuco e era filho de um proprietário rural. Sua fama de cangaceiro começou quando ele foi acusado de roubar bodes de outra propriedade. Em 28 de julho de 1938, Lampião e parte do seu bando foram assassinados na fazenda de Angicos, no sertão de Sergipe, vítimas de uma emboscada armada por soldados de Alagoas.