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Criado como PPP, Porto Maravilha 'encalha', e cofres públicos assumem custos

Museu do Amanhã, atração turística que integra o complexo Porto Maravilha, no Rio - Wikipedia
Museu do Amanhã, atração turística que integra o complexo Porto Maravilha, no Rio Imagem: Wikipedia

Venceslau Borlina Filho

Do UOL, em São Paulo

07/07/2017 04h00

Implantado sob o discurso de ser uma obra sem aporte de dinheiro público, o Porto Maravilha --projeto de revitalização da região portuária do Rio de Janeiro-- agora vai passar a gerar despesas ainda não dimensionadas pelo governo do prefeito Marcelo Crivella (PRB).

O motivo é a suspensão nesta quarta (5) dos serviços de limpeza e manutenção pela concessionária Porto Novo, que alega falta de pagamento pela prefeitura. Segundo o consórcio, a dívida acumulada desde janeiro deste ano soma R$ 78 milhões.

Na quarta-feira, servidores da Comlurb, da Secretaria Municipal de Conservação e Meio Ambiente e da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) já começaram os serviços --limpeza, coleta de lixo, conservação de áreas verdes, iluminação, viário, semáforos e outros-- no local.

Apesar de reconhecer sua corresponsabilidade na PPP (parceria público-privada) do Porto Maravilha, a Prefeitura do Rio, por meio da CDURP (Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto), afirma que a dívida é da Caixa Econômica Federal. A Caixa nega ter dívidas.

O presidente da CDURP, Antonio Carlos Mendes Barbosa, disse que todos os gastos não previstos com a suspensão dos serviços serão cobrados da Caixa. “Mandei fazer [a soma dos gastos] na ponta do lápis”, disse. “Até a próxima semana terei uma previsão”, completou.

Por meio da assessoria, a Caixa informou que o fundo de investimento gerido pelo banco para as ações no Porto Maravilha está “integralmente adimplente” com as obrigações da licitação e que mantém agendas diárias com os participantes do projeto.

Segundo a prefeitura, apenas a operação dos dois túneis locais --Marcello Alencar e Rio450-- e o controle de macrodrenagem das obras estão mantidos pela Porto Novo, pelo prazo de seis meses. Depois disso, concessionária e prefeitura não sabem o que poderá acontecer.

O Porto Maravilha é um complexo de 5 milhões de metros quadrados onde está, por exemplo, o Museu do Amanhã --um dos pontos turísticos mais visitados do Rio. O projeto nasceu para ser uma das principais atrações da Olimpíada. Ao todo, já foram investidos R$ 7,6 bilhões.

A PPP foi assinada em 2011, com prazo de vigência de 15 anos. Os títulos imobiliários, chamados de Cepacs (Certificados de Potencial Adicional Construtivo) são negociados pelo fundo gerido pela Caixa. Todo o dinheiro é destinado às obras do Porto Maravilha.

A implantação do complexo é alvo de investigação na Lava Jato. O consórcio é formado pelas empresas Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia. Delatores afirmaram que tiveram que pagar propina de R$ 52 milhões ao ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para ter recursos da Caixa liberados para as obras.

Imbróglio

O imbróglio que resultou na suspensão dos serviços começou, de acordo com a CDURP, em maio do ano passado, quando a Caixa declarou que não estava mais vendendo os títulos imobiliários na região, que permitem que construções ultrapassem as regras atuais.

Em 28 de dezembro de 2016, no apagar das luzes da gestão do ex-prefeito Eduardo Paes (PMDB), a Prefeitura do Rio fez um aditivo ao contrato da PPP colocando a CDURP como responsável pelos pagamentos à concessionária, e não mais a Caixa.

O prefeito Marcelo Crivella, após assumir o governo em janeiro deste ano, considerou a operação nula. Segundo Barbosa, mesmo que a prefeitura fosse adiante, os pagamentos não seriam possíveis, uma vez que não existem recursos destinados no Orçamento.

“A Caixa declarou iliquidez e o artifício que a prefeitura fez foi capitalizar a CDURP, o que é um ato nulo primeiro porque transferiu essa responsabilidade para uma outra gestão e, segundo, porque não existem recursos destinados para isso”, disse o presidente da companhia.

Marcus Pessanha, advogado especialista em infraestrutura e direito constitucional, afirmou que a situação envolvendo a Porto Novo, a prefeitura e a Caixa é “juridicamente bem delicada” e demonstra certo “grau de incapacidade”.

“O grande problema dessa PPP é que ela pode causar prejuízo público, tanto pelos gastos dos cofres públicos quanto aos frequentadores. Não pode pegar o contrato e engavetar. É preciso apurar as responsabilidades, respeitar as regras do contrato”, afirmou Pessanha.

Outro lado

Em nota, a CDURP informou que assumirá os serviços provisoriamente e que negocia com a Caixa uma solução para o caso. Já o banco culpou a crise pela situação, “restando apenas um melhor momento de mercado para início de obras ou lançamento”.

A concessionária Porto Novo informou em nota que os repasses da prefeitura são a única fonte de recursos para as obras e serviços no Porto Maravilha e que a decisão foi motivada pelo não pagamento e pela indefinição a respeito da regularização dos débitos.