Crime envolvendo família do prefeito manauara tem 2 versões, ambas em xeque
Resumo da notícia
- No fim de setembro, um engenheiro foi achado morto na periferia de Manaus
- Ele participou, horas antes, de festa na casa do enteado do prefeito da cidade
- O prefeito deu uma versão para o crime que foi desmontada pelas investigações
Um assassinato no entorno de Arthur Virgílio Neto (PSDB), prefeito de Manaus, ocorrido há 20 dias, já teve duas versões, uma delas apresentada pelo político 24 horas após o crime, e nenhuma delas convenceu até agora a Polícia Civil do Amazonas.
O caso envolveu um carro oficial da prefeitura e um policial militar que trabalhava para o prefeito e foi exonerado após o crime. O inquérito já dura 17 dias, e até agora há mais dúvidas do que respostas sobre a morte do engenheiro Flávio Rodrigues, 41, visto vivo pela última vez entrando na casa de Alejandro Valeiko, 29, enteado do tucano.
A primeira-dama de Manaus, Elizabeth Valeiko, recebeu duas intimações para depor na DEHS (Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros), e faltou às duas.
Entenda o caso:
O crime
O engenheiro Flávio Rodrigues foi a uma festa na casa de Alejandro Valeiko, num condomínio de luxo no bairro de Ponta Negra, na noite de domingo, dia 29 de setembro.
No dia seguinte, o corpo de Flávio foi encontrado numa estrada de barro na periferia de Manaus com seis perfurações de faca: duas nas pernas, duas nas costas e duas na barriga.
Segundo as testemunhas e os próprios investigados, em depoimento à polícia, a reunião na casa de Alejandro foi regada a álcool e cocaína e terminou em confusão.
Após a briga, um carro da prefeitura dirigido por Elizeu da Paz, PM que fazia a segurança de Arthur Virgílio Neto, entrou no condomínio. Ao seu lado, um amigo do segurança, Mayc Vinícius Teixeira Parede. Eles entraram o condomínio e permaneceram no local por cerca de 13 minutos.
Na entrada, Mayc estava ao lado de Elizeu. Na saída, nos vídeos do condomínio apreendidos pela polícia como parte da investigação, ele estava no banco de trás. A polícia suspeita que, na saída, o corpo de Flávio estava sendo retirado do local, no carro da Prefeitura de Manaus.
Versão 1: prefeito falou em ação do tráfico
A primeira versão para o crime, apresentada pelo prefeito, era que a casa do enteado havia sido invadida por membros de facção criminosa que cobravam do engenheiro Flávio Rodrigues uma dívida de tráfico de drogas. Ele disse que Alejandro e os demais presentes na casa também foram vítimas.
A polícia suspeitou da versão: por que teriam matado apenas o engenheiro, deixando as demais testemunhas vivas? Além disso, não há registros de cobranças do tráfico com facadas — normalmente, os envolvidos são mortos por arma de fogo ou até decapitações.
A versão foi desmontada pela apuração da polícia no mesmo dia, e a família do engenheiro morto procurou a mídia para criticar a postura do prefeito.
Versão 2: um participante da festa confessou o crime
A segunda versão para o crime foi dada por Mayc, o "carona" do segurança do prefeito.
Mayc isentou os demais presentes na festa, incluindo o enteado de Arthur Virgílio Neto.
No mesmo depoimento, Mayc disse não conhecer nenhum dos homens que estavam na festa de Alejandro antes do dia do crime e pediu perdão à sua família, à família da vítima e à sociedade de Manaus.
Nesta segunda, a defesa de Mayc protocolou um pedido de transferência da delegacia para um presídio de Manaus e afirmou que ele não vai contribuir com diligências e acareações porque a polícia não quer acreditar que ele é culpado e os demais inocentes.
A defesa do enteado do prefeito tomou medidas no sentido inverso, evitando que Alejandro, que cumpre prisão temporária por 30 dias, fosse preso no sistema prisional.
Polícia duvida de confissão
O delegado da DEHS (Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros), Paulo Martins, considerou "sem pé nem cabeça" o relato de Mayc sobre o crime e disse que a investigação prossegue.
"Tem que acabar o inquérito policial, ouvir todo mundo para que a gente possa saber quais realmente foram os crimes cometidos. Tem aí obstrução de justiça, uma possível ocultação de cadáver, ninguém sabe se ele foi retirado de lá vivo. Não tem como hoje eu dizer quem fez o que", declarou a advogada Geysa Mitz, que atua no caso representando a família do engenheiro assassinado.
A advogada disse que periciais e quebra de sigilo telefônico, requerido pela família da Flávio ao MP-AM (Ministério Público do Amazonas) pode ajudar a elucidar o crime.
"O resultado da perícia (no carro da prefeitura), na casa, de tudo vai fazer a gente chegar mais próximo da verdade. A gente vai saber quem esta mentindo e quem está falando a verdade", disse.
Nos depoimentos, o policial militar da segurança pessoal de Arthur Virgílio Neto, Elizeu da Paz, definiu o serviço que executa para a Prefeitura de Manaus como "garantir a segurança pessoal" do enteado do prefeito. Ele declarou à polícia que foi ao condomínio de Alejandro no dia do crime para "uma ronda".
Nesta quarta-feira, dia 16, a Prefeitura de Manaus exonerou Elizeu da Paz do cargo comissionado de segurança particular do prefeito.
A publicação no Diário Oficial do Município, assinada por Arthur Virgílio Neto, indica que a exoneração ocorreu com base numa sindicância parcial sobre o caso feita na Casa Militar e na quebra da confiança para o cargo. Os detalhes do relatório não foram divulgados, embora o UOL tenha pedido acesso.
Na semana passada, durante sessão na Câmara Municipal de Manaus, um dos dois vereadores de oposição a Arthur, Marco Antonio Chico Preto, afirmou que a sindicância deveria apontar "quem deu ordem ou se omitiu" para que a estrutura da prefeitura estivesse na cena do crime.
"A segurança particular do prefeito não pode interferir na cena do crime, dando a entender que a estrutura da prefeitura foi utilizada para criar obstáculos à apuração da verdade", questionou.
O delegado Paulo Martins se nega a falar com a imprensa nos últimos dias e, por meio da assessoria de comunicação da Polícia Civil, informou que as investigações seguem.
"Ainda é cedo para apontar a autoria do crime. Os envolvidos estão sendo ouvidos. Eles estão aguardando laudos técnicos e periciais relacionados ao caso", informou a Polícia Civil em nota.
O promotor designado pelo MP-AM para acompanhar o inquérito, Igor Peixoto, informou, por meio da assessoria de comunicação, que o órgão vai ajudar a apurar autorias e materialidade em conjunto com a Polícia Civil. O MP é o titular da ação penal e o destinatário dessa investigação. "Quando o MP participa da investigação é para apurar autoria e materialidade em conjunto com a polícia e trazer os elementos técnicos e de convicção que ajudem na propositura e no final do julgamento favorável à ação penal, com acareações, solicitando perícia, oitivas e interrogatórios. Para que fundamente uma boa ação penal. Sem atropelos", disse.
Arthur Virgílio Neto, um dos mais tradicionais nomes do PSDB no país, deu entrevista nesta semana pedindo imparcialidade nas investigações.
A defesa de Alejando Valeiko e de Elizeu da Paz, assim como a dos demais presentes na casa do enteado do prefeito no dia do crime negam que eles tenham participação no homicídio. A polícia indica que há contradições nos depoimentos dele. A única defesa que sustenta que seu cliente é autor do homicídio é a de Mayc.
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