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Família Terror e União Criminosa: briga de facções escala violência no AP

Amapá registrou a maior taxa de mortes decorrentes de intervenções policiais Imagem: Divulgação / Comunicação PM AP

Do UOL, em São Paulo

23/07/2023 04h00

O Amapá é o estado mais violento do país. Por lá, a taxa de mortes violentas intencionais é de 50,6 por 100 mil habitantes, mais do que o dobro da média nacional, que é de 23,4.

Os dados, publicados pelo 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), refletem a intensificação da disputa entre organizações criminosas e a letalidade da polícia no estado, além de outros fatores.

Por trás dos números

O Amapá registrou 371 mortes violentas no ano passado e 491 em 2021. Apesar da queda de 25% em comparação ao ano anterior, o número é preocupante, segundo pesquisadores do Fórum.

A categoria mortes violentas intencionais reúne vítimas de homicídio doloso, incluindo feminicídios e policiais assassinados; roubos seguidos de morte; lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais.

Facções criminosas têm intensificado as atividades no estado nos últimos oito anos. Há duas organizações locais: a FTA (Família Terror do Amapá) e a União Criminosa Amapaense.

A atuação dessas organizações é considerada recente por pesquisadores e por pessoas que atuam na segurança pública do Amapá. Antes das facções, segundo um policial militar ouvido pela reportagem, estavam presentes em território amapaense "gangues" que atuavam de forma mais desorganizada no crime.

Como agem as facções

As organizações locais têm ligações com as principais facções do país, o PCC (Primeiro Comando da Capital) e o CV (Comando Vermelho). A Família Terror do Amapá conversa com a facção paulista, e a União Criminosa do Amapá com a organização nascida no Rio. Há uma disputa de pontos de comércio de drogas.

Membros do PCC que chegam ao Amapá têm se dedicado a "treinar" integrantes da FTA. Com isso, foram disseminadas no estado amapaense as mesmas regras seguidas em São Paulo e em outros estados cujo domínio é do PCC. Um exemplo disso são alguns condomínios de bairros de Macapá em que as regras de convivência são determinadas pelos integrantes da facção FTA.

As duas organizações criminosas têm atuado, sobretudo, na capital do AP, e há um confronto armado. No interior do estado, segundo fontes da polícia consultadas pelo UOL, elas não têm presença constante.

Diferentemente de outros estados, cujos territórios são divididos pelas facções, no Amapá ambas estão concentradas nas zonas norte e sul de Macapá. Esses grupos não têm uma forte presença nas regiões leste, oeste e centro.

"A grande novidade é a presença das facções". Segundo Gutemberg de Vilhena Silva, geógrafo e professor da Universidade Federal do Amapá, há informações de que integrantes de células de organizações criminosas chegaram ao estado para preparar e "capacitar" integrantes locais.

Insegurança e letalidade policial

A sensação de insegurança por causa desses grupos é percebida pela população, de acordo com Silva. "A violência é visível no dia a dia. A gente convive com casos de vidros de carros quebrados, crianças interceptadas por criminosos."

O Amapá também registrou em 2022 a maior taxa de mortes decorrentes de intervenções policiais: 16,6 por 100 mil habitantes (com um número absoluto de 122 mortes). Em 2021, a unidade da federação também teve a maior taxa de letalidade policial no país — 21,4 por 100 mil habitantes (156 mortes).

Os policiais do estado são treinados para estar em "alerta máximo". Uma fonte ouvida pelo UOL atribui a alta taxa de mortes decorrentes de intervenção policial no estado ao treinamento dado aos policiais militares. Segundo ele, "a doutrina é se deparar com a situação de risco ou denúncia e se deslocar em alerta total. Os policiais partem do princípio que têm que reagir".

Forte presença militar nas polícias do estado. Essa "herança militarista" na corporação é um dos motivos para a maior taxa de mortes decorrentes de intervenções policiais, segundo o pesquisador Aiala Couto, do FBSP.

A estratégia da resolução da violência está muito ligada ao uso das forças policiais, o que torna a polícia do Amapá a mais violenta do Brasil.
Aiala Couto, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Outros fatores

Desigualdade social contribui para o problema. O Amapá tem o 3º menor PIB do país, à frente apenas de Acre e Roraima, segundo o IBGE. Além disso, está entre as unidades da federação que apresentaram taxas de pobreza acima da média nacional, conforme dados de 2022. "É um estado que apresenta muita desigualdade social, pobreza, carência de infraestrutura urbana, de saneamento básico e de tratamento de água potável", comenta Aiala Couto.

Áreas de garimpo acentuam quadro de violência. "A pobreza faz com que haja uma grande mobilidade populacional nas áreas de garimpo, que são muito violentas", afirma Couto. Nas regiões de garimpo, segundo ele, há tráfico de pessoas, contrabando e tráfico de drogas.

O município de Calçoene, sobretudo o distrito de Lourenço, tem maior presença de garimpeiros. "O garimpo não é o elemento que traz o aumento substancial da violência. Mas, sabemos que há uma série de ilegalidades no garimpo e é uma região em que a atuação do estado é mais precarizada."

O estado é um "importante entreposto para o contrabando", segundo Couto. Esse é um dos motivos para o Amapá ser disputado pelas organizações criminosas. O estado concentra atividades do narcotráfico.

No Amapá, há uma conexão de diferentes atividades criminais, e a polícia reage de forma violenta. Esses fatores, relacionados às formas de intervenção pela polícia, fazem com que as taxas de mortes violentas intencionais superem a média nacional.
Aiala Couto, pesquisador do FBSP

Outro lado: O UOL entrou em contato com a Secretaria de Justiça e Segurança Pública do AP, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Lourenço é distrito de Calçoene, e não município. A informação foi corrigida.

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